Escândalos em Assembleias Legislativas estão há anos sem solução

Levantamento identificou investigações relacionadas a peculato em pelo menos dez Assembleias

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Investigações sobre casos de peculato em Assembleias Legislativas –incluindo a contratação de funcionários fantasmas e repasses de parte dos salários de servidores para deputados– chegam a até 22 anos sem resolução ou punição de parlamentares envolvidos.

Levantamento identificou investigações relacionadas a peculato em pelo menos dez Assembleias Legislativas. Na maioria dos casos, não houve condenações.

Os casos assemelham-se às suspeitas de peculato na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro que estão sendo investigadas pelo Ministério Público a partir de movimentações financeiras suspeitas de servidores. As suspeitas incluem Fabrício Queiroz, ex-funcionário do gabinete o deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL), filho do presidente Jair Bolsonaro.

No Paraná, um esquema de nomeações fantasmas na Assembleia descoberto em 2010, conhecido como Diários Secretos, desviou cerca de R$ 260 milhões, segundo o Ministério Público, com a anuência da mesa diretora. O caso já rendeu oito ações criminais e algumas condenações de servidores –mas os contratempos permanecem.

Em agosto, o Tribunal de Justiça invalidou uma das buscas feitas nove anos atrás no Legislativo, por causa da probabilidade de que a ação incriminasse um deputado. A medida, para os desembargadores, não deveria ter sido autorizada por um juiz de primeira instância. A decisão, agora, pode gerar um efeito cascata.

“Os prédios da Assembleia não têm imunidade; quem tem imunidade são os deputados. E eles não estavam sendo investigados; os alvos eram os servidores”, comentou o procurador Leonir Batisti, coordenador do Gaeco (grupo de combate ao crime organizado). A Promotoria deve recorrer da decisão.

Para ele, investigações contra desvios nas Assembleias, mesmo que não envolvam deputados, “demandam uma energia absurda, por causa desse sistema, que zela antes pela burocracia, e não pelos méritos”.

Em Mato Grosso, já se vão 15 anos desde que uma investigação de desvios em favor de ex-presidentes da Assembleia foi iniciada. O Ministério Público apontou, entre outros fatos, que servidores eram obrigados a sacar mensalmente valores de um fundo da Casa e repassar a chefes de gabinete dos deputados, sob risco de serem exonerados.

Uma das investigações foi batizada, não por acaso, de Operação Ventríloquo. “Agiram com receio de verem ‘guilhotinados’ seus cargos públicos”, afirma uma das denúncias.

As investigações geraram dezenas de ações criminais e de improbidade, e as primeiras sentenças vieram apenas em 2016. Até hoje, ainda há 53 inquéritos em andamento.

“Nós tivemos praticamente uma centena de exceções de suspeição, dezenas de recursos, de tentativas de levar os processos aos tribunais superiores. A nossa estrutura processual favorece muito a pessoa que comete o ilícito, lamentavelmente”,diz o promotor Célio Fúrio, da Promotoria do Patrimônio Público em Cuiabá.

Em Pernambuco, em 1997, um caso envolvendo o deputado João Paulo (atualmente no PC do B) teve grande repercussão. No entanto, não houve nenhuma punição até hoje.

Após a ex-assessora Maria Cristina da Rocha denunciar que os servidores do gabinete eram obrigados a devolver mais da metade do salário, o parlamentar acabou admitindo a prática.

João Paulo exercia o segundo mandato de deputado estadual pelo PT. Três anos depois, tornou-se prefeito do Recife, cargo para o qual foi reeleito.

Mesmo admitindo a prática da devolução de parte dos vencimentos, o caso não chegou nem ao Ministério Público de Pernambuco. O deputado, sem citar nomes, disse que a prática era comum.

Passados 22 anos, João Paulo diz que não há comparação com os casos sob investigação na Assembleia do Rio de Janeiro.

“Era um mecanismo utilizado para nivelar os salários no gabinete. Havia uma distorção muito grande. Todos os servidores estavam de acordo”, diz.

Na Bahia, a operação Detalhes, da Polícia Federal, descobriu em 2012 repasses de servidores da Assembleia para contas ligadas ao deputado estadual Roberto Carlos (PDT) que chegavam a R$ 203 mil.

O Ministério Público apresentou denúncia contra Roberto Carlos em 2013 e, desde então, o caso segue nos escaninhos do Tribunal de Justiça da Bahia –a Corte nem sequer decidiu se acata ou não a denúncia contra o deputado.

