Câncer de mama: a esperança que vem da amizade

O Grupo Divas Em Forma é formado por mais de 130 mulheres que se apoiam para superar o câncer e mostram que a cura pode ser alcançada com hábitos saudáveis e alegria de viver.

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O câncer de mama é um grande desafio para as mulheres. A doença responde por 29% dos casos de tumores, segundo informações do Instituto Nacional do Câncer. A boa notícia é que a mortalidade vem diminuindo com a medicina preventiva, hábitos saudáveis e um ingrediente indispensável à vida: a alegria de viver. 

Crédito das fotos: Lucrécio Arrais

E alegria de viver combina muito bem com o grupo Divas Em Forma, que une mulheres com câncer para uma missão de empoderamento, alegria e hábitos saudáveis. Elas são divas mesmo. Seja fazendo dança do ventre ou dublando As Frenéticas, elas não param. Ao todo, são mais 130 mulheres que combinam as futuras atividades em um grupo de WhatsApp.

A iniciativa, que começou em 2016, logo cativa o apoio da comunidade e ganha os espaços da cidade com muita alegria e descontração. Neste Outubro Rosa, o Jornal Meio Norte traz a luta e a força de mulheres com sede de viver que enfrentam a doença de cabeça erguida e fé no coração.

Albertina: de um nódulo benigno para a neoplasia maligna

“Descobri um câncer na mama direita. Eu sempre fiz todo o acompanhamento com o mastologista e tudo mais. Em janeiro de 2017, eu tinha feito todos os exames e tudo estava normal, pois eu tinha um nódulo com características benignas. Quando foi em fevereiro para março, no autoexame, eu senti que havia crescido. Quando foi no dia 28 de junho de 2017 eu recebi o resultado da biópsia, dizendo que era uma neoplasia maligna. Esse é o pior momento, ninguém está preparada. Quando recebi eu estava sozinha, porque fui convicta que não ia dar em nada. Mas ao mesmo tempo eu tinha uma certeza. Então conheci as Divas, através da Vanessa, que era parente de uma amiga, a Zilma, que ficou abalada com minha situação. Então fui convidada e participo até hoje. As Divas são um grupo de ajuda onde falamos a mesma língua. Quando nos encontramos, parece que nos conhecemos há mil anos, é uma relação muito forte. Cada uma tem uma história diferente que passa pelo mesmo problema. Cada uma lida diferente, mas é a mesma experiência. Nosso grupo foi criado pela Vanessa, junto com a Eline. Nós trazemos mais pessoas, e através de uma coordenação nós organizamos as atividades”

“Quando descobri, eu sumi de todo mundo”, lembra Maria do Carmo 

“Quando eu descobri o câncer, nada passou pela minha cabeça. Eu já tinha operado a mama esquerda três vezes. Sempre aparecia um nódulo e eu mandava tirar. Depois apareceu de novo e eu ficava com raiva porque os médicos diziam que não era nada. Em janeiro eu fiz exame e quando foi em agosto, tive uns problemas, o povo diz que tem uma questão emocional, aí passei a mão ensaboada e senti um caroço no peito. Pensei: estou lascada. Eu nunca fui de estar me apalpando, mas senti e perdi a graça. Fui caçar o hospital e o Iapep estava de greve. Nem fui à ginecologista, fui direto no mastologista. Procurei o primeiro que tinha, e eu sozinha para fazer tudo isso. Então o Iapep liberou e busquei o primeiro médico que tivesse. Fiz uma biópsia, doeu muito. Até que confirmou. Quando descobri, eu sumi de todo mundo. Deixei o telefone em casa, não queria que ninguém me encontrasse. Não queria ver ninguém. Fui ao Centro, almocei, fui nas lojas. Cheguei em casa e meu marido disse que ia para o jogo, então pensei: vou bagunçar o jogo desse cara. Falei na cara dele: estou com câncer. Então ele ficou doido! Mas eu não ia contar para ninguém, porque eu fiquei com raiva. Ia fazer a cirurgia sozinha. Aí conheci as Divas. Eu tinha receio, mas depois foi um grande apoio. Agradeço demais pela acolhida delas”.

