Morreu na tarde desta quinta-feira (14), no Instituto do Coração, em São Paulo, o ex-ministro da Justiça Fernando Lyra, aos 74 anos. Ele estava internado na unidade de saúde desde o dia 5 de janeiro, depois de ser transferido de um hospital da capital pernambucana, onde deu entrada no dia 29 de dezembro. Lyra foi hospitalizado para tratar uma infecção urinária que havia piorado o quadro de insuficiência cardíaco já apresentado pelo paciente. O corpo do político chega ao Recife às 11h desta sexta-feira (15). O velório ocorre na Assembleia Legislativa de Pernambuco (Alepe), com visitação aberta ao público a partir de meio-dia. O sepultamento está marcado para as 17h, no cemitério Morada da Paz, em Paulista, no Grande Recife.
Fernando Lyra tinha 74 anos e nasceu no Recife, mas viveu a infância e a adolescência em Caruaru, no Agreste pernambucano. Formou-se em direito, mas não abraçou a profissão de advogado, porque dedicou toda a vida à política. Foi um dos fundadores do antigo Movimento Democrático Brasileiro (MDB), que mais tarde passou a se chamar PMDB. Em 1966, ganhou a primeira eleição e ocupou uma cadeira na Assembleia Legislativa de Pernambuco, mas teve o mandato interrompido dois anos depois pelas forças da repressão. Quatro anos depois, em 1970, se elegeu deputado federal e renovou o mandato por mais seis vezes. Em Brasília, destacou-se como um dos parlamentares mais atuantes do Congresso. Foi também um dos criadores do Grupo dos Autênticos - formado por deputados e senadores que, dentro e fora do Congresso, faziam oposição constante à ditadura militar instalada no País em 1964.
Em 1984, se engajou na luta pelas eleições diretas e percorreu o País ao lado de lideranças políticas como Tancredo Neves e Ulysses Guimarães. Com a derrota, na Câmara dos Deputados, da emenda que previa o restabelecimento das eleições diretas para presidente da República, Fernando Lyra partiu para uma alternativa: articulou o lançamento da candidatura de Tancredo Neves à presidência pelo voto indireto, através do colégio eleitoral. "Eu não escolhi ser coordenador. Eu me transformei em coordenador por conta do processo", contou o ex-deputado em longa entrevista à TV Câmara, gravada no Recife em 2008, exibida pelo canal em 2009 e disponível na internet.
"Tancredo me disse: "Fernando, você não pode pensar em eleição pela oposição sem o apoio da esquerda". E eu perguntei quem ele considerava esquerda no Brasil. "Francisco Pinto e Miguel Arraes. Tendo o apoio dos dois, eu tenho o apoio da esquerda". Nas conversas com os deputados federais peemedebistas, Lyra foi articulando o apoio ao nome de Tancredo. "Chico Pinto era dos autênticos e topou o apoio. E toda semana eu dizia: "Doutor Arraes, vamos a Minas Gerais?". E ele me respondia: "Fernando, quando chegar a hora, eu digo".
A hora chegou em janeiro de 1984, quando Miguel Arraes se encontrou Fernando Lyra em seu gabinete, em Brasília. "Para mim, foi um dos dias mais felizes da época da transição. Fui com doutor Arraes a Belo Horizonte, marcamos um encontro lá em casa, eu, ele e doutor Tancredo. A partir daí, ele [Tancredo] se convenceu de que poderia ganhar as eleições no colégio eleitoral", relembrou Lyra, na entrevista à TV Câmara.
A candidatura de Tancredo foi vitoriosa e Fernando Lyra ganhou importância política no novo governo. Na formação do ministério de Tancredo, que ficou conhecido como Nova República, Lyra foi escolhido pelo novo presidente do Brasil para ocupar a pasta da Justiça. Com a doença e a morte de Tancredo, assumiu o vice, José Sarneyx, que manteve Lyra no Ministério da Justiça por pouco mais de um ano. Como ministro, ele acabou com a censura no Brasil imposta pelo regime militar. Na primeira eleição direta para presidente da República, em 1989, vencida por Fernando Collor, Lyra foi vice na chapa de Leonel Brizola, quando já estava filiado ao PDT.
Na década de 1990, voltou a ser deputado federal. Entre outras funções desempenhadas na Câmara, foi o corregedor na época da CPI do Orçamento (1993/94), quando já tinha se filiado ao PSB. "É muito difícil para um deputado levar um companheiro à cassação, mas não tinha como deixar de levá-los", lembrou Lyra. Essa comissão parlamentar de inquérito investigou um grupo de deputados federais que tinha montado um esquema de aprovação de emendas para desviar dinheiro público. Os envolvidos recebiam comissões para favorecer empreiteiras e desviavam recursos para entidades fantasmas. Seis parlamentares foram cassados. O chefe do grupo, João Alves (PRP-BA), justificou seu patrimônio à CPI dizendo que tinha acertado 56 vezes na loteria.
Foi também presidente da Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), ligada ao Ministério da Educação, durante o governo Lula. Em 2006, trabalhou na campanha de Eduardo Campos (PSB) para o governo de Pernambuco - seu irmão, João Lyra Neto, é o vice desde a primeira gestão de Campos. Em 2009, lançou o livro "Daquilo que eu sei - Tancredo e a transição democrática", uma publicação que fala sobre sua vida pessoal, os bastidores da campanha de Tancredo à presidência da República, o fim da ditadura militar e o começo da nova democracia no Brasil.
Ultimamente, Fernando Lyra estava fora da vida pública e vivia ao lado da família, na praia de Piedade, em Jaboatão dos Guararapes, na Região Metropolitana do Recife. Ele deixou esposa e três filhas.