Prefeitura é acusada de crime ambiental
A construção de uma praça que custará aos cofres públicos mais de R$ 500 mil virou motivo de polêmica na cidade de São João do Piauí (400 km de Teresina). Além do grande volume de recursos que serão gastos na obra, a Prefeitura do município está sendo acusada de cometer um crime ambiental ao contribuir para a suposta morte de uma histórica árvore de figueira existente no local.
Segundo os funcionários do Instituto São João Batista, entidade educacional que fica exatamente na frente da árvore, ela começou a secar e morrer após a intensificação das obras de construção da praça e o conseqüente corte de suas raízes superficiais para a colocação de pavimento. Para os moradores da cidade não restam dúvidas de que foi a obra quem desencadeou a morte da grande figueira que fornecia sombra e amenizavam a temperatura no local.
O caso ganhou as ruas da pequena cidade piauiense e mobilizou grande parte da população. Sites e rádios locais deram forte destaque a suposta morte da árvore deixando muita gente indignada. A inesperada repercussão do caso levou a Prefeitura de São João do Piauí a convocar, às pressas, uma engenheira agrônoma de Teresina para realizar um diagnostico do estado de saúde da árvore.
Na última terça-feira a agrônoma Josélia Maira Machado Alves, de 22 anos, recém formada pela UFPI e autônoma, esteve na cidade para conhecer o caso e foi cercada por populares, professoras e repórteres que cobravam dela uma explicação para o fato. Josélia alegou não poder fazer um diagnostico sem antes realizar alguns exames de solo e das folhas e que, para isso, precisaria assinar um contrato com a Prefeitura ou com a Construtora, pois estaria ali apenas como convidada.
Questionada se a árvore poderia ter sido envenenada ela foi enfática em afirmar: ?não acredito nessa hipótese pois se fosse isso as outras árvores da praça também teriam morrido?, garantiu. Segundo ela, uma possibilidade é que a árvore, plantada num local que não é o adequado, tenha chegado ao seu ciclo final de vida ou mesmo seja vitima de uma praga natural.
No entanto, essa possibilidade é rebatida enfaticamente pela professora e também engenheira agrônoma, Noêmia Ferreira Damasceno Barroso, de 55 anos, moradora de São João do Piauí e que afirma ter a certeza de que algo estranho a natureza da árvore desencadeou essa inusitada situação. ?Até algumas semanas atrás a árvore estava bem, com sua copa verde e, de um hora para outra, aconteceu isso?, desabafou.
Para a professora Espedita Alves das Mercês, de 77 anos, presidente do Instituto São João Batista, o caso serve de exemplo para a população da cidade. Ela explica que a árvore foi plantada no dia 21 de setembro em 1958 pelos alunos da primeira turma do Colégio Frei Henrique que, na época, era coordenado pelo padre Solon Correia de Aragão, e sobreviveu até o início das obras da praça sem nenhum problema.
Desesperada para tentar salvar a árvore, a professora foi orientada a ligar para a sede do Ibama em Teresina e contar um pouco da história em busca de apoio. Porém, ao contrario do que esperava, a professora Espedita Mercês ficou abismada com a orientação do técnico do órgão ambiental. ?Não podemos fazer nada. Plante outra árvore, de preferência um Nim ? espécie exótica, original da Índia ? que cresce mais rápido?, teria dito o funcionário do Ibama da capital.
Diante desse descaso, a professora Espedita Mercês já estava articulando uma visita ao promotor da cidade quando foi surpreendida pela chegada de três secretários municipais (cultura, comunicação e agricultura) que lhe fizeram uma proposta. Dali em diante a Prefeitura de São João do Piauí usaria todos os meios para esclarecer o que de fato aconteceu com a árvore. ?De imediato, eles colocaram um agrônomo do município para tratar da figueira até que se tenha um diagnostico mais preciso do caso e vamos esperar para ver o que eles decidem?, explicou Mercês.
A origem da figueira parece ser do Oriente Médio, no entanto, é uma espécie que também ocorre na América e está presente em vários biomas do território brasileiro sendo protegida pelas leis ambientais. Por fornecerem alimentos a aves, símios, morcegos e outros animais dispersores de sementes, elas têm importância na preservação das vegetações nativas. A figueira é a primeira planta descrita na Bíblia, quando Adão se veste com suas folhas, ao notar que está nu.
Praça tem recursos do Governo Federal
Conforme a placa informativa colocada na esquina da praça de São João do Piauí, o município vai gastar através de convênio com o Governo Federal, via Ministério do Turismo, exatos R$ 509.819,13 mil para fazer a urbanização do local. A placa, no entanto, não informa quais os serviços que serão realizados nem o prazo para a conclusão da obra. É informado apenas o nome da construtora vencedora da licitação: Cecol Ltda.
Esse valor, de mais de meio milhão de reais, está sendo considerado muito alto pelos moradores da cidade, principalmente levando-se em conta que as únicas ações realizadas na área da praça foram a pavimentação, colocação de bancos de cimento e a plantação de grama nas áreas do jardim. A bela escultura de ferro existente no local já estava na área, resultado de ações do ativista cultural Cineas Santos através do projeto ?A Cara Alegre do Piauí?.
Desequilíbrio ambiental
Em meados de dezembro passado as ruas da zona urbana de São João do Piauí, principalmente nas imediações dos postes de iluminação, foram tomadas por milhares de insetos, conhecidos na região como Cascudos, o que criou um série de problemas para seus moradores. Além da queimadura típica desse inseto - que atinge principalmente as crianças -, as ruas de alguns bairros ficaram infestadas com os insetos.
Para a costureira Maria Teresa, de 45 anos, já é comum, todo ano, no começo das chuvas, esses insetos invadirem a cidade, no entanto, nunca com essa quantidade. ?Nunca tinha visto tantos insetos como agora. Nas imediações do Parque de Exposições as ruas ficaram cheias?, explicou.
Esse desequilíbrio ambiental pode ser o resultado de uma série de desmatamentos que vem ocorrendo nos últimos dois anos na periferia de São João do Piauí, principalmente com a derrubada de grandes áreas ocupadas pela árvore conhecida como algaroba (espécie exótica não protegida pela legislação brasileira), que tem sua lenha utilizada para abastecer os fornos da empresa Galvani, que explora fosfato na região de Caracol e utiliza a lenha como matriz energética.
Para o secretario de Comunicação Social da Prefeitura de São João do Piauí, Osmar Júnior, a intenção do município é esclarecer o mais breve possível o que, de fato, aconteceu com a árvore para que a população possa saber a realidade. ?Estamos decididos a esclarecer essa polêmica?, afirmou.
Por André Pessoa
As opiniões aqui contidas não expressam a opinião no Grupo Meio.