Aumenta a cada dia o número de pessoas contaminadas com coronavírus (Covid -19) no Brasil . Até ontem, eram mais de 900 casos confirmados, de acordo com as secretarias de saúde, e o total de 11 mortos. Para diminuir o número de infecções, a quarentena, medida estabelecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), vem sendo adotada por parte da população, empresas e escolas.
Entretanto, seguir as recomendações em prol da saúde pública vai contrário à garantia de uma renda mensal e diária para aqueles que temem a demissão e para os 38 milhões de brasileiros que não possuem vínculo empregatício, os trabalhadores informais.
Utilizando uma máscara cirúrgica, Adeilson Oliveira, 19 anos, continua com a mesma programação do serviço como ambulante. Em uma bicicleta ele carrega dois compartimentos com salgados, que costumavam voltar vazios para casa. “A cidade está deserta. Está sobrando 8 ou 9 lanches e antes não sobrava”, disse o jovem.
A preocupação de Adeilson só aumenta com o passar dos dias. Para se proteger, ele afirma que passa constantemente por clínicas atrás da clientela e aproveita para passar um pouco de álcool em gel nas mãos.
No ramo dos motoristas por aplicativo, a situação não é das melhores. Charles Rodrigues da Silva, exerce unicamente essa função há três anos. Desde as primeiras notícias sobre a doença, realiza as corridas com o vidro abaixado, evita o aeroporto, rodoviárias e locais lotados.
“Senti o impacto da diminuição de 70% no número de corridas. As pessoas não estão saindo de casa”, relata.
Com relação a quantia em dinheiro, o colega de trabalho, Alexandre Soares Aguiar, comenta: “A maioria trabalha por meta, minha meta era de R$ 200,00 ou R$ 220,00 por dia. Ontem tirei R$ 80,00”, disse o trabalhador que ainda precisa pagar a locação do carro.
Fernando Galvão, economista, explica que a tendência, diante do desafiador cenário de paralisação para conter a pandemia, é que o desempenho nas vendas e prestação de serviços caia mês a mês. “O coronavírus afeta as expectativas da sociedade. Há recomendações que as pessoas fiquem mais reclusas, existem atividades produtivas que estão sendo paralisadas no setor público e no setor privado e isso reduz o fluxo de pessoas e também vai reduzir o dinheiro circulando na economia”, informou.
Essa conclusão atinge em cheio os trabalhadores autônomos e informais que já registram quedas nas suas receitas e que não possuem nenhum tipo de cobertura formal. Na quarta-feira, 18, o governo federal anunciou que, mediante decreto do estado de calamidade pública, iria liberar 15 bilhões de reais para trabalhadores informais afetados pela crise econômica gerada pelo novo coronavírus.
De acordo com Paulo Guedes, ministro da Economia, seria cerca de R$ 200 durante três meses. Ainda de acordo com o ministro, que considera que o valor equivale a duas cestas básicas, o benefício será liberado para pessoas que estão inscritas no CadÚnico (Cadastro Único para Programas Sociais), que visa identificar famílias de baixa renda e será pago pela Caixa Econômica Federal ou pelo INSS.
“Mas será que esse valor vai dar conta dessas despesas ordinárias que todo mundo tem, comprar alimentos e estimular o consumo neste período de uma possível recessão econômica?”, questiona o economista.
Para Galvão, “jogar dinheiro de helicóptero” no volume de R$ 200,00 não é uma certeza de resultados positivos na vida das pessoas.
“A medida aos trabalhadores informais é paliativa.O que vai ser determinante para o Brasil enfrentar esse momento é, de fato, uma rede global de colaboração em saúde pública para controlar a situação do coronavírus. Caso contrário, se não for tratado o controle dessa circulação, todos os recursos financeiros utilizados para minimizar o impacto serão queimados porque as pessoas continuarão evitando a circulação e os mercados de consumo estarão deprimidos”, falou.
Para Fernando, a economia não vai conseguir reagir dentro de um prazo razoável, pois segundo estimativas, a circulação do vírus no Brasil deve se intensificar nos próximos três meses.
“Mas não basta a questão de cessar a circulação do vírus, nós ainda temos um tempo de recolher os cacos deixados pelo coronavírus, e se a gente for contabilizar isso, praticamente o ano de 2020 está condenando ao marasmo”, disse.
Por que a doença desestrutura a economia?
Um momento de instabilidade. Tanto para a saúde pública como para a economia. Ruas vazias por medida de contenção para o coronavírus têm despencado os lucros do comércio. Trabalhadores doentes em casa ou por medida de profilaxia dificultam a produtividade do mercado. O que podemos esperar deste período de instabilidade? Para os economistas o coronavírus está desestruturando a economia.
Diferentemente da crise de 2008, que surgiu nos Estados Unidos dentro do mercado financeiro, resultante de uma especulação financeira que causou uma retração global, a crise provocada pelo coronavírus transborda da saúde pública para o lado produtivo da economia, contaminando também os mercados financeiros.
É o que explica o economista Fernando Galvão. “Os impactos econômicos são grandes, porque é uma doença que espalha rapidamente e deixa as pessoas doentes, que ficam fora do ambiente de trabalho. Para países de população idosa também tem a questão da mortalidade. Afeta a economia europeia, que responde a 22% do PIB mundial. Afeta o turismo, que é 15% do PIB mundial. Além da China, a segunda maior economia mundial”, explica.
O momento atual é muito instável. “O mercado fica volátil. Os riscos ampliaram. Em verdade, o risco pode ser até previsto pela probabilidade. Agora existem incertezas, onde apenas o curto e curtíssimo prazo são cabíveis. Médio e longo não. O ideal é adotar a estratégia mais defensiva para evitar possíveis prejuízos. Ou então assumir prejuízos que machuquem, mas que não venham a lhe quebrar financeiramente”, recomenda Galvão.
Efeito manada: investidores iniciantes devem esperar respostas do mercado
Ondas do mercado podem afogar pequenos investidores. “Neste exato instante está acontecendo o efeito manada. Você tem várias pessoas operando no mercado com grandes valores, muita informação privilegiada e uma leva de investidores pequenos que vão se comportar diante das ondas que os grandes vão influenciar. Neste contexto, o que percebemos é que está todo mundo vendendo e pouca gente comprando. Os ativos financeiros estão despencando, o índice Bovespa também. É um momento muito ruim”, analisa.
Medidas a longo prazo devem ser pensadas para a próxima década. “Se sua filosofia de investimento for a longo prazo, não olhe para as modulações de mercado. Tenha uma meta, como recuperar valores investidos em 10 ou 15 anos. Essa é a estratégia que deve ser adotada por pequenos investidores. As oscilações funcionam para o investidor especulador, que quer ganhar tanto na alta como na baixa. No caso, o investidor iniciante não deve entrar no mercado agora, por precaução. Primeiro você para, observa, analisa, julga e depois toma uma decisão. Recomendo que as pessoas estudem como o mercado funciona neste momento e prorrogue essa tomada de decisão”, acrescenta o economista.
Investir em ativos, convencionalmente, é entrar na baixa e sair na alta. Comprar barato e vender caro, em tese. “É o natural no mercado. Perceba que a bolsa caiu de um recorde de 120 mil pontos em volume de negociação e agora gravita na casa dos 70 mil. Isso desvaloriza as ações. Isso significa que embora existam empresas saudáveis, uma alternativa seria a compra de ativas mais baratas. Mas não sabemos se esse é o grau máximo de desvalorização. O investidor iniciante deve esperar os próximos dias e meses, pois podem gerar grandes perdas”, finaliza.