A riqueza está aqui, se você sabe onde encontrá-la. Home theaters fabulosos estão enfiados nos porões de casas comuns dos subúrbios. Jeans encomendados a partir de US$ 1.200 podem ser identificados apenas por um pequeno logo vermelho no botão. As bicicletas italianas pintadas a mão que passam correndo pelo Vale do Silício nas manhãs de sábado se tornaram as novas Ferraris --e só os conhecedores imaginam que elas custam mais de US$ 20 mil.
Até no Facebook, marco inicial do novo rico tecnológico, a pressão de grupo dita que o consumo seja mantido em segredo. ?A mensagem aqui é: "continuem enviando produtos pelo correio", disse um executivo do Facebook que pediu para permanecer anônimo ao discutir questões internas. ?Se alguém compra um carro elegante e publica uma foto dele, é ridicularizado e criticado.?
A companhia revelou na quinta-feira que, à véspera de sua estreia no mercado de ações, convidou funcionários para uma hackatona, ou seja, maratona de programação, trazendo um novo significado para o termo milionário instantâneo. É mais provável que o evento seja regado a Red Bull do que a Dom Perignon.
Não se engane. Na era de ouro do Vale do Silício, o dinheiro está atrás do dinheiro. Salários lucrativos e opções de ações são oferecidos para recrutar ou segurar os engenheiros. As ações de companhias estabelecidas, como a Apple, aumentaram. E o próprio Facebook já procurou Wall Street para uma vasta infusão de novos fundos.
Mas aqui, num dos cantos mais ricos do país, a elite tecnológica demonstra uma atitude ambivalente e às vezes contraditória em relação à riqueza. O dinheiro, como descreveu um acadêmico do Vale, é tratado como uma régua, medindo o poder das companhias formadas pelos empreendedores, em vez de algo a ser ostentado.
?Eles o usam como uma forma de contar os pontos --do quanto você pode desestabilizar o mercado?, disse Ted Zoller, membro sênior da Fundação Ewing Marion Kauffman e estudioso de empreendedorismo. O dinheiro, é claro, ainda importa bastante para essas pessoas. ?É um jeito de fazer mais, ganhar mais dinheiro e, por fim, construir mais?, disse Zoller.
A única questão relativa a dinheiro sobre a qual a maioria dos milionários da internet fala abertamente é em quais startups eles investirão em seguida. Espere muitos outros investimentos como esses por parte de executivos do Facebook. De fato, pode ser aí que vai a maior fatia de sua nova riqueza.
Fora dos campi corporativos e da vista do público, ao que parece, há pouca ansiedade para gastar dinheiro. Amigos de funcionários do Facebook dizem que eles falaram sobre comprar casas, é claro, mas também aviões --até um avião aquático-- e obras de artistas da moda como Banksy, cujas peças são vendidas por centenas de milhares de dólares. Só não espere que eles publiquem qualquer coisa sobre suas compras em suas páginas no Facebook.
Para compreender as contradições de ganhar dinheiro no Vale do Silício, é instrutivo olhar para outra oferta pública notável: a do Google no verão de 2004. Pouco antes de abrir seu capital, um gerente sênior, segurando um taco de beisebol, deu uma palestra para uma sala cheia de funcionários do Google: qualquer um que ousasse aparecer no trabalho em carros esporte extravagantes não demoraria para ter seus vidros destruídos. A história faz parte do folclore do Vale. Mas também é sabido que os três altos executivos da companhia têm uma coleção de oito jatos privados, estacionados num hangar da Nasa.
Algumas das celebridades tecnológicas, é claro, são conhecidas por sua ostentação. Tanto Lawrence J. Ellison, diretor-executivo da Oracle, quanto Sean Parker, um antigo executivo do Facebook, têm estilos de vida luxuosos e famosos. Mas há muitos outros que se orgulham de não demonstrar sua riqueza. Jack Dorsey, co-fundador do Twitter, prefere os jeans encomendados de US$ 1.200 de um estilista chamado 3x1, com o logo sutil no botão. E Sheryl Sandberg, diretora-chefe de operações do Facebook, está construindo uma casa no exclusivo Menlo Park --a maior parte dela no subsolo, escondida da vista do público.
Mark Zuckerberg, diretor-executivo do Facebook, estabeleceu o tom na companhia com seus famosos moletons velhos de capuz que não exibem nenhuma marca famosa. Ele gastou US$ 7 milhões numa casa grande, mas sem muita extravagância, em Palo Alto, um subúrbio tão caro onde até uma casa pequena, sem muitas frivolidades, custa facilmente cerca de US$ 1,5 milhão hoje em dia.
Numa carta para possíveis acionistas quando a companhia se registrou para abrir seu capital, Zuckerberg resumiu sua filosofia corporativa da seguinte maneira: ?colocando de forma simples, nós não criamos serviços para ganhar dinheiro; nós ganhamos dinheiro para criar serviços melhores.?
Embora ele não tenha articulado isso com um memorando de trabalho e um taco de beisebol, está subentendido que Zuckerberg não acharia legal que um de seus subordinados dirigisse um Lamborghini para ir trabalhar, dizem funcionários do Facebook e amigos dele. ?É quase que uma regra não dita: gaste seu dinheiro, mas faça isso de forma privada?, disse uma pessoa que conhece socialmente Zuckerberg e outros no Facebook, mas não quis ser identificada antes da oferta.
Andrew Rachleff, um ex-investidor que se transformou em gerente de fortunas, estima que o a oferta do Facebook criará cerca de mil milionários, a maioria dos quais ganhará entre US$ 2 milhões e US$ 5 milhões. A maior parte do dinheiro que ele conseguiu até agora para sua companhia, chamada Wealthfront, vem de jovens que trabalham com tecnologia em firmas como Google, LinkedIn e Facebook, que antes de sua oferta pública permitiu que os funcionários vendessem ações em mercados secundários.
O objetivo de Rachleff é atingir o público do Vale --jovens, bons em matemática, desconfortáveis com os gerentes de fortuna profissionais-- e fazer sua fortuna aumentar. Ele já encontrou um problema: ?Todos eles odeiam a palavra "riqueza". Se há uma coisa que eu mudaria, seria o nome da minha empresa? --o nome anterior da companhia, Ka-ching, que soa como uma antiga máquina registradora, parece ter sido fruto de outra escolha ruim.
Os dois condados que formam o Vale do Silício têm uma das maiores concentrações de riqueza do país, e a fatia de famílias ricas está crescendo, de acordo com o censo. Quase 14% dos lares dos condados de Santa Clara e San Mateo ganham mais de US$ 200 mil por ano, pouco abaixo dos 16% de lares em Manhattan.
Ainda assim, uma das diversões aqui é a tentativa de muitos de se distinguirem do pequeno grupo maligno de banqueiros e outros membros do 1% mais rico de lugares como Nova York e Boston. Sapatos caros e gravatas de seda são coisa rara. Andar de bicicleta e windusurf são preferidos em vez do golfe.
Bill Gurley, um investidor de Menlo Park, conta o que aconteceu quando ele começou a trabalhar como analista de Wall Street em Manhattan, em 1993, logo depois de sair da faculdade de administração. Um colega se aproximou dele e virou sua gravata para ver a etiqueta. ?No meu primeiro dia de trabalho?, lembra-se Gurley, ?disseram para eu trocar todas as minhas gravatas por Hermes e nunca mais usar sapatos marrons.?
Ele não seguiu o conselho. Nem durou muito em Wall Strett. Agora ele é sócio da Benchmark Capital, que recentemente teve um lucro considerável com a aquisição do Instagram pelo Facebook por US$ 1 bilhão.