Conselho comunitário oferece atividades esportivas e de dança com crianças carentes

Mesmo com estrutura precária, insuficiente, o Conselho Comunitário do Residencial o Sonho não Acabou vem realizando um trabalho social com as famílias que moram no local, tendo como meta dar esperança

Conresna | Kelson Fontinele
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Das carências e necessidades surge a força de vontade de nadar contra a maré e mostrar que, de fato, o sonho não acabou, o Conselho Comunitário de Moradores do Residencial O Sonho Não Acabou (CONRESNA), zona Leste de Teresina, onde moram cerca de 400 pessoas em mais de 120 famílias, realiza atividades esportivas e de dança com crianças e adolescentes da comunidade. Com estrutura precária, as atividades andam longe do ideal, mas cumprem um papel social que vai além do que qualquer prédio bem equipado pode oferecer mais: livrá-los das ruas e dos perigos do mundo dos adultos.

É na pequena casa 3, localizada na quadra H, que as crianças e adolescentes da região têm acesso às aulas de karatê, futebol e balé oferecidas no espaço. As aulas de balé acontecem em uma pequena garagem, as de karatê em um terraço improvisado, com o tatame furado e iluminação precária, e as de futebol no meio da rua, onde as traves são pedaços de tijolo. Apesar das dificuldades, o sentimento comum é de esforço entre quem participa e ministra as atividades.

Para manter as aulas, o presidente do conselho Osvaldino Pereira luta todos os dias contra as adversidades com o apoio dos professores que ministram as atividades. O trabalho é totalmente voluntário, e mostra que com garra e “sangue no olho” é possível alcançar os objetivos, ainda mais quando estes são tão nobres. Em regiões da periferia, tomada pelo tráfico de drogas, tirar os jovens da ociosidade é a única maneira de mantê-los longe dos maus caminhos. “Vendo essas crianças na ociosidade, comecei a buscar pessoas que pudessem trabalhar voluntariamente para atendê-las. Daí apareceu o futebol, o balé e o karatê. Quando essas crianças começaram a praticar o esporte, ainda que dessa forma precária, eles vão para casa, dormem cedo e vão à escola. A minha maior preocupação aqui é com as drogas”, afirma Osvaldino.

Ainda que com as dificuldades, o brilho no olhar das crianças que chutam com força a bola para o gol ou calculam milimetricamente os movimentos do karatê e do balé emocionam. Embora eles reconheçam que muito poderia melhorar, são altamente assíduos, e fazem questão de participar de todas as aulas. “Mesmo com o nosso esporte de péssima qualidade, pois não recebemos incentivo de nenhuma autoridade pública, percebemos que as coisas estão mudando. Eu, como líder comunitário, não vou desistir, e vou lutar pelas crianças, pois todo mundo sabe que elas são o nosso futuro”, complementa o presidente da CONRESNA.

E para além do acompanhamento das atividades, o Conselho monitora o rendimento escolar para que as crianças e adolescentes estejam sempre na escola. Quem mais apoia a iniciativa são os pais dos pequenos, que ficam satisfeitos em saber que há quem olhe por seus filhos, que acabam se esforçando a partir da disciplina que apreendem através do esporte. “Aqui está precisando de muita coisa para as nossas crianças. Sou mãe e vejo a necessidade de todos aqui. Estamos em uma comunidade carente, que precisa de lazer para as crianças. Temos esse guerreiro [Osvaldino], que está aqui lutando, mas precisamos de ainda mais”, diz Francisca Mendes de Sousa

Karatê traz consigo a luta diária de quem tem fé para seguir adiante



Quem ministra voluntariamente as aulas de karatê é o professor Vicente Lemos. Apesar das dificuldades, ele treina sempre com as crianças e adolescentes que mostram ter afinidade com a luta marcial de origem japonesa.

Atualmente, cerca de 36 alunos entre cinco e 17 anos frequentam as atividades ministradas por ele.

O professor Vicente Lemos incita que o esporte ensinado por ele traz consigo a luta diária de quem tem fé para seguir adiante: “Queremos tirar esses meninos da rua. Antes nós treinávamos no meio da rua, com os carros passando, mas conseguimos com muito esforço este espaço aqui com a colaboração dos pais. Ainda que a estrutura seja frágil e a céu aberto, quando chove não treinamos e a iluminação também é muito precária, temos alunos muito esforçados, uma, inclusive, já conquistou uma premiação”, explica.

