Quantos homens que você conhece fazem terapia? Estudos indicam que a procura é discreta. Segundo relatório da Pesquisa Nacional de Saúde 2019, 69,4% dos homens passaram por consulta no ano de 2018, enquanto esse número é de 82,3% entre a mulheres —sendo que, dessas pessoas, 79,4% são brancas.
Homens ainda fogem de terapia (Foto: Shutterstock)
A crença de que indivíduos do sexo masculino são naturalmente fortes, resistentes e tampouco ficam doentes é o que está por trás da ideia de que não choram e, portanto, não precisam de ajuda para lidar com a saúde mental. No entanto, a normalização desse discurso esconde uma situação alarmante sobre a recorrência de suicídios.
No Brasil, por exemplo, a OMS (Organização Mundial da Saúde) aponta que a taxa entre os homens pode ser três vezes maior que entre as mulheres, dependendo da região, e chega a 75% dos casos.
"Minha maior conquista foi largar os ansiolíticos"
Marcelo Moraes, 42, é empresário do setor de turismo e eventos no Rio de Janeiro há mais de duas décadas, mesmo período em que se viu dependente de remédios para conter a ansiedade e a síndrome do pânico: "Quando vi que tomava e não fazia mais efeito, parei e procurei ajuda", conta.
Casado com uma médica, ele conversou sobre a dificuldade, pediu indicação de um bom profissional e escolheu a terapia cognitiva-comportamental.
"Senti preconceito no começo, com comentários sobre estar exagerando ou ser maluco por procurar terapia. Esse preconceito veio da própria família e dos amigos, mas com o tempo passou", diz.
Segundo ele, as pessoas não percebem como é importante contar com a ajuda de um profissional para entender a própria vida.
Agora, ele vê os efeitos positivos desse acompanhamento: "Minha maior conquista foi largar os ansiolíticos após três anos de terapia e poder ajudar a outras pessoas com síndrome do pânico, em palestras, a entender melhor os efeitos, os sentimentos e as técnicas para controle dessa ansiedade".
"Ouvi que homem deveria transar e beber mais"
Muitos homens passam a vida toda coibidos de manifestar seus sentimentos e, quando fazem, sofrem retaliações e são motivo de chacota. Por mais que esse cenário esteja em constante transformação, a decisão de procurar a psicoterapia ainda é algo que provoca desconforto na maioria deles, já que isso requer uma mudança estrutural.
Enquanto a mentalidade predominante na sociedade for de associar a dificuldade com a saúde mental à fraqueza, menos iniciativa eles terão.
O programador R.O.L, 32, que procurou tratamento psicológico para diminuir a ansiedade, lidou com comentários desagradáveis: "Ouvi de alguém muito próximo que eu deveria conversar mais com meus amigos, tomar cerveja para esquecer os problemas. Em outras situações, me lembro de ouvir que é coisa de mulher, que homem deveria transar e beber mais ao invés de fazer terapia".
R.O.L conta que é o único homem que faz terapia em todo seu círculo familiar e de amizades, e que isso reflete justamente a quantidade de traumas que esses indivíduos do sexo masculino têm.
"São questões que nunca foram respondidas, angústias guardadas, que certamente interferem na qualidade de vida deles e das pessoas que eles amam". Para ele, a terapia trouxe alívio desde o primeiro dia.
"É uma mistura de vergonha com alívio. Ao mesmo tempo em que você se sente aliviado por estar falando tudo aquilo que pesava toneladas na sua mente, sente vergonha por compartilhar coisas que mostram o seu pior lado, expor a sua fragilidade, pois, se fosse com amigos ou família, você poderia ser julgado como um monstro ou como um fraco", afirma.