Pouco mais de sete meses depois de assumir o cargo de diretor de futebol do Flamengo, Zinho despede-se do clube. Nesta quinta-feira, dia da posse do novo presidente rubro-negro, Eduardo Bandeira de Mello, o tetracampeão se reuniu com o vice de futebol, Wallim Vasconcellos, e avisou que não aceita continuar. O contrato em vigor termina no próximo dia 31. A nova diretoria ofereceu ao ex-jogador um novo vínculo, mas com função e remuneração diferentes. O corte no salário de R$ 100 mil seria, no mínimo, de 50%. O diretor viraria gerente, subordinado ao executivo contratado, Paulo Pelaipe, e sem poder de decisão nas negociações. Zinho vai conceder uma entrevista coletiva às 10h desta sexta-feira, no Ninho do Urubu, para explicar os motivos de sua decisão.
- Analisei e foi a decisão que tomei (sair). Amanhã (sexta) falo com detalhes, mas saio pela porta da frente. Foram sete meses em que mostrei a minha cara ? disse o ex-jogador.
De 11 de maio para cá, Zinho experimentou quase tudo no clube. Sobraram problemas, faltou tempo para relaxar. O distanciamento da família incomodou, a vida tranquila de comentarista de TV ficou para trás, e o desgaste foi inevitável.
No período em que esteve no cargo, Zinho teve de administrar crises sérias, de extrema repercussão e que geraram enorme desgaste. O embate e a saída conturbada de Ronaldinho Gaúcho, o processo de fritura e queda de Joel Santana, o fracasso nas negociações com Diego e Juan, a ausência da contratação de um camisa 10, o caso Riquelme e a tentativa de recuperar Adriano foram motivos de turbulência na gestão do comandante do futebol rubro-negro.
A política fervilhante do clube também respingou no futebol, já que algumas crises internas envolveram o vice-presidente de finanças, Michel Levy, e o vice de futebol, Paulo Cesar Coutinho, afastado da pasta durante a temporada. Zinho tentou defender o trabalho do dirigente, mas a pressão pela saída de Coutinho foi maior. O vazamento de informações também incomodou. Dentro de campo, briga contra o rebaixamento no Brasileirão.
Além da questão financeira e da perda de força no clube, Zinho acredita que, mesmo com a chegada de Pelaipe, teria volume de trabalho parecido ao da função que exerceu na atual temporada. E, depois dos sete meses em que trabalhou grande parte do tempo sozinho, sem vice de futebol nem gerente, ele apostava numa valorização. Reduzir o salário, para ele, seria justamente o contrário.
Caso Ronaldinho Gaúcho
Logo que assumiu sua função, Zinho já teve um grande problema para resolver, que atendia pelo nome de Ronaldinho Gaúcho. Responsável direto pela queda de Vanderlei Luxemburgo, o ex-camisa 10 tinha uma rotina de problemas disciplinares. De início, o novo diretor conversou com o jogador e chegou a encobrir indisciplinas e defendê-lo quando apareceu sem condições ideais para treinar. Aos poucos, porém, a situação ficou insustentável. Na viagem do time para um amistoso em Teresina, Ronaldinho não apareceu e nem ligou para Zinho. Na ocasião, Paulo Cesar Coutinho, vice de futebol, foi flagrado por torcedores dizendo que o jogador estava afastado. O diretor foi acordado no hotel da delegação no Piauí já tendo que desarmar mais uma bomba. Horas depois, porém, veio à tona que o ex-camisa 10 entrara na Justiça contra o clube. Zinho, então, falou abertamente sobre as indisciplinas do jogador e afirmou:
- Acabou a festa, acabou a bagunça.
