RIO - Um País com 11.149 moradias fincadas em aterros sanitários, lixões e áreas contaminadas, 27.478 casas erigidas nas imediações de linhas de alta tensão, 4.198 domicílios perto de oleodutos e gasodutos, 618.955 construções penduradas em encostas. Sinais de precariedade, informalidade, improvisação e até perigo, em graus variados, ajudam a formar o retrato do Brasil desenhado pela pesquisa Aglomerados Subnormais - Informações Territoriais, divulgados nesta quarta-feira, 6, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O trabalho, uma espécie de mapa das habitações pobres e/ou à margem dos serviços públicos do Brasil - favelas, mocambos, loteamentos e outros - baseia-se no Censo 2010 e aponta, naquele ano, 3.224.529 domicílios particulares ocupados por 11.425.644 pessoas nessas áreas à margem das regras do planejamento urbano.
Para fins de pesquisa, um aglomerado subnormal é definido como "uma área ocupada irregularmente por certo número de domicílios, caracterizada, em diversos graus, por limitada oferta de serviços urbanos e irregularidade no padrão urbanístico", diz o trabalho.
"É um conjunto de no mínimo 51 unidades habitacionais carentes, em sua maioria de serviços públicos essenciais, ocupando ou tendo ocupado, até período recente, terreno de propriedade alheia (pública ou particular) e estando dispostas, em geral, de forma desordenada e densa."
Os aglomerados são caracterizados por ocupação ilegal (atual ou recente) da terra (quando existente, título de propriedade há menos de dez anos), urbanização fora dos padrões e/ou precariedade de serviços essenciais.
"A pesquisa foi aplicada no País inteiro, mas em 323 municípios foram detectados aglomerados subnormais", explicou Maria Amélia Vilanova Neta, técnica da Coordenação de Geografia do IBGE. As Regiões Sudeste e Nordeste concentram a maior parte dos domicílios em aglomerados subnormais, constataram os pesquisadores do IBGE.
O trabalho apontou, nessas cidades, 6.329 aglomerados subnormais - para fins estatísticos, reuniram os dados de 15.868 dos cerca de 317 mil setores em que o País foi dividido para o Censo 2010. Isso não quer dizer que não haja moradias precárias em outros municípios, mas que apenas nos primeiros sua quantidade foi suficiente para se enquadrar nos critérios de pesquisa do IBGE.
Em números menores, domicílios com essas características são assunto de instituições estaduais ou municipais, por isso não entram nas contas federais. Mesmo assim, é possível afirmar que a maior parte das moradias do Brasil com essas características precárias e/ou informais foi mapeada no estudo.
Perfil. A pesquisa constatou que 77% dos domicílios dessas áreas de moradia informal, precária, pobre e/ou com serviços precários ficavam, em 2010, em Regiões Metropolitanas com mais de 2 milhões e habitantes. O IBGE descobriu ainda que 59,4% da população de aglomerados subnormais estava em cinco RMs: São Paulo (18,9%), Rio de Janeiro (14,9%), Belém (9,9%), Salvador (8,2%) e Recife (7,5%). Outros 13,7% acumulam-se em outras quatro RMs: Belo Horizonte (4,3%), Fortaleza (3,8%), Grande São Luís (2,8%) e Manaus (2,8%). Essas nove RMs abrigam 73,1% da população de áreas informais identificadas na pesquisa.
Em seu levantamento, o IBGE constatou que a imagem da favela carioca pendurada em uma elevação íngreme não é o perfil majoritário desse tipo de área no País. A pesquisa constatou que 1.692.567 (52,5%) dos domicílios em aglomerados subnormais do País estava em áreas planas; 862.990 (26,8%) em aclive/declive moderado; e apenas 68.972 (20.7%) em aclive/declive acentuado.
Curiosamente, foi na Região Metropolitana de São Paulo que os pesquisadores do IBGE encontraram mais domicílios em áreas com predomínio de aclive/declive acentuado (166.030). Em seguida, veio a RM de Salvador (137.283). A Região Metropolitana do Rio de Janeiro é apenas a terceira nesse quesito, com 103.750.
Entre as regiões nacionais, o Centro-Oeste se destacou com 47% de seus domicílios em aglomerados subnormais situados em áreas de aclive moderado, enquanto Nordeste e Sudeste tinham 25%, cada um, em aclive acentuado.
Nos aglomerados subnormais com predomínio de áreas planas, observou-se uma significativa predominância de construções de um pavimento, quadras com lotes regulares e vias de circulação que permitiam a passagem de caminhões e carros", afirma o texto. "Este padrão de aglomerado subnormal é o mais característico, por exemplo, no município de Macapá, que possui também grande espaçamento entre as construções." Já em áreas com predomínio de aclives/declives moderados ou acentuados, o IBGE detectou forte correlação com a predominância de construções de mais de um pavimento, baixa presença de arruamento (predominantemente becos e vielas), com predomínio de locomoção através de bicicleta/a pé ou motocicletas e de edificações sem espaçamento.
"Na Região Metropolitana do Rio (...), foram identificados muitos exemplos de aglomerados subnormais que reuniram tais características", diz o estudo.
O levantamento do IBGE constata que 51,8% dos domicílios em aglomerados subnormais ficavam em localidades onde as vias eram, predominantemente, ruas (pelas quais era possível passar automóvel ou caminhão). No Nordeste e no Sudeste, porém, predominavam escadarias, becos, travessas e rampas - em correlação com a forte presença de aclives e declives moderados e acentuados. As RMs de São Paulo e do Rio de Janeiro tinham metade dos domicílios com acesso predominante por becos e travessas.
Córregos e rios. "Em termos nacionais, a grande maioria dos domicílios em aglomerados subnormais do País apresentou predominância de nenhum espaçamento entre as construções (72,6%) e de verticalização de um pavimento (64,6%)", observa o estudo. "Nas Regiões Metropolitanas de Natal e Maceió, esse foi o padrão predominante em mais de 90% dos domicílios pesquisados."
Em termos regionais, porém, há variações. No Norte, Sul e Centro-Oeste, a predominância nos domicílios de aglomerados subnormais é de domicílios com espaçamento médio entre si e construções de um pavimento. Assim são mais de 90% das construções encontradas em Rio Branco e Porto Velho, por exemplo. No Nordeste e Sudeste, porém, há maiores porcentuais de domicílios predominantemente sem espaçamento entre si e com dois ou três pavimentos.
"Exemplos desse padrão de ocupação foram encontrados nas Regiões Metropolitanas do Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador. Estas regiões apresentaram uma expressiva quantidade de setores de aglomerados subnormais em áreas não propícias à urbanização regular, como encostas, em locais onde o solo possui menor valorização", observa o estudo.
Outra constatação do IBGE é que os sítios mais procurados para o estabelecimento dos aglomerados subnormais é a margem de córregos, rios ou lagos/ lagoas, com 12% dos domicílios do País. A liderança nesse ponto é da Região Metropolitana de São Paulo, com 148.608 domicílios nessa condição.