O alem?o Carl Friedrich Gauss (1777-1855), uma das mentes matem?ticas mais agudas j? nascidas, costumava observar que "a matem?tica ? a rainha das ci?ncias, e a teoria dos n?meros, a rainha da matem?tica".
Afirma??o momentosa, que suscita imediatamente a pergunta: o que conferiria posi??o t?o especial ? teoria dos n?meros? Trata-se da disciplina que busca desvendar a estrutura mais fundamental da matem?tica: os n?meros naturais. Isso s? j? bastaria para coloc?-la em lugar de destaque entre as grandes realiza?es intelectuais humanas.
Acontece, al?m disso, que os n?meros naturais revelam-se surpreendentemente evasivos. Por um lado, sua progress?o t?o simples e ordenada parece fornecer, talvez, o ?nico modelo do infinito ao alcance dos seres finitos que n?s somos. Por outro lado, no entanto, essa mesma simplicidade, que quase os coloca sob nosso completo dom?nio, esconde dificuldades abissais.
Em "A M?sica dos n?meros Primos", Marcus du Sautoy, professor da Universidade de Oxford, tenta conduzir o leitor por esse ramo profundo e elegante da matem?tica a partir de um de seus problemas mais intrigantes. Por exemplo, 7 ? primo (s? ? divis?vel por 7 e por 1). J? 15, divis?vel por 3 e 5, n?o ? primo.
Dois resultados conhecidos desde a Gr?cia Antiga conferem aos primos uma posi??o singular na matem?tica. Em primeiro lugar, todos os n?meros naturais podem ser escritos como um produto de n?meros primos. Por exemplo, 15 = 3 x 5 (3 e 5 s?o primos).
Em segundo lugar, os n?meros primos s?o inesgot?veis. Pode-se mostrar que, por mais que avancemos no universo dos n?meros, nunca encontraremos o ?ltimo n?mero primo, maior do que todos os outros, depois do qual s? existam n?meros compostos.
Blocos de constru??o
Os primos, portanto, s?o os blocos b?sicos de constru??o do mundo num?rico. S?o tamb?m infinitos e muito estranhos. Considere os primeiros primos, voc? consegue encontrar alguma ordem no aparente caos dessa seq??ncia?
Se n?o consegue, n?o se preocupe. Voc? est? bem acompanhado. Os matem?ticos v?m tentando, por mil?nios, decifrar o segredo por tr?s da distribui??o dos primos, sem jamais obter uma explica??o satisfat?ria para seu comportamento.
Trata-se de uma situa??o curiosa. A matem?tica ? a ci?ncia da ordem e dos padr?es. N?o conseguir encontrar a ordem que rege os blocos de constru??o de sua estrutura mais b?sica os n?meros naturais chega a ser embara?oso.
Muita gente pensa na matem?tica como a ci?ncia dos n?meros. Isso ? apenas parcialmente correto. A partir da considera??o de conjuntos num?ricos cada vez mais distantes da experi?ncia cotidiana, o estudo da matem?tica atingiu um surpreendente grau de abstra??o. Hoje, os "n?meros" (naturais, racionais, reais, imagin?rios...) s?o apenas a ponta do iceberg.
A busca do segredo dos primos revela bem esse aspecto. Para tentar entend?-los, os matem?ticos acabaram por submergi-los em estruturas extremamente sofisticadas, distantes da intui??o comum. Assim ? que surgiu a chamada hip?tese de Riemann: uma ousada suposi??o acerca de uma fun??o, cuja prova ? aguardada com ansiedade h? mais de um s?culo.
Formulada pelo matem?tico alem?o Bernhard Riemann (1826-1866), ela fornece at? hoje nossa melhor esperan?a de compreender o comportamento dos primos. ? justamente a hist?ria dessa luta com os primos, e em particular com a hip?tese de Riemann, que Sautoy conta em seu livro.
A obra possui tr?s aspectos distintos. Sendo um livro sobre matem?tica, o autor n?o pode se furtar a explicar certas complica?es matem?ticas ao leitor. Tarefa das mais dif?ceis. Sautoy recorre aqui a uma s?rie de imagens e analogias (quase sempre extra?das da m?sica), algumas bastante felizes, outras de efic?cia incerta, para explicar tecnicalidades da hip?tese de Riemann.
A maior parte do livro, por?m, centra-se no enredo humano da busca pelo "c?lice sagrado da matem?tica". Uma impressionante galeria de personagens desfila ? nossa frente. Matem?ticos de diferentes ?pocas