“As Divas me fortaleceram e Deus me deu outra oportunidade”, diz Maria Dalva

“O meu caso é diferente, pois meu câncer é raro e não é na mama. Mas eu acho lindo esse nome: carcinoma neuroendócrino de canal anal. É uma lesão com nódulo. Eu não fiz cirurgia, apenas biópsia, porque é um tecido muito fibroso. Dia 11 de janeiro descobri, pedi que meu filho fosse buscar o resultado do exame. Eu mesma vi, liguei para minha médica para ela dizer o resultado. Todo mundo chorou e ficou nervoso. Eu não. Só fiquei com uma dor de barriga. Pedi ajuda a Deus. Pedi que ele me conduzisse. Então fui em frente e parti para os cuidados. A Roseane, que estava em São Paulo fazendo mestrado, uma grande amiga minha, indicou um especialista na área. Ela chorou muito e ficou desesperada, mas a tranquilizei dizendo que tinha certeza que não ia morrer. O médico disse que é um caso em um milhão, e que eu deveria fazer radio e quimioterapia. Aguentei firme e forte. A única coisa que eu não queria era ficar com colostomia, igual o Bolsonaro. O famoso saquinho de cocô. Não deixei a peteca cair. Fiz a radio e a quimio juntas, eu ficava de pé porque não aguentava sentar. Entrava naquela máquina e dizia: é você e eu e eu e você! Faça a minha parte que eu faço a minha. Queimava tudo e eu passava babosa. Eu sentia muita dor, mas não reclamava. Deus é maravilhoso. Nossa Senhora pegou na minha mão. Fazia novenas e novenas. A médica nem acreditava em mim. Mas acreditei tanto que deu certo. E as Divas, então… Essas que me fortaleceram mesmo. Deus me deu outra oportunidade. Todos os médicos ficaram desacreditados”

“Temos que nos basear nos casos positivos, não os negativos”, diz Márcia Percília

“As pessoas ainda têm um estigma muito grande. Esperam te encontrar com a cara da morte. Então eu resolvi expor mesmo. Foi uma força extra, pois recebi muitas mensagens e energias positivas. Eu recebia mensagens lindas que eu chorava pelo carinho. Aí me encontram e dizem: ‘nossa, como você está ótima!’. Esperam encontrar a gente esquelética, mal vestida. Não é assim! Eu ando arrumada, sempre tive uma autoestima grande. Isso contribui muito. Quando recebi o diagnóstico foi uma surpresa, porque não havia histórico na família. E eu sempre fui muito cuidadosa porque eu tinha cistos líquidos, no período pré-menstrual. Eu sempre estive sob alerta. Então um dia, tomando banho, percebi que o seio estava aumentando e dolorido. Então fiz uma ultrassom mamária, onde constatou o nódulo. A médica, ginecologista, me tranquilizou porque era pequeno e não tinha bordas irregulares. Ela pediu para eu voltar em seis meses para reavaliar. Fui embora com a pulga atrás da orelha". 

"Meu irmão mais novo faleceu tragicamente e dei um stop. Então fui para o mastologista mesmo, e ele passou a biópsia por desencargo de consciência. É engraçado porque este foi o único exame que não abri para olhar, deixei para o médico ver. Então no dia 9 de abril, ele abriu na minha frente e olhou para mim e disse: ‘mulher, não é que é câncer?’. Então eu fiquei paralisada. Eu estava com meu namorado, que arregalou os olhos e ficou branco, amarelo e passou mal. Eu não tive reação. Minha vida passou inteira pela cabeça. Pensei que ia morrer e deixar meus filhos. Aí a lágrima desceu e ele tirou todas as minhas dúvidas". 

"Agradeço muito a Deus pelo bom acolhimento que tive. Sou professora da Uespi, mas a solidariedade falou mais alto. Parei de trabalhar, minhas colegas deram um jeito. Fiz as quimios, passei por todo o processo, meu cabelo caiu, hoje uso peruca. A autoestima diminui, claro. Mas a família, meu namorado e as Divas foram fundamentais nesse processo. Quando você tem um bom psicológico, inteligência emocional, tudo é possível. Temos que nos basear nos casos positivos, não os negativos. Descobri bem cedo. Não vou dizer que sou 100% bem. A psicóloga ajusta aos poucos, a família ampara… As quimios acabaram. Agora me preparo para a cirurgia. É um passo de cada vez. Trouxe um novo significado para minha vida. Sempre fui ativa. Hoje em dia faço step, vou para academia. Quando faço quimio na quinta de manhã, quinta a tarde eu faço uma caminhada. Mudei muito minha alimentação também”

Vilma Aquino descobriu câncer ao sentir “flechada” nas costas

“Sempre tive cistos líquidos, então fazia o acompanhamento a cada seis meses. Não fazia tempo que eu tinha ido à médica. Então fui tomar banho e senti uma flechada nas costas para o bico do peito. Isso ficou me martelando. Neste momento, não tive a coragem de fazer o autoexame. Então marquei de ir ao médico, fiz a mamografia e ele pediu para fazer uma biópsia. Ele disse para eu fazer com urgência e não demorar. Eu saí e chorei muito, porque já sabia. Tive que pagar para que saísse mais rápido. Com três dias eu recebi o resultado e iniciei o tratamento. Fiz cirurgia, tirei. Mas fiz quimioterapia antes. Coloquei prótese, meu corpo rejeitou. Depois coloquei outra e tirei de vez. Comecei a fazer radioterapia. Caiu o cabelo… Então meu marido e filho também rasparam a cabeça. Era pertinho da Copa do Mundo. Eles rasparam duas vezes. Minha família foi minha base em tudo. É um processo doloroso, perdemos o chão, a gente cai em um poço escuro. Mas eu vi uma luz no final do túnel e uma mola que achei lá no final do túnel, que era minha fé. É preciso acordar. O tempo passa e a doença pode piorar. O grupo Divas, para mim, foi fundamental. Embora eu tivesse passado por todos os processos, a Eline me convidou para participar. Todo o meu tratamento foi pelo SUS”

