O voo 232 da United Airlines, ocorrido em 19 de julho de 1989, ficou marcado como um dos episódios mais dramáticos da aviação comercial. O voo, que se iniciaria como uma viagem curta e de rotina, com céu claro e previsões de condições ideais, transformou-se em uma verdadeira emergência, levando os membros da tripulação a serem considerados heróis pela comunidade aeronáutica. Com informações do g1.
O acidente teve suas raízes em um defeito técnico que remontava a 18 anos antes da decolagem, em 1971, quando uma liga de titânio defeituosa foi utilizada na fabricação de um disco de hélice para o motor de um McDonnell Douglas DC-10, aeronave da United Airlines. Apesar de aprimoramentos feitos pela fabricante General Electric (GE) em 1972, o componente defeituoso já estava instalado na aeronave que operaria o voo 232.
O modelo DC-10, um trijato de fuselagem larga, foi amplamente utilizado pela United Airlines, entre outras companhias, e foi um dos aviões comerciais mais bem-sucedidos entre as décadas de 1970 e 1990.
A Federal Aviation Administration (FAA) exigia a substituição do disco da hélice após 18 mil ciclos de pouso e decolagem. Contudo, na última manutenção realizada em 1988, o componente foi aprovado, embora uma fissura de 1,2 cm tenha sido detectada posteriormente, o que indicava a necessidade de uma substituição imediata.
O acidente
Na manhã de 19 de julho de 1989, o voo 232 partiu de Denver, Colorado, com destino a Chicago, e mais tarde à Filadélfia, transportando 285 passageiros, incluindo 52 crianças, além de 11 tripulantes. No comando estava o experiente piloto Alfred Haynes, com mais de 7.000 horas de voo, acompanhado pelo copiloto Bill Records e pelo engenheiro de voo Dudley Dvorak.
Cerca de uma hora após a decolagem, quando a aeronave atingiu a altitude de cruzeiro de 11.000 metros, o disco da hélice do motor 2 explodiu, espalhando destroços por toda a aeronave. O barulho e a intensa trepidação geraram pânico entre passageiros e tripulantes.
Os pilotos, inicialmente tentando corrigir a situação, desligaram o motor central, um procedimento normal, e observaram uma redução da trepidação. No entanto, logo perceberam que o problema era muito mais grave do que se imaginava.
Perda total do sistema hidráulico
Quando o motor 2 foi desligado, a aeronave começou a inclinar para a direita e para baixo. O copiloto e o engenheiro de voo tentaram corrigir a direção, mas logo foi confirmado que a aeronave sofrera uma pane hidráulica total. A perda de todos os sistemas hidráulicos – que controlavam a direção, altitude e outros componentes críticos da aeronave – deixou os pilotos incapazes de controlar o voo.
Os detritos da explosão do motor danificaram os estabilizadores da aeronave, que continham os sistemas hidráulicos, causando um vazamento de fluídos. Em apenas dois minutos, a aeronave ficou totalmente sem controle.
A tripulação, sem nenhum manual específico para essa situação, recorreu a um último recurso: controlar a potência dos motores restantes. O comandante Haynes, junto ao copiloto Records e ao engenheiro de voo Dvorak, estabilizou a aeronave parcialmente, utilizando a assimetria de potência entre os dois motores para manter o voo.
A chegada de um herói improvisado
Enquanto o avião seguia sem controle, um dos passageiros, Dennis Fitch, que era piloto e instrutor de DC-10, se ofereceu para ajudar. Com sua experiência e o auxílio da tripulação, Fitch assumiu o controle das manetes de empuxo, estabilizando a aeronave durante o restante do voo.
Após 44 minutos de voo imprevisível, a tripulação declarou emergência e foi orientada a pousar no aeroporto de Sioux City, Iowa. Devido à perda de controle, a aproximação foi feita de maneira irregular, e a aeronave aterrissou com velocidades muito superiores às normais, a cerca de 460 km/h, em uma pista de 2.099 metros, que havia sido fechada.
O impacto e as consequências
O impacto foi violento. O avião tocou o solo com o motor e a asa direita, antes do trem de pouso, e capotou, quebrando-se em várias partes. Dos 296 ocupantes, 112 morreram, sendo 35 por inalação de fumaça, e 47 ficaram gravemente feridos. No entanto, 184 pessoas sobreviveram, uma taxa de sobrevivência extraordinária para uma situação tão crítica.
A cabine de comando foi encontrada apenas 45 minutos após o impacto. Os quatro membros da tripulação, apesar de gravemente feridos, sobreviveram. Fitch, o mais ferido, passou um longo período em recuperação e foi o último a voltar a voar.
A avaliação da tripulação e a lição aprendida
Após o acidente, a NTSB (National Transportation Safety Board) reconheceu que a manobra realizada pelos pilotos não era treinável, devido às complexas variáveis envolvidas. Em vez de adicionar uma página ao manual sobre como proceder nesse tipo de emergência, a NTSB concluiu que a única forma de enfrentar a situação seria com boa sorte, comunicação eficaz e preparação.
Comandante Haynes, copíloto Records, Fitch e o engenheiro Dvorak receberam reconhecimento por sua atuação, mas os próprios recusaram o título de heróis. Em entrevistas, Haynes enfatizou que o sucesso da operação foi resultado de uma combinação de fatores, incluindo a colaboração de todos os envolvidos.
Dennis Fitch, por sua vez, sentiu-se devastado por não conseguir salvar todas as vidas, uma dor que o acompanhou por anos. Fitch faleceu em 2012, mas seu legado como herói do voo 232 permanece imortalizado na história da aviação.
O episódio do voo 232 continua sendo um exemplo de como a habilidade, a sorte e a cooperação em momentos de crise podem resultar em uma sobrevivência improvável.