O começo do pesadelo
"Era o primeiro dia de treino bem leve depois de meses de treino pesado em Salt Lake City, nos EUA, em 27 de janeiro do ano passado. Acordei me sentindo bem, sem dores e orgulhosa por ter conseguido a classificação pra Olimpíada de Inverno de Sochi, na Rússia. Aos 25 anos, depois de três Olimpíadas como ginasta, tinha conseguido me reinventar e provar que também era boa no esqui aéreo ... Até vir o acidente – e o pesadelo começar."
Sem movimentos
"... Até que, do nada, bati numa árvore! Apaguei... Foi tão, mas tão rápido! Só fui acordar dentro do helicóptero, já recebendo os primeiros socorros. Vomitava muito. Acabei engolindo e aspirando vômito, o que mais tarde descobri ter agravado meus problemas respiratórios. Apesar do susto e do mal-estar extremo, ali já percebi que tinha alguma coisa errada comigo: não conseguia mexer o corpo. Meu quadro era desolador. Quebrei o pescoço e lesionei a terceira vértebra (C3) da coluna cervical que, além de quebrar, sofreu deslocamento e comprimiu as debaixo. Fora a lesão medular completa".
Minivitórias
"E assim a vida seguiu: foram seis meses de hospital, entre crises de choro e de revolta. Me perguntava por que Deus não tinha me deixado o movimento de pelo menos um dedinho... Resolvi me focar nas minivitórias. A primeira foi respirar sem aparelhos. Como o impacto na medula tinha feito meu diafragma parar de funcionar, tive que fortalecê-lo. Por isso, eu cantava Ana Carolina o dia inteiro no hospital... Tatuei no meu punho um cadeirante se levantando – símbolo do Miami Project e que sou eu! Tenho certeza de que vou voltar a andar."
Homens e mulheres
"As pessoas acham que o que mais mudou na minha vida foi o sexo. Gente, nem de longe essa é a questão! Sou bissexual e todo mundo sempre soube disso em casa – mas as pessoas em geral só souberam agora, porque acabei deixando escapar numa entrevista. Nunca achei importante falar publicamente disso. O que tem demais eu já ter namorado homens e mulheres? Como disse, quando sofri o acidente estava começando um relacionamento com uma mulher, só que o namoro acabou já no início da recuperação. Preciso focar em melhorar".
Rótulos
"Hoje estou solteira. Mas o sexo é normal: posso beijar, transar e amar da mesma forma. Acontece que esse assunto me chateia. Desde que sofri o acidente, ganhei muitos rótulos. Primeiro, era a atleta acidentada. Depois, a atleta paraplégica. Agora, sou a atleta gay. Eu sou “só” a Lais Souza! Por que minha opção sexual tem que ser manchete?! Quebrei o pescoço, poxa! A gente precisa de manchetes pra isso, pra que cada vez existam mais pesquisas que me tirem da porcaria dessa cadeira!"