Uma associação francesa de familiares das vítimas do voo AF 447, que caiu no ano passado sobre o oceano Atlântico quando realizava a rota Rio de Janeiro-Paris, acusou nesta sexta-feira a companhia Air France de ter conhecimento prévio de que os problemas com os sensores de velocidade dos aviões da Airbus representavam "um risco crítico" para a segurança dos voos.
A reação da associação Entraide et Solidarité (Ajuda Mútua e Solidariedade, em francês) ocorreu após a divulgação nesta sexta-feira, pelo jornal Libération, de um documento confidencial enviado pela Air France à Justiça francesa.
Nesse documento de 15 páginas, a Air France afirma que a Airbus teria ignorado os vários alertas da companhia aérea sobre os incidentes que vinham sendo registrados com os sensores de velocidade de seus aviões, os chamados tubos Pitot.
A Air France afirma no relatório que já havia registrado 15 incidentes de congelamento dos tubos Pitot em alta altitude nos dez meses que antecederam a catástrofe com o voo AF 447 e diz ter alertado a Airbus sobre o problema.
Ao ficarem entupidos com cristais de gelo, os tubos Pitot, que medem a pressão atmosférica, não permitem mais o cálculo da velocidade do avião, o que provoca várias falhas no sistema.
"Com esse documento, a Air France reconhece oficialmente que os problemas dos tubos Pitot constituíam um risco crítico para a segurança dos voos e que ela tinha total conhecimento disso, já que trocava informações sobre o assunto há muito tempo com a Airbus", afirma Jean-Baptiste Audousset, presidente da Entraide et Solidarité.
"Há meses nos repetem que é impossível ter uma conclusão sobre o papel dos tubos Pitot. Com esse documento, a Air France reconhece sem ambiguidade que os tubos Pitot estão no centro da cadeia de causas que conduziram ao acidente", diz Audousset.
As investigações sobre o voo AF 447 que vêm sendo realizadas na França já concluíram que houve falhas nos tubos Pitot. No entanto, as autoridades afirmam que isso representa apenas um fator do acidente, e não a causa principal.
Sem recomendações
No relatório enviado à juíza Sylvie Zimmermann, responsável pelas investigações sobre homicídio involuntário, a Air France afirma, segundo o jornal Libération, que a Airbus e a Thales, fabricante dos tubos Pitot, deixaram a companhia aérea "sem recomendações nem soluções perenes ao problema" dos equipamentos, apesar de conhecerem "o caráter crítico e o perigo dessas panes".
"Quem diz "risco crítico para a segurança dos voos" fala de risco de catástrofe", afirma o presidente da associação de familiares das vítimas.
A Air France afirma ter alertado pela primeira vez a Airbus sobre os problemas dos tubos Pitot em 30 de julho de 2008, após ter registrado dois incidentes, em maio e julho daquele ano.
Em setembro de 2008, a companhia aérea efetuou um novo alerta, após uma série de quatro novos incidentes de congelamento dos tubos Pitot no prazo de um mês, segundo o documento entregue à Justiça.
A Airbus afirmou que não fará comentários sobre o documento entregue à Justiça. O fabricante alega que a Air France não teria feito um pedido para substituir os sensores de velocidade da Thales pelos da americana Goodrich, que se tornaram obrigatórios após o acidente com o voo Rio-Paris.
O voo AF 447 caiu sobre o Atlântico após decolar do Rio de Janeiro na noite de 31 de maio (horário de Brasília) de 2009 com 228 pessoas a bordo.