O relator do caso defendeu que o deputado se tornasse réu. Mas outros dois desembargadores defenderam a rejeição da denúncia alegando vício de origem —ambos consideram que as provas seriam ilícitas porque baseadas em quebra de sigilo bancário e fiscal. A denúncia foi alvo de um pedido de vistas e segue sem conclusão.

Roberto Carlos afirma que os repasses de assessores parlamentares não existiram: “Foi tudo um grande equívoco”.

No Rio Grande do Sul, o Ministério Publico investiga o deputado estadual Edu Olivera (PDT), suspeito de receber “caixinha” de diárias de servidores e salários de funcionários fantasmas –o deputado afirma que não tinha responsabilidade sobre o lançamento de diárias.

O promotor Flávio Duarte, responsável pela investigação, afirma que casos como este são de difícil apuração, em função da fidelidade de servidores comissionados.

“É uma troca de favores. Normalmente, são pessoas que não teriam aquele salário na iniciativa privada ou em seu emprego regular”, afirma.

INVESTIGAÇÕES

Suspeitas de peculato nas Assembleias Legislativas chegam a 22 anos sem resolução

Pernambuco

Caso: Servidores do então deputado João Paulo Lima (PC do B) devolviam mais da metade dos salários ao chefe de gabinete

Quem investiga: Não chegou a ser investigado

Ano: 1997

Resolução: Caso não foi investigado. Deputado alega que recursos eram repartidos entre os demais servidores do gabinete

Mato Grosso

Caso: Promotoria pede restituição de R$ 500 milhões em desvios, que teriam ocorrido sob ordens da Mesa Diretora

Quem investiga: Polícia Federal (Operação Ventríloco)

Ano: 2003

Resolução: Já há condenações, mas em ritmo lento. Os réus recorrem em liberdade

Alagoas

Caso: Deputados são acusados de desviar recursos por meio de empréstimos consignados a funcionários fantasmas e laranjas

Quem investiga: Polícia Federal (Operação Taturana)

Ano: 2007

Resolução: Deputados foram condenados em segunda instância, mas conseguiram efeito suspensivo no STJ 

Paraná

Caso: Caso Diários Secretos: nomeações fantasmas de servidores desviaram pelo menos R$ 260 milhões

Quem investiga: Investigação do Ministério Público

Ano: 2010

Resolução: Funcionários foram presos e condenados, mas ainda há ações em andamento contra deputados 

Bahia

Caso: Deputado Roberto Carlos (PDT) é suspeito de contratar funcionários fantasmas e apropriar-se de R$ 203 mil em salários

Quem investiga: Polícia Federal (Operação Detalhes)

Ano: 2012

Resolução: Promotoria apresentou denúncia, mas caso está parado na Justiça. Deputado alega que houve equívoco

Rio Grande do Norte

Caso: Servidores são acusados de desvios de cerca de R$ 4 milhões por meio de funcionários fantasmas

Quem investiga: Polícia Federal (Operação Dama de Espadas)

Ano: 2017

Resolução: Justiça acatou denúncia contra 24 pessoas investigadas na operação, nenhum deputado

Rio Grande do Sul

Caso: Deputado Edu Olivera (PDT) é acusado de apropriar de diárias fraudulentas e de receber caixinha de servidores

Quem investiga: Investigação do Ministério Público

Ano: 2018

Resolução: Caso ainda está sob investigação. Deputado diz não ter responsabilidade sobre o lançamento de diárias

Paraíba 

Caso: Deputado Manoel Ludgério (PSD) é acusado de contratar empregada doméstica como funcionária fantasma

Quem investiga: Investigação do Ministério Público

Ano: 2018

Resolução: Promotoria apresentou denúncia. Justiça ainda não apreciou. Deputado diz não ter cometido irregularidades

Amapá 

Caso: Três deputados são suspeitos de ficar com parte das verbas rescisórias destinadas a servidores

Quem investiga: Polícia Federal (Operação Rescisória)

Ano: 2018

Resolução: Caso ainda está sob investigação

São Paulo

Caso: Cinco deputados são investigados por suspeita de apropriação de salários

Quem investiga: Ministério Público

Ano: 2018

Resolução: Casos são alvo de inquérito da Promotoria e ainda estão sob investigação

 

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