Quem diria que, para combater o vírus da Aids, os cientistas fossem lançar mão do tabaco? Claro que não como fumo -- uso que faz sabidamente terrível mal à saúde e não teria meio de combater o patógeno --, mas como maneira de produzir um microbicida suficientemente agressivo para, na forma de gel, "desarmar" o HIV.
Já se sabe há algum tempo que uma substância batizada de griffithsina (mais conhecida pela sigla GRFT), produzida naturalmente por algas vermelhas, age como um eficiente inibidor contra o vírus da Aids. Em contato com o HIV, ele quase imediatamente desativa a capacidade do vírus de contaminar células humanas. Ele é, portanto, uma substância candidata a compor um gel que, aplicado na mucosa vaginal ou anal, poderia prevenir a infecção.
Ocorre que sua produção atualmente é complicadíssima e cara demais -- muito mais cara do que simplesmente adotar a medida convencional mais barata de prevenção contra o HIV, que é o uso de camisinha.
Foi aí que entrou o grupo de Kenneth Palmer, da Universidade Louisville e da companhia Intrucept Biomedicine LLC, ambas dos Estados Unidos. Eles afirmam que, usando um vírus para alterar geneticamente plantas da espécie Nicotiana Benthamiana (vegetal herbáceo originário da Austrália, rico em nicotina e outros alcalóides), elas passaram a produzir a griffithsina em copiosas quantidades -- mais de 1 grama por quilo de folhas da planta.
Os resultados, publicados com um alerta de potencial conflito de interesses (a Intrucept, de Palmer, comercializa essas plantas ricas em GRFT), estão na edição desta semana da revista científica da Academia Nacional de Ciências dos EUA, a "PNAS".
Se forem confirmados, podem ajudar a criar um gel eficaz para combater a epidemia de HIV, que segue galopante na África e aumenta sua agressividade na Ásia, além de afetar seriamente boa parte do Ocidente industrializado.
"Exigências para microbicidas eficazes anti-HIV incluem potência, atividade de espectro amplo contra as cepas mais proeminentes do vírus, seletividade para alvos celulares hospedeiros e virais, prevenção na transmissão do HIV de célula a célula, estabilidade tanto em trânsito como in vivo, biodisponibilidade em mucosas-alvo nenhuma toxicidadade para as superfícies das mucosas, e finalmente a habilidade de ser produzida em grandes quantidades com custo mínimo", afirmam os cientistas. "Vários microbicidas candidatos já foram apresentados e atingem algumas dessas exigências. Aqui, descrevemos a produção agrária de grande escala, com baixo custo, da proteína antiviral GRPF-P, que mostramos cumprir todos os critérios exigidos."
Os pesquisadores agoram planejam fazer uso da substância obtida com as plantas transgênicas para conduzir os primeiros testes clínicos em humanos.