Ryan Lochte não tomou conhecimento. Não precisou nem olhar para o lado para ver se Michael Phelps estava por perto. Lá no cantinho, na raia 8, o campeão olímpico de Pequim-2008 parecia inofensivo enquanto seu rival disparava no centro da piscina. Nem mesmo Thiago Pereira se assustou com o então bicho-papão das provas de medley. Saiu do quinto lugar na parcial do peito, assumiu o segundo e não deixou que ninguém roubasse a sua medalha de prata. Com o tempo de 4m08s86, o brasileiro chegou atrás apenas de Lochte (4m05s18), deixando o bronze para o japonês Kosuke Hagino (4m08s94).
Phelps? Parecia não acreditar no que via no placar. Aquele número 4 ao lado do nome, cinco segundos acima de seu recorde mundial, não estava nos planos. Ainda mais para quem costuma dizer que os 400m medley funcionam como um termômetro. Se tudo sai bem nesta primeira prova, a competição costuma fluir. O sinal não foi bom. Desde Atenas-2004, ele não saía de uma disputa de mãos vazias, sem ouro. A última vez que havia perdido uma final olímpica foi nos Jogos gregos, quando terminou em terceiro nos 200m livre, sendo superado por Ian Thorpe e Pieter van den Hoogenband. Em Londres, o americano também busca um recorde. Será o maior medalhista da história dos Jogos se subir três vezes ao pódio, superando a ex-ginasta Larissa Latynina. Ele tem 16 na coleção, ela ganhou 18.
Da estreia amarga neste sábado, Phelps levará uma imagem. Lembra direitinho quando viu Thiago Pereira crescer no retrovisor.
- Eu me senti estranho nos primeiros 200m e vi Thiago crescendo. Ele estava mais bem preparado - admitiu.
Preparado e confiante. Nas duas outras participações olímpicas, havia batido na trave. Em Atenas-2004, então com 18 anos, ficou em quinto exatamente nos 400m medley. Quatro anos mais tarde, em Pequim, foi o quarto nos 200m medley. Não queria mais o quase. Foi treinar nos Estados Unidos, voltou e se juntou a Cesar Cielo no projeto PRO 16. Quero a medalha de qualquer jeito e fez o que esteve ao alcance das mãos em sua preparação para não dar margem ao "e se...". Trabalhou visando a prova dos 200m, mas não desperdiçou a chance que teve na distância que sempre o faz sair da água exausto. Nesta final não foi diferente. Chegou para falar com os repórteres só pensando em um lugar em que pudesse se sentar. Estava exausto, ainda atônito com o que tinha acabado de acontecer. Não conseguia andar direito.
- Eu me surpreendi com o tempo da prova. Eu passei bem a parte da manhã. Falei com Albertinho (o técnico Alberto Silva), descansei e fiz o máximo de recuperação. Essa medalha é mais que um sonho. Eu estive sempre brigando, mas ficava em quarto, em quinto, sempre perto, mas nunca no pódio. Muita coisa mudou nesses quatro anos no treinamento. Na parte fora d?água, comecei a ter nutricionista, tudo o que precisava em termos de estrutura. Comecei a ter acompanhamento de mais profissionais - disse Thiago.
Sereno, pisou forte no segundo degrau do pódio sem derrubar uma lágrima. Preferia distribuir sorrisos, receber o cumprimento do bicampeão mundial Ryan Lochte e dar uma mordinha na medalha que foi cobiçada por tanto tempo.