As Olimpíadas de Londres-2012 mudaram a vida de Sarah Menezes. Aos 22 anos, a atleta de Teresina conquistou a primeira medalha de ouro da história do judô feminino brasileiro nos Jogos. Saiu do tatame para virar personalidade – foi recepcionada por uma multidão no aeroporto, desfilou em carro aberto, enfileirou participações em programas de TV e criou uma agenda de palestras e comerciais, por exemplo.
Às vésperas da Rio-2016, essa popularidade virou um problema. Depois de um ciclo irregular, a piauiense foi cobrada pela CBJ (Confederação Brasileira de Judô) e se comprometeu a reduzir compromissos fora do esporte.A conversa aconteceu antes dos Jogos Pan-Americanos de Toronto-2015 – Sarah não foi convocada para a competição.
A judoca e a CBJ criaram um plano especial para que ela chegue bem às Olimpíadas do próximo ano, e isso incluiu uma elaboração conjunta de agenda. "Ela tem lastro e total possibilidade, mas é uma construção. A gente está trabalhando para ela chegar bem na Olimpíada, mas hoje ela não teria condição de ser campeã olímpica", analisou Rosicléia Campos, técnica da seleção brasileira de judô feminino.
"Tem de ser mais regrada, voltar para a rotina. Ela fazia muita palestra e saía muito, e por isso acabava prejudicando algumas sessões de treinamento. Daqui para lá não pode perder mais treino. É exatamente isso. Ela é muito solicitada, e para qualquer lugar que vai ela perde treinos", completou a treinadora.
A atleta admitiu que vai mudar a programação até 2016 e também reconheceu que a irregularidade tem sido um problema: "Não acho que isso tenha influenciado nos meus resultados, até porque tive um 2013 muito bom, mas agora é reta final de preparação. Meu foco está totalmente voltado para conseguir classificação para os Jogos Olímpicos e para ter um grande resultado em casa. Estou trabalhando para diminuir os altos e baixos e ter um desempenho mais regular nas competições".
Sarah já tinha um histórico vencedor em categorias de base (foi bicampeã mundial júnior em 2008 e 2009) e havia participado dos Jogos Olímpicos em Pequim-2008 (perdeu na primeira luta). No entanto, a experiência não reduziu a proporção do que aconteceu em Londres-2012. O ouro conquistado por ela foi apenas o segundo de uma mulher brasileira em modalidades individuais – antes, só Maurren Maggi havia conhecido a sensação de estar no topo do pódio.
"É natural que depois da medalha exista uma queda. É natural", disse Ney Wilson, gestor de alto rendimento da CBJ. "Ela deixou de investir no primeiro ano, mas o atleta que ganha a medalha é muito assediado. Acontecem muitas coisas na vida dele. Há uma transformação, inclusive financeira e economicamente, e isso mexe muito com ele".
"O reconhecimento foi brilhante. Eu tive a exata noção quando no dia seguinte coloquei meu nome no Google e vi o tamanho do meu feito e a importância para mim e para o meu esporte", contou Sarah.
"Depois da minha vitória, quando cheguei no Brasil, tive uma agenda muito agitada. Passei por muitas TVs, dei muitas entrevistas, foram feitas muitas matérias", adicionou. O relaxamento pós-conquista proporcionou a Sarah um desempenho errático nos primeiros anos do ciclo olímpico. Ela chegou a vencer o Grand Slam de Tuymen (Rússia) em julho de 2014, mas não amealhou bons resultados em sequência. "Isso nos ligou um alerta", admitiu Ney Wilson.
Para encontrar estabilidade, a judoca também passará a treinar mais no Rio de Janeiro. "Os atletas que trabalhavam com ela no Piauí cresceram, e aí o ritmo da Sarah caiu bastante. Ela vem para cá para diminuir essa lacuna de desempenho na parte técnica", ponderou Rosicléia. A questão hoje é tempo. Todos na CBJ sustentam que há espaço suficiente para Sarah se desenvolver e retomar o ritmo até a Rio-2016, mas a queda de rendimento criou uma necessidade de acelerar as coisas. Eliminada na primeira luta do Mundial de judô disputado neste ano, a atual campeã olímpica hoje é ameaçada por Nathalia Brígida, que foi até as semifinais do torneio. Nos Jogos Olímpicos, apenas uma delas vai representar o Brasil na categoria até 48kg.
A questão de Sarah, contudo, parece ser bem anterior a essa disputa. Pressionada por anos irregulares, a atual dona do ouro olímpico precisa vencer a própria desconfiança. "É resgatar a autoestima dela, também. Ela tem totais condições de ser campeã olímpica de novo, mas precisa ser resgatada", finalizou Rosicléia.