Além de salvar vidas, a doação de sangue pode trazer benefícios à saúde de quem doa. É o que sugere um estudo realizado por pesquisadores do Instituto Francis Crick, no Reino Unido, publicado recentemente na revista Blood, da Sociedade Americana de Hematologia (ASH).
A pesquisa analisou o sangue de 217 homens que, ao longo de 40 anos, doaram sangue com frequência média de três vezes por ano, totalizando pelo menos 100 doações cada um. O grupo foi comparado a 212 voluntários que doaram raramente ou nunca haviam doado.
O foco dos cientistas foi investigar um fenômeno chamado hematopoiese clonal, processo em que uma única célula-tronco hematopoiética dá origem a um grande número de células idênticas, os chamados clones. Esse processo se torna mais comum com o envelhecimento e, em alguns casos, pode estar ligado ao desenvolvimento de leucemias.
Apesar de não haver diferença na frequência da hematopoiese clonal entre os grupos, os pesquisadores encontraram uma distinção importante: as mutações genéticas observadas nos doadores frequentes eram, em sua maioria, de natureza benigna e podem até ter efeito protetor contra certos tipos de câncer.
Como o organismo dos doadores frequentes reage?
Os pesquisadores também testaram como as células de cada grupo reagiam à presença de duas substâncias naturais do organismo: eritropoetina e interferon gama.
A eritropoetina é um hormônio que estimula a produção de novas células sanguíneas após uma perda de sangue, como acontece após uma doação. Já o interferon gama está associado a processos inflamatórios que podem favorecer o desenvolvimento de células malignas.
Nos doadores frequentes, as células estimuladas pela eritropoetina apresentaram mais clones com mutações consideradas benignas. Já no grupo de doadores esporádicos, a exposição ao interferon gama favoreceu o surgimento de clones com maior potencial maligno.
Cautela antes de tirar conclusões
Apesar dos resultados promissores, os próprios autores do estudo reforçam que ainda é cedo para afirmar que doar sangue frequentemente traz benefícios diretos à saúde do doador. A pesquisa foi realizada in vitro, ou seja, em laboratório, com células analisadas fora do corpo humano.
Segundo a hematologista Ana Carolina Vieira Lima, do Hospital Israelita Albert Einstein, os achados ainda precisam ser validados em estudos clínicos. “O comportamento das células no laboratório pode ser diferente do que acontece no organismo vivo”, ressalta.
Além disso, a médica lembra que a doação frequente sem os devidos cuidados pode trazer riscos ao doador, como anemia, lesões por punção e outros efeitos indesejados. “É fundamental que a decisão de doar sangue não seja tomada apenas por interesse pessoal em possíveis benefícios para a saúde”, alerta.
Regras para doar com segurança
A doação de sangue é um ato de solidariedade, mas envolve regras rigorosas para garantir a segurança de quem doa e de quem recebe.
Para doar, é preciso:
Ter entre 16 e 69 anos (menores de idade com autorização dos responsáveis)
Estar em boas condições de saúde
Pesar no mínimo 50 quilos
Estar bem alimentado e descansado no dia da doação
Entre os impedimentos temporários estão situações como gravidez, amamentação, sintomas de gripe, infecções recentes, tatuagens ou procedimentos como endoscopias, além de viagens a áreas endêmicas.
Já entre os impedimentos definitivos estão o diagnóstico de doenças transmissíveis pelo sangue, como HIV, hepatites B e C, doença de Chagas e o uso de drogas injetáveis.
O intervalo entre as doações também varia: homens podem doar a cada 60 dias (até quatro vezes ao ano) e mulheres a cada 90 dias (até três vezes por ano).
Por fim, a triagem é um momento essencial. O doador deve sempre fornecer informações verdadeiras, evitando colocar a si mesmo ou o receptor em risco.