"A gente resolveu sair para voltar à vida como era antes". Era com este espírito que a estudante de arquitetura Luciana Probst, 23, esperava na fila para entrar no Muzeo Pub, onde assistiria a um show do cantor Leo Paim, na noite deste sábado (2), em Santa Maria (RS).
A casa noturna abriu as portas pela primeira vez desde o incêndio que matou 240 pessoas na boate Kiss, no dia 27 de janeiro.
Logo após a tragédia, a Prefeitura decretou luto de 30 dias na cidade e proibiu as baladas de abrirem as portas. Quando o período imposto pelo governo local expirou, na última quinta-feira (27), as casas foram fiscalizadas pela Secretaria de Controle e Mobilidade Urbana. Somente aquelas com a documentação em dia puderam reabrir.
Foi quando deu para ter uma ideia mais precisa do clima da cidade. A maioria das casas noturnas continua com as portas fechadas. Aquelas que abriram, pareciam animadas. No entanto, quem conhece bem a cidade percebeu que o movimento estava mais fraco que o de costume, neste sábado (2).
"Hoje ninguém me ligou para levar para as boates. As filas das casas noturnas estão bem pequenas comparadas com o que geralmente vemos", reclamou o taxista Deocar Penna, 47, que trabalha em um ponto em frente à boate Ballare, no centro.
Clima na noite mudou, e "quem saiu, não estava alegre"
Na quinta (28) e na sexta-feira (1º), alguns barzinhos com música ao vivo chegaram a reabrir. As festas de formatura voltaram a ser realizadas na cidade --Santa Maria é conhecida no Estado pelo grande número de estudantes universitários.
Nas ruas, os jovens davam sinal de que queriam tocar a vida em frente. Na noite de sexta-feira (1º), o calçadão da rua Salvador Isaia, no centro da cidade, estava repleto deles tomando chimarrão e tocando violão.
Mas, ao conversar com a estudante Kelly Gaspar, 29, no entanto, a impressão que se tinha era a de que os jovens estavam com vontade de sair após um mês de luto, mas, ao mesmo tempo, pareciam ter certa vergonha de se divertir em uma cidade que ainda não se recuperou da tragédia.
"Acabei de ver uma placa de luto em frente a uma loja e fiquei pensando na Kiss. Mas, ao mesmo tempo, a gente não tem como se privar de sair durante a noite. Vim para cá para me divertir, mas claro que tenho respeito por quem morreu na tragédia", explicou a estudante, que também resolveu curtir a noite no Muzeo Pub.
Segundo ela, o clima não chega a ser fúnebre ou triste. Mas, as pessoas que revolveram sair não estavam alegres, como costumam ser.
"O pessoal geralmente é mais exaltado, espalhafatoso. Está todo mundo conversando baixinho. Está diferente", observou.
Abalado, músico volta a tocar em Santa Maria para "seguir em frente"
Durante o período de luto em Santa Maria, o cantor Leo Paim precisou tocar em outras cidades gaúchas para continuar trabalhando. Na noite de sábado (2), ele se apresentou pela primeira vez em uma casa noturna da cidade desde a tragédia.
Paim ficou particularmente abalado pela morte de seu amigo de shows pela cidade, o gaiteiro Danilo Jaques, da banda Gurizada Fandangueira. Mesmo assim, disse que a vida noturna de Santa Maria precisa voltar a ser o que era antes, mas agora com muito mais segurança.
"Como tudo na vida, é preciso reagir. Santa Maria precisa sair do luto. Esta cidade nunca foi triste. Claro que o que aconteceu não dá para ser desfeito, mas precisamos seguir em frente", afirmou, seguindo o mesmo modo de pensar de quem estava esperando seu show.