Quando foi demitida da distribuidora de gêneros alimentícios onde trabalhava, a vendedora I. C. não imaginava que passaria mais de um ano batalhando para receber seus direitos. A batalha judicial foi necessária porque a empresa, ao calcular a rescisão, desconsiderou o pagamento mensal de 2% de comissão, referente às vendas realizadas pela trabalhadora.
Segundo ela, a empresa calculou a rescisão baseada em um salário de R$ 700,00, quando a trabalhadora ganhava mais R$ 2 mil por mês, somando salário e comissão. ?Eles assinaram minha carteira como se eu recebesse o salário mínimo e apenas 0,25% de comissão, porém o percentual era de 2%?, afirma a vendedora.
Para burlar as leis trabalhistas, a empresa depositava o restante do salário em outra conta. ?Quando entrei na Justiça, eles alegaram que eu trabalhava para outra empresa, portanto esse salário não era pago por eles. Um grande absurdo, já que o dinheiro deixou de ser depositado na minha conta no mesmo mês em que fui demitida?, conta a vendedora, cujo nome prefere não revelar.
Segundo o advogado Gustavo Barbosa, esses casos não são raridade e os trabalhadores precisam ficar atentos para não serem lesados em seus direitos.
?Em regra as empresas agem de duas formas: Fazem constar na carteira de trabalho uma percentagem de comissões bem menores do que aquelas que efetivamente o empregado recebe ou pagam no contracheque o salário especificado na carteira, enquanto as comissões são pagas por fora?, explica o advogado. Quando isso acontece, a única alternativa é recorrer à Justiça. Após perder em primeira instância, a vendedora recorreu e conseguiu provar que a empresa havia desconsiderado o cálculo da comissão para fins rescisórios.
?Agora eles serão obrigados a pagar os direitos trabalhistas baseados em uma comissão média de R$ 1.100?, comemora. Para Gustavo Barbosa, iniciativas como essas podem inibir práticas ilegais por parte das empresas. ?Os direitos assegurados aos trabalhadores estão previstos na Consolidação das Leis do Trabalho - CLT. O artigo 457 prevê que integram o salário não só a importância fixa paga, mas também as comissões, gorjetas, percentagens, gratificações ajustadas, diárias para viagens e abonos pagos pelo empregador, dentre outras?, orienta o advogado.
Para evitar maiores transtornos, é recomendável que os trabalhadores fiquem atentos ao receberem seus salários, inclusive, os valores relativos às comissões. Tais pagamentos devem ser realizados, preferencialmente, através de depósito na mesma conta corrente utilizada para o pagamento do salário especificado na carteira. Por outro lado, quando o pagamento das comissões for em dinheiro, o ideal é que o trabalhador exija algum recibo de quitação, ou, ainda, mapa das vendas realizadas que comprovem a apuração das comissões.
Processos judiciais são desgastantes
A Justiça nem sempre é acessível, principalmente para quem não possui orientação adequada sobre seus direitos. Por isso, é comum que algumas pessoas simplesmente desistam de entrar com processo ou optem pelo acordo com a empresa, como uma forma de evitar maiores desgastes.
Porém, essa alternativa pode não ser a mais vantajosa para o empregado, já que as empresas geralmente oferecem um valor abaixo do que realmente devem. Foi isso o que aconteceu com Andreia Patrícia Rodrigues. ?Eu trabalhei 6 meses e recebi R$ 1.200 de rescisão, pois eles não incluíram a comissão. Quando entrei na Justiça me ofereceram mais R$ 1.500 e eu aceitei. Estava cansada e achei melhor fazer o acordo, embora tenha consciência de que não recebi todos os meus direitos?, conta.
Ao tentar burlar as leis trabalhistas, as empresas contribuem para o acúmulo de processos na Justiça, principalmente porque tendem a repetir os mesmos erros com todos os seus funcionários. ?Nessa empresa onde eu trabalhei, quem quiser receber os direitos tem que entrar com processo. O sentimento é de enganação?, lamenta Andreia.