O Programa Bolsa Família alcançou, em julho, marca superior a 14,2 milhões de famílias atendidas em todo o país. O número só é menor do que o mês de maio de 2019, quando 14,33 milhões de famílias receberam a ajuda.
Criado em 2003, o Bolsa Família é um programa de transferência de renda do governo federal que tem o objetivo de combater a extrema pobreza no país. Em 2020, o Orçamento da União prevê que R$ 29,5 bilhões sejam pagos em benefícios do programa, mas o valor deve ser diferente, já que o Auxílio Emergencial do governo direcionado durante a pandemia substituiu o Bolsa quando foi mais vantajoso nos últimos três meses. Com esse recurso, a renda média das famílias foi pouco maior que R$1.115, num investimento superior a R$ 15,1 bilhões do Governo Federal.
A região Nordeste é a mais beneficiada, com cerca de 7 milhões de famílias, seguida do Sudeste, com quase 4 milhões, Norte, com quase 2 milhões, Sul, com pouco mais de 890 mil e, finalmente, Centro-Oeste, com 680 mil. Segundo o portal da Transparência, de janeiro de 2019 a julho de 2020 já foram disponibilizados para o programa R$ 46.7 bilhões.
O público-alvo do programa é formado, prioritariamente, por famílias que vivem em situação de extrema pobreza, com renda per capita de até R$ 89 mensais, e de pobreza, com renda entre R$ 89 e R$ 178 mensais por cada membro familiar. O benefício médio pago a cada família é de aproximadamente R$ 189.
Segundo Rafael Paschoarelli, professor de Finanças nas faculdades de Economia e Administração da USP, o Brasil é um país de muita desigualdade social, onde um executivo pode ganhar R$ 50 milhões em um ano e uma família tem de sobreviver com cerca de R$ 200 por mês. Assim, é preciso que todos entendam a importância de programas como esse para atenuar a situação de realidades que muitos não conhecem.
“O Brasil é desigual e tem muita gente miserável. As pessoas que moram nos grandes centros urbanos talvez não saibam o cheiro da miséria, o odor da miséria, o que é a miséria. Isso é muito sério. Os programas de distribuição de renda são muito importantes para essas pessoas que realmente necessitam”, destaca.
Dura realidade
O professor ressalta que algumas pessoas reclamam dos programas de distribuição de renda, alegando que eles sobrecarregam as contas do Estado. “Esse é um bom motivo para arrebentar as contas públicas, ou seja, usar esse recurso para quem mais precisa. Infelizmente o social não é prioridade no Brasil”, alerta. “Essa mesma pessoa que recebe o Bolsa Família certamente mora em um local que não tem saneamento básico, por exemplo, e seus filhos não estudam nas melhores escolas. “Só quem está lá, passando fome, sabe a importância desses programas de distribuição de renda.”
Jossânia Maria, 44 anos, moradora de Campestre do Maranhão, município com pouco mais de 14 mil habitantes, recebe o benefício há cerca de 17 anos e explica que os R$ 130 mensais que entram todo mês são fundamentais, principalmente porque ela está desempregada. Ela conta também a situação de uma vizinha, que não tem renda, precisa pagar pela moradia e fica com muito pouco ou quase nada para conseguir sobreviver o resto do mês.
“É bom porque não temos renda e temos esse pouquinho para receber. Só recebo R$ 130, mas me serve. Conheço uma mulher que recebe R$ 250. Ela paga o aluguel de R$ 200, paga uma ou outra coisa e sobram apenas R$ 10”, relata.
Jossania faz bicos de manicure para tentar complementar a renda, mas ficou até mesmo sem esse dinheiro neste momento da pandemia, por causa do distanciamento social. “Felizmente o auxílio emergencial, que é maior que o Bolsa Família, veio para nos socorrer. Sem ele não dá para saber como a gente ia se virar”, ressalta.
É preciso mais
Rafael Paschoarelli acredita que existem diversas maneiras de conseguir mais recursos para se investir na área social, ainda incipiente no país. Para ele, basta, por exemplo, olhar para outros setores apoiados pelo governo, como o setor automobilístico, que recebe bilhões em desonerações tributárias.
“Se somarmos o quanto que o setor automobilístico já recebeu de benefício, seja nos âmbitos estadual ou federal, são muitos bilhões. E muitas vezes são auxílios para pessoas que precisam menos”, lembra o professor.
Rafael alerta também que outra crítica comum ao programa, a de que existem oportunistas no país que se beneficiam do auxílio indevidamente não deve ser levada a ferro e fogo, pois pode atrapalhar um importante benefício às milhões de famílias miseráveis que dependem do programa para sobreviver.
“Não podemos pegar esses casos e desmerecer o programa inteiro. Não é porque encontramos exceções que vamos retirar essa importante rede de proteção social”, destaca.
O programa em números
Por conta da pandemia, os beneficiários do Bolsa Família tiveram uma ajuda ainda mais vantajosa nos últimos meses, por conta do Auxílio Emergencial. Em todo o Brasil, pouco mais de 704 mil famílias receberam o valor regular do programa, enquanto 13,6 milhões optaram por receber o Auxílio Emergencial.
O estado com mais famílias beneficiadas foi a Bahia, com 1.840.200, seguido por São Paulo, com pouco mais de 1,6 milhão e Pernambuco, que teve cerca de 1,1 milhão de famílias amparadas pelos recursos. Outros estados do Nordeste, historicamente uma região mais vulnerável, também tiveram boa representatividade no benefício, casos de Ceará e Maranhão, com 1 milhão e 960 mil famílias beneficiadas respectivamente.