Víctor Pérez conta que não gasta mais de cinco bolívares a cada semana para encher o tanque de sua moto, com a qual realiza serviço de táxi. São menos de 60 centavos de dólares para abastecer 12 litros três vezes, considerando a taxa oficial mais valorizada de câmbio, na qual a moeda norte-americana vale 6,30 bolívares. Aos 35 anos, este morador de uma zona popular na região metropolitana de Caracas considera que seu gasto mensal com gasolina, de cerca de sete reais por mês, ?não é nada?.
Em um posto da zona leste de Caracas, o painel da bomba indica a arrecadação da última venda de combustível: 20,7 litros por apenas dois bolívares. Com a quantia paga, não é possível comprar nem um litro água mineral, seis vezes mais caro que os 20 litros de gasolina, ou um maço de cigarros, que supera 30 vezes esse valor. É necessário menos de R$ 1,50 para encher um tanque de 40 litros. Em muitos casos, a gorjeta dada ao frentista é maior que o preço pago para abastecer. ?Há lugares que nem nos cobram?, confirma o motoqueiro Romer Delgado.
A cena descreve algo rotineiro na Venezuela. Produtor de petróleo e dono das maiores reservas comprovadas do planeta, o país vende internamente um litro de gasolina de alta octanagem a 0,097 bolívares (equivalente a R$ 0,03). No Brasil, por exemplo, cobra-se, em média, R$ 2,79 por litro de gasolina. ?Neste país não se paga pela gasolina, a PDVSA paga para que coloquem gasolina?, disse em dezembro o ministro de Petróleo e presidente da empresa estatal PDVSA (Petróleos da Venezuela), Rafael Ramírez, citando como exemplos o preço de um refrigerante, cujo custo de 12 bolívares equivalia a 250 litros de diesel.
?Temos um recorde que não é motivo de orgulho, nem satisfação. Nem sequer a Arábia Saudita, com um nível de ingresso tão alto como tem, apresenta o preço de gasolina que nós temos?, manifestou, lembrando que estatísticas mostram a Venezuela como o país que vende a gasolina mais barata do mundo.
Ramírez lembrou que devido aos baixos preços de venda no mercado interno, a PDVSA trabalha com perdas. A gasolina de 95 octanos, por exemplo, é vendida a um valor 28 vezes menor que o custo de produção. No caso do diesel, o custo de produção é 50 vezes maior que o preço no mercado interno. ?Tudo isso é perda de oportunidade para o país e para a PDVSA, vamos com perdas?, explicou.
Em dezembro, Ramírez disse que US$ 12,59 bilhões são perdidos anualmente pelo atual preço. No fim de junho, durante a apresentação de um informe de gestão, o ministro disse que os custos e gastos para produzir barris ?não recuperados? somam mais de US$ 15 bilhões com o crescimento acelerado do consumo interno, que em 2013 foi de 703 mil barris diários.
Apesar da necessidade do ajuste no preço da gasolina, a Venezuela ainda lida com o tabu de que o aumento poderia desatar uma eclosão social. Há 17 anos, durante o segundo governo de Rafael Caldera, registrou-se o último ajuste. Para muitos venezuelanos, no entanto, a memória do último aumento da gasolina é o de 1989, quando o então presidente Carlos Andrés Pérez lançou mão de um pacote neoliberal que levou a uma onda de protestos, conhecida como "Caracazo" que, após violenta repressão estatal, resultou em quase 300 mortes, segundo dados oficiais, apesar de outros cálculos apontarem milhares de desaparecidos.