Entre os maiores índices de audiência da atual novela das 21h da Globo estão duas sequências de violência explícita.
Para entender esse fenômeno que mexe com tantos noveleiros e até influencia pensamentos e comportamentos de quem consome teledramaturgia no Brasil, o blog ouviu o psicólogo Alexandre Bez, especialista em Relacionamentos pela Universidade de Miami e em Ansiedade e Síndrome do Pânico pela Universidade da Califórnia. Ele é autor, entre outros livros, de ‘Inveja – O Inimigo Oculto’ (Editora Juruá).
Assim como a gente vê na novela, a concorrência afetiva ou financeira entre pessoas da família pode gerar um comportamento destrutivo?
A questão familiar sempre pode representar um advento positivo ou negativo. O que irá determinar essa polaridade será o caráter dos membros familiares, assim como os fatores ambientais, de desenvolvimento e da criação. É muito importante fazer a diferenciação entre criação e educação. Educação se relaciona apenas ao aprendizado escolar e às boas maneiras. Criação se associa ao caráter e à manifestação da personalidade. Personalidade essa que será responsável por nossas ações. A concorrência (no meio familiar) está relacionada ao caráter intrínseco de cada um, onde quanto maior for a frustração em nosso inconsciente, maior serão as adversidades entre os entes familiares, como acontece no folhetim da Globo. São exatamente essas adversidades que irão provocar comportamentos destrutivos.
As cenas com algum grau de violência (surra, insultos, tiros) geram maior audiência. Esse tipo de representação mexe com a agressividade internalizada do telespectador?
Sim, mexe. Existe uma correlação inconsciente entre as cenas geradas pela violência doméstica ou familiar e a curiosidade que rola em nossa configuração mental, especialmente no que tange aos conflitos e à possibilidade deles se intensificarem, provocando mais ira entre os membros da família. Por isso a audiência da novela sobe: as pessoas quem ver o que vai acontecer. Essa explosão de ações, comportamentos e atitudes prende a atenção do público. É ocasionada pelo mecanismo da transferência. A curiosidade inconsciente estacionada nessa mesma instância, tecendo uma correlação entre a ficção e a vida pessoal. Há ainda, por parte do telespectador, o medo de que essas ações destrutivas vistas na novela possam ocorrer também em sua família, desestabilizando-a.
As novelas servem como uma espécie de escapismo da realidade sufocante?
Sim, possuem essa especificidade positiva, independentemente do teor dramático. Não podemos esquecer que as novelas são representações da vida real. Por isso, cenas dramáticas chocam tanto os telespectadores, como as sequências tensas entre a mãe e a filha (Maria da Paz e Josiane). Essa associação mental inconsciente é tão fidedigna que muitas pessoas, ao assistir à novela, emitem manifestações físicas congruentemente negativas, tais como taquicardia, falta de ar, gastrite etc.
Esse tipo de entretenimento pode ter uma função terapêutica por distrair o telespectador por algum tempo?
Sim, especialmente nas cenas que são antagônicas às dramáticas e que se correlacionam com os mesmos problemas que essas pessoas possam viver na vida pessoal. O elemento da distração se encerra quando há uma percepção consciente informando ao cérebro de que o tempo de entretenimento visual cinematográfico está sendo trocado pelas situações associativas conflitantes e desesperadoras.
Dizem que a TV tem um lado nefasto por exibir ‘maus exemplos’. As pessoas são tão influenciáveis assim?
Lado nefasto ocorre em qualquer lugar, como também em qualquer mídia. A ação de uma pessoa, ao se importar com o conteúdo visual assistido, representa muito mais as suas questões internas do que propriamente o teor da cena. No entanto, as sequências fortes das novelas podem ser facilmente capturadas por pessoas de estrutura psicológica fraca e altamente influenciáveis