O comunicador e estudante de direito Antônio Alves, 47 anos, nasceu, trabalha e mora na pequena cidade de Tanque do Piauí, distante cerca de 210 km ao Sul de Teresina. Ele conhece praticamente todos os 2.773 moradores do local – número da última estimada populacional divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), e tem ajudado o serviço de saúde da cidade nas orientações de prevenção e combate à pandemia do novo Coronavírus. Resultado: o município tem menos de 50 casos confirmados da doença e nenhuma morte até então.
“Temos tido muitos cuidados para não disseminar ainda mais a doença, adotando todass medidas possíveis, como uso de máscaras, distanciamento social e evitando aglomerações”, disse Toinho Alves, como é mais conhecido na cidade, destacando ainda que usa bem sua formação de comunicador para alertar a população. “Tenho um site na internet que uso também para orientações. Conheço bem todos da cidade e me sentiria muito mal se um deles viesse a falecer por esse vírus”, pontuou.
Só que nesse fim de semana, o Piauí ultrapassou à triste marca de 3 mil mortos pela Covid-19. Isso em menos de um ano do início da pandemia. O número é tão assustador que ele é superior a toda a população de Tanque do Piauí. Na verdade não apenas maior que ela, mas de outras 13 cidades piauienses que tem menos de 3 mil moradores. É como se todos esses moradores de uma desses 14 municípios do Estado fossem completamente dizimados, sumissem do mapa.
O farmacêutico Raimundo Nonato Diniz, de 56 anos, foi um dos que entraram para essa estatística macabra. Dono de uma drogaria na zona sudeste da capital, Diniz contraiu a doença no final de 2020 e faleceu poucos dias depois. Seu caso ganhou bastante notoriedade porque antes de morrer ele deixou um áudio para a filha, de quase três minutos, onde, com muita dificuldade na fala, comunicava que estava sendo entubado e que não deveria sobreviver.
“Minha filha, estou sendo entubado e a esperança é muito pequena, entendeu? Então eu quero pedir pra você que tome de conta dos meninos, cuide direitinho deles, cuide das coisas direito, o que for preciso, eu acho que a situação aqui complicou...Lutei e estou lutando até a última hora, mas cheguei a um ponto que eu acho que é o final “, disse no áudio. De acordo com a família, Diniz era saudável e não tinha nenhuma comorbidade.
E é justamente isso que assusta, quando o Piauí ultrapassa essa terrível marca de 3 mil mortos por causa do coronavírus – chegando à proporção de quase um a cada mil piauienses morreu da doença, o registro de óbitos de pessoas, que mesmo com comorbidades ou do grupo de risco, acreditavam viver ainda mais alguns anos. “Na virada de 2019 para 2020, meu pai estava muito feliz e fazendo planos diversos para o futuro. Mas, em junho veio a doença e tirou tudo isso”, pontuou o comerciante Pedro de Almeida, 34 anos, lembrando que o pai tinha 67 anos e era hipertenso. Ele também virou estatística.
Para os especialistas o crescimento do número de mortes por Covid-19, não apenas no Piauí, mas no mundo como um todo, está diretamente relacionado ao comportamento social das pessoas, principalmente ao não cumprimento das normas de contenção para a transmissibilidade da doença como, por exemplo, a falta do uso de máscara; a não higienização das mãos e, o mais preocupante, a continuidade de aglomerações. Isso tudo não aplicado provoca um aumento no número de caso, que por sua vez uma alta nas internações resultando, no final, em um crescimento nos óbitos. É geométrico.
“Diferente das mortes por causas externas, que são acidentes, por exemplo, a Covid é uma doença nova, de um vírus transmissível, que não vai sair de nosso meio por um bom tempo e que tem uma mortalidade grande refletida diretamente no comportamento das pessoas. Assim como a morte por infarto e AVC (Acidente Vascular Cerebral), se transmite diretamente no controle de hipertensão, diabetes e obesidade, se você naõ cuida, então morre. Então é como a Covid., se você não se previne, você adoece e você morre”, esclarece o infectologista Nayuro Ferreira.