Angelea Let, 49 anos, está sentada em um dos cubículos da área para fumantes para usar crack. "Eu sinto um uma sensação boa das minhas pernas até a minha cabeça, já tirou 50% da minha dor", diz ela enquanto fuma.
Angelea disse ao programa Victoria Derbyshire, da BBC, que ela gasta cerca de £600 (R$ 2,371 mil) por semana em crack.
Ela é uma das centenas de usuários que todos os dias visitam Skyen, como é chamada uma das "salas de consumo de drogas com risco mínimo" de Copenhague, na Dinamarca.
São oito horas de uma manhã fria e úmida de uma quinta-feira, e já há vários usuários dentro de Skyen.
Também chamada de "sala de shoot", trata-se de um lugar onde usuários podem usar drogas ilegais com supervisão médica.
Drogas pesadas como heroína e cocaína, por exemplo, são utilizadas na "sala de shoot" sob supervisão médica. Os equipamentos, incluindo agulhas para injeção, são limpos e oferecidos gratuitamente pelo abrigo.
Tudo é oferecido — menos as drogas, que os usuários devem trazer consigo.
"Salas de shoots" existem há mais de 30 anos. Oficialmente, elas estão em países como Suíça, Holanda, Alemanha, Dinamarca, Espanha, Canadá e Austrália.
A França foi um dos últimos países a aderir - um hospital de Paris inaugurou sua primeira "sala de consumo seguro de drogas com risco mínimo" em outubro de 2016. E o Reino Unido pode ser o próximo da fila, já que Glasgow, na Escócia, planeja abrir a sua sala, inspirada no caso da Dinamarca, em breve.
A Dinamarca abriu sua primeira "sala de shoot" em 2012 e Skyen, que foi aberta há três anos, é uma das seis salas operantes no país. Sustentada com dinheiro público, sua manutenção custa cerca de £1 milhão (R$ 3,9 milhões) por ano.
A instalação é organizada e controlada. Há duas áreas separadas para pessoas tomarem drogas - a sala de injeção, que comporta nove pessoas, e outra com oito lugares, para aqueles que querem fumar drogas pesadas.
Mas esses locais não encorajam o uso de drogas ilegais?
Rasmus Koberg Christiansen, gerente da Skyen, acredita que não.
"A situação daqui, antes de termos salas de consumo de drogas, era que todos os usuários sentavam nas ruas e se injetavam em público", diz Christiansen. "Depois que abrimos esse lugar, cerca de 90% do uso de drogas em espaço aberto acabou".
"Tivemos centenas de casos de overdose, nenhuma delas foi fatal. Nosso propósito é redução de danos, contudo, se e quando um usuário expressar o desejo de parar com o uso de drogas, reagimos imediatamente e ajudamos a pessoa a contatar uma clínica", afirmou.
Localizada no coração da área de prostituição da capital dinamarquesa, Skyen fica em um local conveniente para Angelea, que é voluntária de um "sopão" beneficente durante o dia e trabalha como prostituta à noite.
Segundo ela, as consequências de um acidente de carro há quase 20 anos a levaram ao uso de drogas.
"Depois de passar pelo acidente, não consegui sentir minha perna nem meu braço esquerdo durante seis anos. Eu consigo senti-los agora, mas também sinto dor o tempo inteiro".
Para atenuar a dor, Angelea fuma sobretudo crack, e às vezes usa heroína.
Ela se sente segura na "sala de shoot" sabendo que a equipe médica e uma das enfermeiras que estão sempre em serviço ficarão de olho nela. Eles estão lá para impedir que as pessoas morram de overdose.
A sala Skyen
- 700 mil usos de droga no local desde sua abertura há 3 anos
- Mais de 500 overdoses, sem nenhuma morte
- Aberta 23 horas por dia Abriga entre 500 e 700 consumos de droga por dia
- Tem 5.772 usuários registrados
- As pessoas têm 35 minutos na área de fumantes e 45 minutos na sala de injeção
Há um fluxo constante de pessoas nas dependências de Skyen ao longo do dia. Alguns deles são novos para a equipe, mas muitos são usuários regulares que aparecem várias vezes por um período de algumas horas.
No final da tarde, Angelea volta para fumar crack mais uma vez.
"Eu estou aqui de novo porque sinto muita dor", diz, enquanto se apressa para a área de fumantes.
As salas ficam abertas durante a noite, fechando apenas por uma hora todas as manhãs para a limpeza.
Não é uma clínica de tratamento para que os usuários deixem de usar drogas. Muitas pessoas vão usá-las antes de voltar aos seus difíceis e muitas vezes perigosos estilos de vida.
Mais tarde, a apenas algumas ruas dali, Angelea trabalha, tentando encontrar clientes que sustentem seu vício.
"Eu vou ao trabalho, faço algum dinheiro e então fumo crack, depois volto para o trabalho, faço mais dinheiro e fumo mais crack de novo na sala. Essa é a minha adorável vida", diz ela, com um riso amargo.