?Eu estou bem, tenho meus momentos de fraqueza, mas aí eu rezo mais forte, e a vida é muito curta para se sentir miserável por muito tempo?. É com frases desse tipo, entremeadas com momentos de humor, que a bióloga Ana Paula Maciel, ativista do Greenpeace presa na Rússia desde o dia 19 de setembro, relata para a família os dias de cárcere em Murmansk, noroeste do país. Duas cartas recebidas pela irmã de Ana Paula na segunda-feira mostram uma pessoa otimista, mas apreensiva.
As cartas, datadas de 27 de setembro e de 2 de outubro, foram enviadas por email da embaixada brasileira em Moscou. Os documentos estão em formato digital, já que originais ficaram retidos pela Justiça russa. Nas duas mensagens, escritas a mão e aparentemente em folhas de um caderno comum, a bióloga relata que tem sido bem tratada pelos carcereiros, mas reclama que passa o dia inteiro sozinha em uma cela pequena e que tem apenas uma hora por dia para caminhar.
?Os guardas, carcereiros, enfermeiros, são todos gentis e, enfim, temos que cumprir rotinas com de segurança e tal, mas no fundo eles sabem que não somos criminosos?, relata a bióloga, que mora em Porto Alegre com a mãe, Rosângela, e as irmãs Telma e Alessandra. Ela também informa que assiste frequentemente a um canal de música na cela em que passa os dias na penitenciária da cidade.
Na carta mais longa, de 2 de outubro, ela descreve o espaço de caminhada diária a que todos os ativistas do Greenpeace presos em Murmansk têm direito: ?eu fico feliz como a Lilica e a Laila (os cães da família) ao verem a guia, mas na real é uma caixa de concreto de cinco metros por cinco metros onde não dá para pegar sol e me sinto como um bicho do zoo de Sapucaia (o zoológico da região metropolitana de Porto Alegre)?.
- Fiquei bem mais animada, já que pude ver que a letra é mesmo da minha filha. Mas a preocupação se mantém ? disse Rosângela.
A primeira carta tem apenas uma página e a segunda, escrita uma semana depois, tem três páginas. O tom de Ana Paula é de otimismo, mas também de apreensão com o tempo que poderá passar na prisão. ?Tudo indica que vamos ficar (presos) de verdade um mês, mas na real ninguém sabe o que pode acontecer. Talvez dois meses, talvez mais... Na real, não penso muito nisso, vivo um dia de cada vez?, escreve.
No próximo sábado, completam-se três semanas de prisão do grupo de ativistas do Greenpeace. Os 28 integrantes do grupo ? entre eles a bióloga brasileira ? foram presos no dia 19 de setembro em águas internacionais. A promotoria russa acusou todos os membros do grupo, além do fotógrafo e um cinegrafista, de pirataria e determinou prisão temporária por 60 dias. Se condenados, as penas podem chegar a 15 anos de prisão.
Rosângela Maciel explicou que não acredita mais na possibilidade de relaxamento da prisão da filha, depois notícia de quarta-feira de que a polícia russa encontrou drogas com os ativistas. Novas audiências com recursos apelando pela liberdade dos outros ativistas serão realizadas ao longo da semana, até o próximo sábado. A audiência da brasileira Ana Paula ainda não tem data marcada.
Na próxima segunda-feira, Rosângela e a diretoria do Greenpeace no Brasil serão recebidos pelo governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, para discutir medidas práticas capazes de resultar na libertação de Ana Paula. O governador já se manifestou contra a prisão dos ativistas. Ele informou à direção do Greenpeace no Brasil que pedirá pessoalmente à presidente Dilma Rousseff, que chega ao estado amanhã, para que intervenha diplomaticamente a favor da bióloga brasileira, que mora em Porto Alegre.
?Dou meu apoio irrestrito à luta pela libertação de Ana Paula?, disse o governador por meio de um informe de imprensa. O secretário de Justiça e Direitos Humanos do estado, Fabiano Pereira, está articulando um encontro da mãe da ativista com a presidente, que permanece até domingo em Porto Alegre. O encontro ainda não está confirmado.
Na quarta-feira, a carta que o Greenpeace encaminhou à presidência da República apelando a Dilma que intervenha diplomaticamente para acelerar a libertação da ativista foi protocolado no Palácio do Planalto.
Deputados da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos Humanos (FPDDH) também realizaram um ato de coleta de assinaturas pela libertação de Ana Paula no Anexo II da Câmara dos Deputados. O documento com as assinaturas dos parlamentares será entregue ao embaixador da Rússia no Brasil.