Para bancar um festival internacional de sapateado, a bailarina e empresária Christiane Matallo pegou empréstimo no banco e usou dinheiro próprio. O evento aconteceu em outubro do ano passado ? e hoje a artista se vê às voltas com uma dívida de R$ 60 mil. "Além de ficar numa situação complicada, tenho que pagar os juros dos bancos, que não são nada baratos", diz.
Christiane é um exemplo de quem pode se beneficiar com a onda de queda nos juros iniciada na semana passada pelo Banco do Brasil e seguida por Caixa, HSBC, Banrisul, Santander, Bradesco, Itaú. As quedas ocorrem depois de a presidente Dilma Rousseff reclamar que o BC baixa os juros que cobra dos bancos (nesta quarta, baixou de novo, agora para 9%), mas os bancos não repassam a queda aos clientes.
"Sou artista, faço eventos e, muitas vezes, trabalho para receber depois. O meu cachê não é corrigido com juros e eu fico tendo que usar dinheiro do banco para arcar com meus custos", explica. Diante das notícias de que vários bancos ? públicos e privados ? estão oferecendo taxas de juros mais baixas em algumas modalidades de crédito, Christiane diz que vai tentar renegociar a dívida. "Sei quanto é minha dívida e o que estou pagando. O brasileiro tem que conhecer os seus direitos e lutar por eles."
Confira as dicas de especialistas em finanças pessoais e direito do consumidor sobre como fazer para ter juros mais baratos. Veja abaixo:
1) Eu tenho dívidas em um dos bancos que anunciaram corte nos juros. As taxas ficaram menores automaticamente ou preciso fazer alguma coisa?
Na interpretação de Carlos Tadeu de Oliveira, gerente de Testes e Pesquisas do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), as novas taxas de juros de cheque especial e créditos rotativos do cartão, por exemplo, devem passar a valer imediatamente para todo mundo ? sejam novos ou antigos clientes. Mas, no caso do que foi contratado anteriormente, com juro prefixado ? como o financiamento de um veículo ? é preciso renegociar. Na dúvida, converse com seu gerente.
2) Como eu posso renegociar a dívida para aproveitar os juros menores?
Oliveira cita três possibilidades: refinanciar a dívida mais cara diretamente na instituição; pegar um novo empréstimo com taxa melhor e quitar a dívida anterior; ou se valer da portabilidade de crédito e transferir a dívida para outra instituição financeira.
3) Como sei se vale a pena trocar a dívida?
O consumidor precisa, primeiro, entender exatamente o que está pagando. ?Vá ao banco e peça um demonstrativo da dívida, com projeção das prestações faltantes e solicite um documento com os valores, caso vá liquidar a dívida à vista?, orienta Oliveira, do Idec.
Com o documento em mãos, pesquise, entre os bancos, o que oferece as melhores condições ? que não se restringem às taxas de juros.
"Muita gente tem uma falsa noção de que basta olhar a taxa de juros para saber se é mais vantajosa ou não. Mas os bancos não cobram só juros, existem taxas, impostos, outros valores agregados", destaca Renata Reis, especialista em Defesa do Consumidor da Fundação Procon-SP. "O interessado tem que verificar o Custo Efetivo Total (CET), que deve constar em contrato, isso é uma obrigação legal."
4) Como eu faço para comparar as condições oferecidas pelos bancos?
É fundamental que a comparação entre os bancos leve em consideração sempre o mesmo valor de empréstimo e igual número de prestações ? para não haver distorções. Para que o cliente não se perca entre nomes de tarifas e números variados, uma maneira simples de saber qual banco oferece melhor condição é comparando o valor da prestação.
"A pessoa pode fazer uma pesquisa pela parcela. Ela se informa em todos os bancos, usando o mesmo prazo e valor, e compara a parcela, para ver qual é mais barata", orienta Samy Dana, professor de Finanças da escola de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP). "O critério é quanto vai sair no total ? sempre evitar custos embutidos."
Oliveira, do Idec, diz que, ao optar pela transferência da dívida para outro banco que oferece taxa menor, mas alongando o prazo de pagamento, o consumidor pode ter prejuízo. "Se for diluir em mais prestações, tem que fazer o cálculo para saber o custo efetivo total, porque pode não valer a pena, ainda que os juros sejam menores."
5) Ok. Entendo que vale a pena trocar de banco? Como faço?
Caso o consumidor opte pela portabilidade de crédito ? ou seja, decida migrar sua dívida para outra instituição ?, essa transferência é isenta da cobrança de taxas, como a de liquidação antecipada.
Oliveira, do Idec, destaca que o banco não pode impor nenhuma condição, que não tem o direito de não aceitar o pedido de portabilidade e lembra que o consumidor não tem que pagar taxa nenhuma pela portabilidade.
A quitação de dívida com o banco do qual pretende transferir a dívida deve ser feita pelo banco para onde o consumidor está levando o financiamento ? e não pelo próprio cliente. "O novo banco credor liquida a dívida diretamente com o banco de origem."
"Qualquer oferta que for garantida para o consumidor, solicite por escrito. Antes de assinar, verifique se está condizente com o que foi dito", diz Renata, do Procon-SP. Os bancos também não podem exigir a contratação de um determinado serviço ou produto para aceitar a migração. "O Código de Defesa do Consumidor continua proibindo a venda casada", lembra a especialista.
6) O banco diz que oferece taxa de juros a partir de 0,90% ao mês, mas quer me cobrar 3%. Por que não posso ter a taxa mais barata?
Os bancos levam em conta, para determinar a taxa de juros, o perfil de cada cliente ? assim, a taxa não é a mesma para todos. Contam pontos na redução da taxa o relacionamento do tomador do empréstimo com o banco (se é cliente ou não, há quanto tempo, quais produtos tem), além do histórico de crédito ? quem já esteve inadimplente pode ter que pagar juros maiores em um novo empréstimo.
"Foram mexidas as taxas de cheque especial e crédito rotativo, mas ainda tem uma margem enorme para mexer. Algumas variam, por exemplo, de 0,99% a 4%, é muita elástica", lembra Oliveira, do Idec.
Os bancos, no entanto, têm critérios diferentes para determinar os juros cobrados de cada cliente. Assim, para encontrar a melhor condição para cada perfil, é preciso pesquisar e comparar.
Euforia
Renata alerta que este "é um momento delicado, com várias instituições abrindo as portas". Justamente por isso, é fundamental que os consumidores evitem uma "situação de euforia". "A portabilidade tem que ser uma atitude de reflexão, de pesquisa, tem que solicitar todos os dados, pedir por escrito, para poder verificar os benefícios recebidos."
E a modalidade deve ser usada para trocar uma dívida mais cara por uma mais barata ? não para que o cliente contraia novas dívidas. "Não é porque tenho crédito que vou entrar em dívida, vou comprar um carro mais caro, por exemplo", orienta Samy Dana.