O presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, confirmou nesta quarta-feira (24) que está deixando o comando da autoridade monetária no fim deste ano. Com isso, não permanecerá no BC na gestão da presidente eleita, Dilma Rousseff.
"Acredito que, um profissional deve iniciar e concluir sua missão na hora certa. Regras de boa prática de governança de BCs aconselham de que um presidente de BC não fique mais do que dois mandatos. No Brasil, coincide com mandato do presidente da República. É o momento adequado para encerrar a missão. Estou feliz, gratificado e realizado", declarou Meirelles a jornalistas.
O mais cotado para substituir Meirelles é o diretor de Normas do BC, Alexandre Tombini. Antes de sair, Meirelles ainda comanda a última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, marcada para 7 e 8 de dezembro. A expectativa do mercado financeiro é de que a taxa básica de juros permaneça estável em 10,75% ao ano.
Trajetória
Meirelles estava no cargo desde o início do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em janeiro de 2003. Presidente mais longevo no cargo, ele deixa o comando do poderoso Banco Central após oito anos. Antes de ser assumir o BC, Meirelles foi presidente mundial do BankBoston, função pela qual se tornou conhecido.
Ele iniciou suas atividades no Banco de Boston, em 1974, e se tornou presidente da instituição no Brasil em 1984. Também já foi membro do conselho da Harvard Kennedy School of Government, e da Sloan School of Management do MIT (Massachusetts Institute of Technology). Em 2002, foi eleito deputado federal pelo PSDB, cargo do qual abdicou para comandar o Banco Central na gestão petista.
Em 2005, com uma Medida Provisória, Meirelles foi o primeiro presidente do BC a obter formalmente o status de ministro de Estado. Naquele ano, foi aberto um inquérito contra ele por sonegação, lavagem de dinheiro, crime eleitoral e remessa ilegal de dinheiro para o exterior, relativo ao período em que esteve no BankBoston.
Atuação no BC
Durante o tempo à frente da autoridade monetária, Henrique Meirelles foi alvo recorrente do chamado "fogo amigo", ou seja, das reclamações da base aliada ou de membros do próprio governo.
Entre seus principais críticos, estão o vice-presidente da República, José Alencar, que clamou publicamente diversas vezes pela redução da taxa básica de juros. Porém, também já se revezaram nos protestos parlamentares, como o senador Aloizio Mercadante (PT-SP), ou, até mesmo o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Este último atuou mais nos bastidores.
Os protestos contra Meirelles aconteceram principalmente por subir os juros em 2004, e, mais recentemente, em 2008, antes da eclosão da crise financeira internacional, ou por evitar baixá-los quando a inflação começava a dar sinais de arrefecimento.
Crescimento econômico e crise financeira
Apesar do "fogo amigo", o país ostentou, segundo números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o mais longo ciclo de crescimento da história recente do país, com uma taxa acima de 3% ao ano por mais de 60 meses.
No ano passado, com a crise financeira internacional, porém, o Produto Interno Bruto (PIB) se retraiu 0,2%, no que foi a primeira contração desde 1992. Mesmo assim, o desempenho ficou acima das principais economias mundiais.
Para evitar a falta de crédito, Meirelles liberou cerca de R$ 100 bilhões em depósitos compulsórios (que têm de ser mantidos no BC) no ano passado. Em 2010, com o retorno à normalidade, R$ 71 bilhões já retornaram para os cofres da autoridade monetária. Em 2009, também efetuou cortes seguidos dos juros para estimular a economia.
Em 2003, no primeiro ano de Meirelles no comando do BC, o crescimento foi de 1,1%, subindo para 5,7% em 2004. Em 2005, 2006 e 2007, o PIB avançou, respectivamente, 3,2%, 4% e 6,1%. No ano de 2008, a economia brasileira cresceu 5,1%. Para este ano, a previsão do mercado é de um crescimento acima de 7,5%.
Taxa de juros
Quando Meirelles assumiu o BC, os juros básicos estavam em 25% ao ano e, para conter o aumento da inflação e a falta de confiança dos investidores, elevou-os para 26,5% ao ano. No início de 2004, porém, a taxa já havia recuado para 16,5% ao ano.
Mais recentemente, durante as turbulências externas, o BC baixou a taxa básica ao menor nível da história (8,75% ao ano). Neste ano, porém, já elevou a taxa para 10,75% ao ano. Os juros brasileiros são os mais altos do mundo em termos reais (após o abatimento da inflação). Economistas alertam que os juros altos atraem capital para o país, em busca de melhor remuneração, o que contribui para a queda o dólar.
Inflação na era Meirelles
No início do governo Lula, em 2003, a inflação, medida pelo IPCA, ficou em 9,30% por conta da falta de confiança no recém empossado governo. Em 2004, recuou para 7,6%, caindo para 5,69% em 2005. No ano seguinte, o IPCA somou 3,14% e em 2008, com o forte crescimento da economia, avançou para 5,9%. No ano da crise financeira, caiu para 4,31%, e neste ano economistas estimam um IPCA próximo de 5,5%.
As metas de inflação estabelecidas só não foram cumpridas somente em 2003, no primeiro ano de Meirelles no comando do BC. Naquela ocasião, ele enviou uma carta aberta ao presidente Lula informando que a inflação foi mais elevada no início daquele ano, por conta da "deterioração de expectativas" registrada em 2002, quando o mercado reagiu à liderança de Lula na disputa presidencial. De 2004 em diante, as metas pré-estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional foram cumpridas.
Aumento das reservas
Durante a gestão de Meirelles, o BC aproveitou, também, para reforçar o caixa do país, ou seja, as reservas internacionais brasileiras, atualmente acima de US$ 280 bilhões. Este fator foi considerado por especialistas como primordial para que o país passasse pelas turbulências externas de 2008 e 2009 sem maiores consequências. No início de 2003, quando Meirelles assumiu, as reservas brasileiras estava em US$ 37,6 bilhões. Alguns críticos observam, porém, que o crescimento das reservas tem um custo alto para o país, uma vez que têm de pagar a diferença entre a taxa de juros brasileira e a diferença dos juros internacionais, mais baixos.