Apenas 40% das teresinenses fazem mamografia regularmente

Você, mulher, já fez o autoexame estes dias? E a mamografia? O câncer de mama responde melhor quando é descoberto no início e a doença ainda é um grande problema no Brasil. Para 2019 esperam-se 60 mil novos casos. “O autoexame, embora não acabe com a mortalidade do câncer, é fundamental porque somente 40% das mulheres de Teresina fazem mamografia regularmente. É preciso fazer, de preferência, duas semanas antes da menstruação, com a mama menos túrgida. É preciso levantar os braços e apalpar a mama, além de ver se sai alguma secreção do bico do peito. Caso encontre algo assim, procurar imediatamente ajuda médica”, explica Saba Carlos Vieira, médico mastologista.

Para Denisdéia Sotero, psicóloga clínica, muitas mulheres não buscam apoio por medo, mesmo quando percebem algo diferente no peito. “Eu percebo um certo medo do futuro por parte dessas mulheres, que não veem a solução diante dos próprios olhos. Hoje os tratamentos evoluíram, mas se você ficar em casa com a dúvida não adianta. É preciso ir ao médico e buscar resultados. Deu positivo? Bola para frente. É enfrentar o que tiver que enfrentar. Daí a importância do apoio psicológico durante toda a vida, pois assim é possível adquirir inteligência emocional. Chegam mulheres no consultório com medo de ir ao médico. Isso não pode acontecer. É preciso mostrar para elas como é o tratamento e dizer por ‘a’ mais ‘b’ que é preciso batalhar para vencer”, analisa.(L.A.)

Atividades físicas são mais eficazes que quimioterapia no combate ao câncer

É preciso cultivar hábitos saudáveis. As atividades físicas, por exemplo, são mais eficazes que a quimioterapia. “O câncer depende de uma alteração do DNA, que pode ser genético e também por conta da alimentação. Mas temos evidências científicas fortes que indicam que atividade física regular, seis horas por semana, diminui a incidência do ganho em 30%. Não tem quimioterapia nenhuma que faça isso. Então recomendamos para todas que façam atividades físicas e tenham alimentação saudável, sem embutidos, refrigerantes e carnes vermelhas. Frutas, legumes e carnes brancas são mais indicadas, além de reduzir o álcool”, revela Saba Carlos Vieira.

Médico mastologista Saba Carlos Vieira dá orientações para a saúde das mulheres

O câncer pode ser inicial e invasivo. “Isso depende do exame imunohistoquímico. Os mais frequentes são os que respondem à terapia hormonal, mais ou menos uns 60 a 70%. A chance de cura é muito maior. A medicina evoluiu. A taxa de cura de alguns casos é de 90%, com diagnóstico precoce. Hoje temos várias ferramentas. A cirurgia, radioterapia, quimioterapia, hormonioterapia e imunoterapia evoluíram muito. Casos que eram considerados incuráveis foram curados com a imunoterapia”, acrescenta o médico mastologista.(L.A.)

Corpo são e mente sã: a psicoterapia com suporte ao tratamento

No entanto, não somente o corpo deve ser cuidado. As mulheres terminam fragilizadas por conta da doença, fato que torna imprescindível o acompanhamento psicoterapêutico. “Muitas mulheres enfrentam o câncer sozinhas. Muitas nem mesmo têm família. Nestes casos não dá para imaginar um tratamento sem cuidar da cabeça. A psicoterapia permite que essas mulheres saibam lutar contra a doença com as armas que têm. E o principal: elas devem ficar perto de bons exemplos! Não é ficar se espelhando na fulana que morreu ou sofreu. Tem que se espelhar nos casos de cura, que hoje são muitos. No consultório percebo que essas mulheres muitas vezes só precisam de um abraço e de alguém dizendo que vai ficar bem. A gente até se emociona junto com elas”, defende a psicóloga Denisdéia Sotero.

Psicóloga Denisdéia Sotero reforça a importância de cuidar da saúde do corpo e da mente

Sobre o grupo Divas em Forma, a psicóloga diz que é uma atitude louvável. “Juntar essas mulheres é uma coisa maravilhosa. Elas trocam experiências, ajudam umas às outras. Não tem cirurgia nenhuma no mundo que faz isso. O atendimento humanizado e a busca por um caminho positivo, independente de qualquer coisa, muda diagnósticos e expectativas de vida. O emocional diz muito no tratamento do câncer. E não sou eu, Denisdéia, que estou falando isso. Temos evidências científicas que provam que o bem-estar melhora as defesas do corpo. Somos como uma máquina que precisa de bons pensamentos para funcionar bem, e isso é necessário durante toda a vida, não apenas em momentos difíceis”, acrescenta Sotero. (L.A.)

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