Já era madrugada de 9 de junho de 2011 e o Vasco ainda comemorava o título inédito da Copa do Brasil. No gramado e no vestiário do Estádio Couto Pereira, após a partida contra o Coritiba, Bernardo abraçou alguns dirigentes do clube e pediu:
- Comprem meu passe! Comprem meu passe!
Xodó da torcida pelas atuações decisivas entrando no segundo tempo das partidas, Bernardo não demorou a criar indentificação com o clube e nunca escondeu seu desejo de ficar por muito tempo em São Januário. No entanto, a relação pode estar perto do fim. Na última quarta-feira o jogador entrou com uma ação contra o clube na 17ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro alegando dois meses de salários atrasados, além do não-recolhimento do Fundo de Garantia (FGTS) e da falta no pagamento de luvas pela assinatura de um novo contrato. Segundo relatos de pessoas próximas, o jogador teria tomado a atitude movido pela insatisfação com a inadimplência cruz-maltina.
E por ter se cansado das várias promessas da diretoria de que a situação seria resolvida. Mas também foi resultado de uma pressão do ponto de vista pessoal à qual um garoto de 21 anos vem tendo dificuldades em suportar e com a qual mostra dificuldades em lidar.
No fim do ano passado, o Vasco se movimentou para pagar R$ 3,5 milhões ao Cruzeiro por metade dos direitos econômicos de Bernardo, no maior investimento do clube na temporada até o momento. O contrato de empréstimo do jogador terminava em 31 de dezembro de 2011 e o Cruzeiro estabeleceu o dia anterior como prazo para que o clube cruz-maltino depositasse a quantia e pudesse firmar vínculo de quatro anos de duração. A cúpula da diretoria vascaína passou todo o dia 30 reunida tentanto levantar os recursos para confirmar a contratação, e o depósito foi efetuado às 15h50m. Dez minutos antes do encerramento do expediente bancário.
O episódio do pedido feito em Curitiba, em junho, foi lembrado a Bernardo quando o jogador esteve reunido com dirigentes em São Januário após a partida contra o Volta Redonda, na noite da última quarta-feira. Segundo relatos de pessoas ligadas à diretoria, o jogador apenas baixou a cabeça e continuou mostrando uma fisionomia fechada. Os responsáveis pelo comando do Vasco mostram-se decepcionados por verem aquele que era uma grande esperança e xodó da torcida tomar uma atitude tão inesperada.
Em São Januário, chegam aos dirigentes informações de que o acerto com um clube carioca estaria por trás da ação movida por Bernardo. Léo Rabello, empresário do meia, tem uma relação forte com o Flamengo e a presidente Patrícia Amorim. E Rodrigo Caetano, que foi para o Fluminense, tem um carinho especial pelo jogador. Mas independentemente do motivo, a questão financeira vem mexendo com a cabeça do jogador principalmente desde o início de 2012.
Sem pagamento do Vasco, dificuldade para lidar com finanças
Bernardo recentemente comprou uma casa para os pais em Sorocaba (SP). Aos 21 anos e ainda sem muitas reservas econômicas, contava principalmente com o dinheiro das luvas relativas ao novo contrato com o Vasco para quitar o investimento e manter as contas em dia. De acordo com pessoas próximas, o atraso do clube no pagamento mexeu com o lado emocional do jogador, que, além de já ser pai de três filhos, está em processo de separação com a esposa, que está gravida.
O Fundo de Garantia seria uma maneira de compor o investimento da casa dos pais, mas o fato de o Vasco não ter feito qualquer depósito de FGTS durante o tempo em que Bernardo esteve em São Januário mexeu ainda mais com o jogador, que decidiu tomar a atitude drástica. Mas a amigos, o camisa 31 afirmou diversas vezes que não tem a intenção de deixar o clube. Quer apenas receber o que tem direito. O objetivo seria apenas formalizar sua insatisfação com a inadimplência do Vasco e exercer um tipo de pressão para que houvesse um acordo.
Questionado pelos dirigentes após o jogo contra o Volta Redonda, Bernardo afirmou que seus pais entraram com a ação contra o Vasco. Na manhã da última quinta-feira, integrantes do departamento jurídico do clube foram até o Fórum do Rio de Janeiro e tiveram mais uma decepção. Estava no documento a assinatura do próprio Bernardo autorizando o processo.
Desde a pré-temporada era possível observar a insatisfação de Bernardo com o fato de o Vasco não cumprir seus compromissos, numa reclamação que, internamente, era de todo o grupo. Somou-se a isso a permanência no banco de reservas quando o jovem alimentava a esperança de finalmente se firmar entre os titulares em 2012. Apesar disso, o técnico Cristóvão Borges garantiu não ter detectado qualquer mudança de comportamento no jogador.
- Nós procuramos ficar perto dos jovens, não apenas ele, para ajudar em tudo o que eles necessitam. Temos garotos talentosos no grupo, e o Bernardo é um deles. Mas não senti nada de anormal no jogador - disse o treinador.
No discurso, o Vasco diz esperar uma solução pacífica e planeja a reintegração de Bernardo ao elenco. No entanto, o clima ficou pesado para que o jogador volte a vestir a camisa cruz-maltina. Após o jogo contra o Volta Redonda, o meia precisou de ajuda dos seguranças para sair de São Januário. Um grupo de torcedores o insultava na porta do vestiário. Agora, o clube tenta cumprir suas obrigações de modo a evitar que o jogador deixe São Januário com uma rescisão unilateral e fazer o clube perder os R$ 3,5 milhões investidos no meia. O dinheiro, na época, foi emprestado por torcedores ilustres do clube. O objetivo do Vasco é, ao menos, negociar o meia sendo recompensado financeiramente. Mas o prejuízo é inevitável. Para os dois lados.