Uma porção da floresta amazônica, destinada ao agroextrativismo no oeste do Pará, tornou-se uma terra sem lei, invadida por grileiros e marcada por um cenário de ocupação ilegal, onde os lotes são vendidos em leilões não oficiais.
No Chapadão, uma vasta área entre Santarém e Uruará, a expansão do fogo criminoso, sem controle ou repressão, tem ditado a dinâmica de ocupação. A área, antes rica em castanheiras – uma das árvores mais imponentes da Amazônia e vital para a subsistência de centenas de famílias – transformou-se em um cemitério dessas árvores, que são derrubadas pelo fogo ou pelo corte ilegal. Com isso, a extração de castanha, fonte de renda essencial, já não é mais como antes.
Os assentamentos rurais criados pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) não foram regularizados nem receberam a assistência necessária para a prática do agroextrativismo, especialmente a coleta de castanha. Esses assentamentos foram invadidos por grileiros e fazendeiros, que pressionam pela expansão de áreas para a soja.
A grilagem, em muitos casos, é facilitada pelo fogo, que consome tanto as áreas desmatadas quanto as florestas intactas, e muitas vezes, o fogo é usado de forma estratégica para enfraquecer a vegetação e facilitar a derrubada das árvores, consolidando assim áreas ilegalmente apropriadas.
A grave seca de 2023 e 2024 tem exacerbado o problema, tornando as árvores mais inflamáveis e os incêndios ainda mais difíceis de controlar. O incêndio nas áreas do Chapadão segue os ramais abertos na floresta e atinge tanto os assentamentos invadidos quanto as áreas de floresta preservada.
O objetivo dos grileiros é enfraquecer a vegetação para, posteriormente, derrubar as árvores e consolidar as terras. No entanto, os governos federal e estadual do Pará não tomaram medidas efetivas para combater esses incêndios ou a grilagem de terras. O Ibama, por exemplo, afirmou que não foi acionado para combater os incêndios nos assentamentos ao longo de 2024.
A degradação da Amazônia, alimentada por incêndios criminosos e pela exploração ilegal de madeira, é a principal causa do aumento da destruição das florestas, apesar da redução do desmatamento. A degradação das áreas florestais impacta diretamente a função da Amazônia como sumidouro de carbono, e em algumas regiões, essas áreas degradadas já se comportam como fontes de emissões de CO2, contribuindo para a crise climática.
O Incra reconhece que os assentamentos foram invadidos e que existem tentativas de retomar as áreas ocupadas por grileiros e madeireiros. O governo do Pará, por sua vez, afirmou que solicitou apoio do governo federal para combater as queimadas, mas as ações continuam insuficientes. Enquanto isso, o fogo tem causado danos enormes à saúde das populações locais e ao meio ambiente. As ondas de fumaça têm atingido cidades como Santarém e Alter do Chão, comprometendo a qualidade do ar e a saúde das pessoas.
Em campo, os assentados enfrentam uma dura realidade. As chamas destroem as castanheiras e as plantações, como a pimenta-do-reino e a mandioca, que são as principais fontes de sustento das famílias. Alguns assentados, como Gelciclei dos Santos Cardoso, relatam perdas imensas na produção de castanha e enfrentam dificuldades extremas, como a falta de água potável e a ausência de energia elétrica, além de uma renda drasticamente reduzida. O fogo, que tem se espalhado sem controle, continua a devastar a região, deixando um rastro de destruição e desespero.