A Petrobras recebeu autorização do Ibama para perfurar um poço exploratório no bloco FZA-M-059, localizado em águas profundas do Amapá, a cerca de 500 quilômetros da foz do Rio Amazonas e 175 quilômetros da costa. A licença, concedida após quatro anos de discussões ambientais, marca o avanço do projeto mais polêmico da estatal na chamada Margem Equatorial brasileira e reacende o debate entre desenvolvimento energético e preservação ambiental, a poucos meses da COP30, que será sediada em Belém (PA).
Segundo estimativas da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o volume recuperável na região pode chegar a 6,2 bilhões de barris de óleo equivalente (boe), mais da metade das reservas provadas atuais da Petrobras, que somam 11,4 bilhões de boe. A companhia pretende iniciar imediatamente a perfuração, prevista para durar cinco meses. Nesta fase, ainda não há produção de petróleo: o objetivo é identificar o potencial econômico da área.
O licenciamento ambiental se arrastava desde 2020 e chegou a ser negado pelo Ibama em 2023. Após recursos e ajustes técnicos, o órgão reconsiderou a decisão. O processo incluiu três audiências públicas, 65 reuniões setoriais e vistorias em estruturas marítimas, além de um Estudo de Impacto Ambiental (EIA/RIMA) e uma avaliação pré-operacional que mobilizou mais de 400 pessoas.
Entre as condicionantes impostas pelo Ibama estão a criação de um Centro de Reabilitação e Despetrolização de Fauna em Oiapoque (AP), somando-se ao já existente em Belém (PA) e a presença de três embarcações dedicadas ao atendimento de fauna oleada.
O ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, classificou a decisão como um passo estratégico.
“A Margem Equatorial representa o futuro da nossa soberania energética. O Brasil não pode abrir mão de conhecer seu potencial. Fizemos uma defesa técnica para garantir que a exploração ocorra com total responsabilidade ambiental e dentro dos mais altos padrões internacionais.”
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vinha pressionando o Ibama pela liberação e chegou a criticar a demora no processo. O aval também atende a um compromisso político com o senador Davi Alcolumbre (União-AP), aliado do governo, que celebrou a licença como “uma vitória do Amapá e do Brasil”.
Nova fronteira energética
A Petrobras reservou US$3 bilhões em seu plano de investimentos 2025–2029 para explorar 15 poços na Margem Equatorial, sendo oito deles na Bacia da Foz do Amazonas. A presidente da companhia, Magda Chambriard, afirmou que o projeto inaugura uma “nova fronteira energética mundial” para o país.
“Vamos operar com segurança, responsabilidade e qualidade técnica. Esperamos comprovar a existência de petróleo na porção brasileira dessa nova fronteira.”
Especialistas avaliam que a Margem Equatorial é crucial para a renovação das reservas da Petrobras, já que o pré-sal deve atingir seu pico de produção na próxima década. “Esses campos têm vida útil limitada; o Brasil precisa seguir descobrindo novas reservas para manter relevância global”, explica Pedro Rodrigues, da consultoria CBIE.
Impacto econômico e críticas ambientais
A ABESPetro, associação que reúne empresas de serviços do setor, destacou o potencial de geração de empregos e renda, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. “A produção e a industrialização associadas são fundamentais para o crescimento e a criação de empregos qualificados”, afirmou o presidente-executivo, Telmo Ghiorzi.
Por outro lado, ambientalistas alertam para os riscos ecológicos. A Margem Equatorial abriga o maior cinturão de manguezais do mundo e o sistema de recifes da Amazônia, descoberto em 2016. Críticos afirmam que a licença, concedida às vésperas da COP30, envia um sinal contraditório à agenda climática brasileira.
O Ministério do Meio Ambiente, comandado por Marina Silva, reforçou que a liberação ocorreu “após rigoroso processo de análise ambiental” e que as exigências do Ibama aprimoraram substancialmente o plano de contingência da Petrobras.
Disputa estratégica
A corrida pela Margem Equatorial ganhou força após a descoberta de grandes reservas no litoral da Guiana, em 2015, que transformaram o país vizinho em um dos que mais crescem no mundo. Para analistas, o Brasil tenta recuperar o tempo perdido e evitar ficar à margem de uma nova onda global de exploração.