Isabel Clark, 32 anos, nasceu no Rio de Janeiro. Foi criada no calor de rachar catedral dos verões do Humaitá, pedaço classudo da zona sul carioca espremido entre o ecletismo de Botafogo, as palmeiras nobres do Jardim Botânico e a beleza quase opressora da Lagoa Rodrigo de Freitas. Tem a pele morena e o sorriso farto dos representantes dos trópicos. Mas, apesar de todos esses ícones tropicais, virou rainha da neve, e não do sol. Atleta de snowboard, ela tem no currículo os melhores resultados, índices e marcas conquistados por um atleta brasileiro nos esportes de inverno em todos os tempos.
Para quem começa agora a dar as primeiras escorregadas no assunto, snowboard é aquela modalidade exuberante do desporto de neve que, para existir, precisa unir uma encosta coberta de neve, uma prancha de apenas 1,60 metro de comprimento e, por último, mas não menos importante, um sujeito corajoso o suficiente para despencar do topo da primeira com os pés travados na segunda. Algumas provas são disputadas em pistas halfpipe (côncavas, em formato meio cilindro) posicionadas em declive. Outras, em rampas artificiais para saltos e manobras.
Oficialmente é esporte radical - mas muita gente acha coisa de maluco mesmo. A velocidade nunca é baixa, as manobras sempre são intensas e qualquer deslize - fora dos indispensáveis ao negócio, evidentemente - gera capotagens espetaculares montanha abaixo.
O vôlei e o hipismo eram os esportes favoritos antes
Isabel era boa jogadora de vôlei e elogiada praticante de hipismo na adolescência. Pensou seriamente em seguir um caminho ou outro. Mas, em 1994, numa viagem aos Estados Unidos com os pais para visitar o irmão mais velho, ela conheceu, aos 17 anos, os dois elementos que mudariam sua vida: uma montanha coberta de neve e uma prancha de snowboard.
A experiência, lembra ela em entrevista ao R7, teve um toque claro de ironia para uma menina acostumada a ver os termômetros ultrapassarem sem qualquer cerimônia a marca dos 40 graus nas primaveras e verões de sua cidade natal.
- Meu irmão morava, trabalhava e praticava esqui numa estação chamada Mamuth Montain, no estado da Califórnia. Quando vi pela primeira vez alguém deslizando com aquela prancha na montanha, disse para mim mesma: vou fazer isso. Nos três primeiros dias, simplesmente não deixei meu irmão sair da estação de esqui. A gente acordava, treinava, dormia, acordava, treinava, dormia... O que levei de tombo não foi brincadeira. Mas, na volta, conseguia me virar nos primeiros fundamentos.
Se levarmos em conta os parâmetros normais de evolução e de desenvolvimento técnico, fica fácil concluir que Isabel conheceu tarde o esporte de sua vida. Em compensação, se virou, como ela mesma diz, e conquistou resultados relevantes com a mesma velocidade com que riscava montanhas geladas pelas cordilheiras do mundo. Em 1995, ano seguinte ao da deslumbrada temporada de iniciante ao lado do irmão, ela já conquistava, em Valle Nevado, no Chile, o primeiro de seus 13 títulos brasileiros na modalidade.
Além disso, venceu oito campeonatos sul-americanos e participou de dois filmes sobre snowboard no Brasil: Cool and Brazilian e Cool Trip. Eleita por quatro vezes seguidas (2003 a 2006) a melhor atleta do ano em esportes de neve no país, ela voltou dos Jogos de Inverno de Turim, na Itália, em 2006, com um nono lugar histórico, a melhor colocação de um atleta brasileiro na história da competição. Esse feito e a evolução fulminante na carreira deram-na, no mesmo ano, uma das três vagas na disputa final para a escolha da melhor atleta brasileira no Prêmio Brasil Olímpico, organizado pelo COB (Comitê Olímpico Brasileiro). Não levou o prêmio, mas foi, de longe, a mais premiada de todas por ter feito parte do trio.