Fritura e queda de Joel Santana
Desde o começo da fritura interna de Joel, Zinho foi obrigado a conviver com notícias de possíveis substitutos e foi o principal responsável por manter o treinador no cargo. O diretor teve de ir à imprensa para esclarecer que não tinha procurado Dunga, nem Jorge Sampaoli, e pediu paz para o técnico. Mas o próprio dirigente já não estava satisfeito com o trabalho de Joel. Zinho se desgastou ao servir de escudo para o ex-treinador. Depois da derrota por 1 a 0 para o Cruzeiro, a demissão, enfim, foi consumada. E logo em seguida Zinho já teve de esclarecer que não fizera nenhum contato com Dorival Júnior.
Juan, Diego e o caso Riquelme
Outros desgastes para o dirigente. Depois de iniciar a negociação com Juan em maio, o zagueiro preferiu o acerto com o Internacional. Zinho deixou clara sua insatisfação. Mas a busca sem sucesso por um camisa 10 foi mais penosa. O diretor mantinha contato com Diego em sigilo, quando o vice de finanças Michel Levy comentou abertamente sobre a vontade do clube de contar com o jogador. O Flamengo deu sua cartada para tentar a contratação junto ao Wolfsburg-ALE, mas o negócio não foi adiante.
Quase ao mesmo tempo, Zinho mantinha contatos com o plano B, que era Riquelme, mas em suas declarações evitava admitir a negociação. Foi noticiado, então, que Levy teria uma conversa com representantes do jogador - o que não aconteceu. Mas o episódio deixou Zinho extremamente irritado, e ele chegou a cogitar um pedido de demissão. O clube intensificou as negociações com o argentino às vésperas do fechamento da janela de transferências internacionais. Mas, depois da derrota por 3 a 0 para o Corinthians, o camisa 10 do Boca Juniors recusou o convite, segundo Zinho, com a alegação de que teria ficado assustado com a atuação do time e pressão.
- Houve uma polêmica com o vice de finanças, porque eu estava negociando com o jogador, mas, como no Flamengo é impossível negociar sem que as coisas vazem... A primeira opção era o Diego, mas haveria novas possibilidades. Eu não falava da minha boca, parecia que não queria o Riquelme. Belíssimo jogador, nome maravilhoso, mas infelizmente não virá - justificou Zinho, ao ser questionado sobre o fato de ter negado as conversas com Riquelme.
Aposta e frustração com Adriano
Adriano chegou ao Flamengo para iniciar a terceira passagem pelo clube em 22 de agosto. Fora de forma, visivelmente acima do peso e ainda em recuperação da segunda cirurgia no tendão de Aquiles do pé esquerdo, adotou um discurso otimista em sua apresentação na sala de imprensa do Ninho do Urubu. Esperava voltar a ser o Imperador e previa a reestreia com a camisa 10 rubro-negra em um mês. Nada feito. Setenta e cinco dias depois, terminou a sua terceira passagem pelo clube ainda como ídolo, mas pela porta dos fundos. Em má forma, saiu sem ter sequer ficado no banco de reservas em uma partida oficial.
O contrato de produtividade terminou no último dia 22, algo que o Flamengo já poderia ter feito antes. Conforme previsto no acordo, três advertências por indisciplina dariam ao clube o direito de demitir o atacante. Adriano ultrapassou o limite, foi multado, teve o contrato de imagem suspenso, mas contou com a paciência de Zinho, que insistiu na tentativa de recuperação. Não conseguiu. As sucessivas faltas demoliram a confiança e a persistência do dirigente em ver Adriano novamente em campo, como um atleta de alto nível. Com o caso no limite e a falta de compromisso do jogador, foi preciso recuar.
- Eu não vou desistir do Adriano, mas de recuperar o ser humano, é uma missão minha, particular. Sem os holofotes, sem essa vida que ele leva que não condiz com a de um atleta profissional, talvez eu possa ter sucesso para recuperar esse ser humano. Mas, profissionalmente, chegou no limite. O Adriano realmente não tem o meu apoio como profissional. O ser humano tem escolhas. Ele está escolhendo errado. A parte profissional não progride porque ele erra em outras coisas: as companhias, o encontro com Deus. Hoje é muito difícil (a volta de Adriano em 2013) ? disse Zinho, no início de novembro.