Há Alunos como a jovem Mikaelly Lemos, de apenas 11 anos. Ainda que a pequena cumpra seus treinamentos em um tatame furado e sem iluminação adequada, ela obteve destaque nacional na categoria de 10 a 12 anos, conquistando o primeiro lugar com seu inquestionável talento, mostrado a reportagem em golpes certeiros. Ela é um exemplo de como tudo em que se aplica dedicação e esforço serão colhidos bons frutos: “Fui campeã brasileira de luta e kata e pretendo ser de novo. Sempre treinei aqui desde criança, e meu objetivo é mostrar o karatê para todos, para que as pessoas enxerguem no esporte uma alternativa melhor que os caminhos ruins”, diz a decidida lutadora.

As barreiras dessa corrente do bem já ultrapassaram as barreiras do Residencial O Sonho Não Acabou. Crianças de outras comunidades também frequentam as aulas do professor Vicente Lemos, o que traz outro problema, que a é questão do translado desses jovens de um bairro para o outro: “Muitas crianças que fazem o esporte são de outras regiões como a Vila Samaritana e a Piçarreira, e o seu retorno durante a noite também é difícil. Tentamos falar com motoristas de ônibus escolares para ver se eles poderiam nos ajudar, mas ainda não conseguimos”, conta.

Com a vontade dos participantes vem a superação dos problemas

Os pés descalços queimam no asfalto e os carros passam, vêm e vão. Se existe algo errado no paraíso, é a contradição em jogar bola com os pés descalços no asfalto, com a iminência de sofrer um atropelamento pelo incessante tráfego de veículos de uma das ruas mais movimentadas do Residencial O Sonho Não Acabou. Ao contrário das demais escolinhas de futebol da zona Leste, que possuem grama artificial e técnicos renomados como professores, ali é o pedreiro José Ferreira Filho quem auxilia as técnicas desportivas.

Atualmente, 26 alunos de 6 a 14 anos participam dos jogos de futebol.Acima de qualquer dificuldade, os pequenos são incessantes com a bola surrada nos pés, que nunca viram uma chuteira. As traves são pedaços de tijolo, que marcam a entrada do gol, com o balançar de uma rede imaginária.Próximas ao esgoto que desemboca próximo ao campo improvisado, os meninos correm de um lado para outro e vez ou outra param a partida para dar passagem aos carros, motos e ônibus.

O professor José Ferreira Filho reconhece as dificuldades, mas para ele não dá para parar as atividades desenvolvidas por ele em parceria com Osvaldino: “É melhor eles estarem aqui do que brincando na rua com coisa pior. O futebol é isso, é uma arma contra as drogas. Queríamos que tivesse um campo de futebol para eles, mas é difícil. No asfalto os meninos machucam o pé”, avalia.

Mas para os meninos, apesar das dificuldades, também tem muita festa e o sonho de um dia se tornarem grandes jogadores de futebol. “Eu queria treinar em um campo porque a gente machuca os pés no asfalto”, diz o menino Luanderson Ferreira, de 12 anos. “A gente joga no meio do piche, correndo o risco de sofrer um acidente. Os carros não param, passam direto. Mas o importante é que os professores ensinam bem e incentivam a gente a treinar”, diz Francisco Alisson, de 14.

Só a bailarina que não tem

As meninas que fazem balé no Residencial O Sonho Não Acabou não têm coceira, verruga nem frieira, e muito menos falta de maneira. Mas elas também não têm a melhor das estruturas para praticar as aulas de dança, que acontecem em um espaço improvisado na garagem de uma casa, sem ventilação e bebedouros.

As aulas acontecem sob tutoria da professora Luzinete Martins, que já tem 15 anos de trabalho voluntário como professora de balé. Apesar das dificuldades, ela desenvolve a disciplina e encoraja as meninas a buscarem os melhores caminhos através da dança: “Quero que elas encontrem através do balé um estímulo para seguirem adiante.

Cobro sua presença na escola, uma boa higiene e disciplina. Essas crianças poderiam estar nas ruas, nas praças, ou com gravidez precoce. O balé é uma alternativa para tirá-las das ruas”, explica.

Apesar de não receber um centavo pelas aulas que ministra, Luzinete diz que sua maior satisfação é a gratidão e ver as moças entrando em universidades ou trilhando caminhos através do balé: “O que me mantém no trabalho voluntário é a gratidão das pessoas. O Osvaldino é uma pessoa maravilhosa, e o trabalho desenvolvido na comunidade é louvável”, finaliza a professora.







Fotos: Kelson Fontinele

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