No primeiro semestre deste ano, o Ceará contabilizou 3.868 denúncias de violência contra crianças e adolescentes, resultando em mais de 23 mil violações. Este número representa um aumento de 31% em relação ao mesmo período de 2023, quando foram registradas 2.944 denúncias. A maioria dos casos ocorreu em Fortaleza e na Região Metropolitana, mas 150 municípios cearenses também relataram incidentes, segundo dados do Disque 100, o canal do Governo Federal para denúncias de violações.
Cada denúncia pode incluir múltiplas violações contra crianças e adolescentes, como violência física, psicológica e patrimonial. Os dados, analisados pelo Disque 100, estão registrados na Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos (ONDH) do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, retratando diversos cenários preocupantes em todo o Ceará.
Um caso marcante em Fortaleza foi a tentativa de chacina no bairro Barroso, no final de junho, onde uma criança morreu e outras oito foram baleadas em um conflito entre facções rivais.
Ingrid Leite, coordenadora do núcleo de monitoramento de políticas públicas do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente (Cedeca) no Ceará, destaca o aumento da violência urbana nos últimos meses, associado a um modelo de segurança pública focado na ostensividade em áreas periféricas.
“Em 2023, a área de Segurança Pública recebeu R$ 4,6 bilhões, enquanto a Assistência Social teve apenas 16% desse valor (R$ 718 milhões). Apesar dos recursos significativos para a Segurança Pública, a violência tem se intensificado, indicando que o modelo atual não está funcionando”, afirma Ingrid. Ela sugere uma colaboração mais estreita entre estado e município para integrar políticas sociais e mudar o cenário de violência.
Rayara Custódio, coordenadora do Centro de Referência e Apoio à Vítima de Violência da Secretaria dos Direitos Humanos (Sedih) do Ceará, acredita que o aumento nas denúncias reflete o trabalho de conscientização e mobilização realizado pela secretaria e outros órgãos de defesa, com ações em escolas e nas redes sociais. No entanto, ainda há muitos casos subnotificados, principalmente em áreas mais afastadas.
“Apesar do avanço tecnológico e do acesso rápido à informação, as notícias chegam com menos força no interior. Além disso, o conhecimento mútuo entre os moradores e o desejo de proteger a vítima contribuem para a subnotificação”, explica Rayara.
Débora Nogueira, conselheira tutelar de Fortaleza, também observa uma maior conscientização sobre a violência, refletida no aumento das denúncias. Após ações em escolas, crianças e adolescentes conseguem identificar violações e buscar ajuda, permitindo ao conselho tutelar dar continuidade às denúncias.