Um casal paulista luta há anos para descobrir o destino do filho. O drama de Luiz Carlos e Alessandra Rodrigues começou no dia 24 de maio de 2003, quando nasceram os gêmeos Luiz Felipe e Lara Rodrigues, num hospital público de Porto Ferreira, cidade com cerca de 60 mil habitantes a 228 km de São Paulo.
Prematuros de 8 meses ?Lara pesando 2,3 kg e Luiz Felipe, 2,6 kg?, os bebês foram levados a encubadoras. A menina evoluiu bem; o garoto, porém, sofreu uma parada cardiorrespiratória e morreu, segundo os médicos do centro médico. Quatro horas depois, sem velório, um bebê ?supostamente Luiz Felipe? foi enterrado.
Estavam presentes o pai dos gêmeos e um funcionário da funerária da prefeitura. ?Falou que não precisava ir mais ninguém. Enterrou às pressas. Um caixão fechado?, disse Luiz Carlos, que trabalha numa cerâmica.
Alessandra, que é cozinheira de uma lanchonete, não se conformou em voltar pra casa só com Lara nos braços. ?Ela chegou em casa e falou: ?Ele não está morto. Eu vou atrás?.Falavam que ela estava louca, que eu devia procurar um médico para ela?, afirmou o pai.
Em 2006, a Justiça autorizou que fosse feita uma exumação. Luiz Carlos contou que o corpo não estava com a roupa entregue ao funcionário da funerária no dia do enterro. ?Ele falou que ia colocar. Só que no dia da exumação, a roupinha não estava. Ele estava enrolado num cobertorzinho,? disse o pai dos gêmeos.
O Instituto de Criminalística de São Paulo fez exames de Dna e constatou: o bebê exumado não é filho de Alessandra e Luiz Carlos. Questionada se acredita na possibilidade de o menino ter sido levado da maternidade, Alessandra é enfática: ?Tenho certeza. Certeza?.
A perita que assinou o laudo disse esta semana que o resultado é inquestionável. ?Se trouxerem ossos coletados do mesmo local, os resultados serão os mesmos?, afirma a perita do Instituto de Criminalística de São Paulo Norma Bonacorso.
Reviravolta
Mesmo assim, o caso teve uma reviravolta. A Justiça de Porto Ferreira negou, no mês passado, um pedido de indenização feito pelos pais de Luiz Felipe. A decisão cita o livro de controle do cemitério que mostra que Luiz Felipe foi enterrado na quadra 1, cova 231. A exumação, no entanto, foi feita no corpo que estava na quadra 4.
O advogado que representa o casal, Renato da Cunha Ribaldo, nega que a exumação aconteceu em local errado. ?A exumação foi no lugar corretíssimo?, disse.
O funcionário que diz ter preenchido o livro contou que o menino foi, sim, enterrado na quadra 4. ?Foi na quadra 4, cova 231?, revelou Valdeil Gomes de Souza. No livro, dá pra ver claramente que o número quatro foi escrito por cima do número 1.
Segundo o advogado da família, o funcionário cometeu um erro no preenchimento e depois tentou consertar, já que nesse cemitério as crianças só são enterradas na quadra quatro. Além disso, o pai viu onde ocorreu o sepultamento do bebê, que depois foi exumado.
O advogado recorreu da decisão da justiça, que nega o pagamento de indenização à família. ?A criança que foi enterrada lá não é filho do casal. Ponto. Onde estaria o filho do casal? Até segunda ordem, está vivo?, disse o defensor.
Mistério
A descoberta de que o bebê morto não é Luiz Felipe levantou uma outra suspeita: de quem é o corpo do recém nascido exumado?
Os policiais de Porto Ferreira ainda não descobriram e pediram mais prazo à Justiça para continuar investigando o caso. Assim, sete anos depois, dois mistérios permanecem: onde está Luiz Felipe e quem foi enterrado no lugar dele.
A direção do hospital onde os gêmeos nasceram preferiu não se manifestar. O dono da funerária, que na época também era o provedor do hospital, afirma que os procedimentos adotados foram corretos e que Luiz Felipe está enterrado no cemitério. Só não sabe dizer onde.
?Não por maldade de coveiro ou de alguma pessoa, mas um cachorro, uma ventania, uma chuva, uma erosão, pode ter derrubado a cruzinha e trocado aquela plaquinha de lugar?, disse Rubens Gurim Filho, funcionário da funerária.
A família estuda a possibilidade de pedir a exumação de todos os bebês enterrados no cemitério.
O promotor Cássio Conserino, que chegou a investigar o caso e hoje trabalha em outra cidade, disse que na época não teve dúvida de que Luiz Felipe foi vítima de um crime. ?Em tese, se o bebê não estiver morto, foi entregue a uma outra família. Ou ele foi doado a uma outra família ou comercializado?, disse.
Marca
Os pais dos gêmeos são primos. Há um ano, tiveram outro filho. Todos têm uma marca semelhante: uma pinta no pescoço.
Para a família, a marca se transformou na maior esperança de encontrar Luiz Felipe. ?Claro que ele está vivo. Quando eu vejo um menino da mesma idade, eu dou uma olhadinha no pescoço. Eu olho de um lado, de outro. É um direito meu de criar, de conhecer ele. É meu direito. Ele é meu. Ele nasceu de mim?, desabafou Alessandra.