O Congresso concluiu nesta semana a aprovação de um projeto que determina o pagamento de R$ 600 mensais a trabalhadores informais, como uma forma de mitigar os danos econômicos da pandemia de coronavírus. No entanto, o governo entende que é preciso a aprovação de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para viabilizar o pagamento; parlamentares e especialistas discordam.
Na argumentação do governo, a PEC deveria alterar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), que impõe limites para os gastos públicos. Com a alteração, na visão do governo, o caminho fica liberado para o aumento de gastos, como aqueles voltados para amenizar a crise.
PECs precisam de mais votos para ser aprovadas e têm tramitação mais complexa no Congresso do que projetos de lei e medidas provisórias, por exemplo.
Nesta terça (31), o ministro da Economia, Paulo Guedes, ressaltou que falta concluir o trâmite "jurídico e político" para viabilizar os pagamentos.
"Tem um problema técnico de liberação de fontes, e aí está se discutindo a velocidade com que se pode aprovar uma PEC para dar origem a fontes para essas despesas. De qualquer forma, do nosso ponto de vista técnico está tudo pronto, tudo o já provado na economia, e agora é um trâmite jurídico e político”, disse o ministro.
“Qual o nosso problema hoje? É a LRF, pedalada fiscal, impeachment, esse tipo de coisa. Tem que ter cláusula qualquer que, em caso de calamidade, suspende e nos permite agir rapidamente", concluiu.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), discordou do ministro. Em resposta a Guedes, ele lembrou que, quando foi reconhecida a calamidade pública em razão do coronavírus, o governo já havia acionado o Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a legalidade de gastos extras. E o ministro Alexandre de Moraes entendeu que os gastos, no estado de calamidade, não ferem a lei.
"O encaminhamento desse pleito ao ministro Alexandre de Moraes, onde ele garantiu por liminar a suspensão, o afastamento desses artigos da LRF e da LDO [Lei de Diretrizes Orçamentárias], garantem ao governo, pelas próprias palavras do governo, garantem a possibilidade, a certeza, da edição de uma MP [medida provisória] de crédito para pagar os R$ 600 que foram aprovados na Câmara e no Senado, e aguardam, todos nós aguardamos, os brasileiros, ansiosamente, a sanção do presidente da República", disse Maia.
O presidente Jair Bolsonaro disse que vai sancionar o projeto ainda nesta quarta. Os pagamentos, segundo o governo, devem começar a ser feitos na segunda semana de abril.
O que dizem os especialistas
O economista e professor do IDP José Roberto Afonso, um dos idealizadores da LRF, também entende que o governo não precisa de PEC para começar a efetuar os pagamentos.
"Não falta o recurso, o recurso tem que sair da dívida pública. Não falta autorização, o Congresso já aprovou calamidade pública em todo território nacional. Eu acho que não falta boa disposição de governadores, prefeitos, que inclusive estão fazendo o que o governo federal devia estar fazendo", afirmou.
"O Congresso aprovou tudo que foi pedido ao Congresso. O Supremo aprovou tudo que foi pedido a ele. O que não pode é a cada momento ficar querendo aparecer novas dúvidas, novas questões e isso justificar você não agir", completou.
Para Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente, entidade ligada ao Senado, o pagamento pode ser viabilizado por medida provisória. Por isso, segundo ele, cabe ao governo tomar a iniciativa.
"O pagamento do auxílio de R$ 600, ele independe de aprovação de PEC. Ele pode ser viabilizado de imediato a partir de uma edição de uma MP, um ato do Poder Executivo, então a bola está na mão do presidente da República, para que esse gasto seja feito o mais rápido possível", afirmou.