Boatos de demissões nas empresas geram insegurança entre colaboradores e medo do desemprego em um mercado de trabalho exigente e disputado, mas ao mesmo tempo podem ser benéficos. Para muitas pessoas, é a oportunidade para refletir se não é a hora de mudar de emprego ou até de direção na carreira.
Eduardo Shinyashiki, que trabalha no desenvolvimento das competências de liderança de profissionais, acha que é melhor prevenir do que remediar. ?As pessoas só pensam na carreira quando há rumores de demissão, como a pessoa que lembra da saúde quando está doente. As crises são o momento no qual as empresas vão mexer onde há acomodação.? Segundo ele, as empresas avaliam o grau de essencialidade do empregado e demitem exatamente as pessoas que não são ?diferenciadas?.
?Há pessoas que não ficam assustadas porque sabem que são essenciais e que o grau de empregabilidade delas é alto. O talento ninguém vai demitir, mas as pessoas que pararam de se especializar e de buscar novos conhecimentos têm ótima razão para se preocupar?, diz. Para essas pessoas, Shinyashiki recomenda que comecem a mandar currículos assim que os rumores aparecerem.
O consultor de carreiras Max Gehringer diz que quando empresas fazem reduções de quadro para enxugamento de custos, os que são demitidos primeiro são os mais novos de casa (porque o custo da rescisão é mais baixo), os solteiros (o impacto pessoal socioeconômico será menor), os que não executam serviços considerados indispensáveis em curto prazo, os que têm funções que podem ser terceirizadas (a área de treinamento é um caso típico, porque pode ser transferida para uma consultoria) e os que têm cargos que, pelo próprio nome, podem ser temporariamente extintos (um subgerente, por exemplo).
?Então, se um empregado se encaixa em três desses cinco itens, e ainda por cima está infeliz, sem dúvida deve se voluntariar para ser demitido?, diz. O consultor afirma ainda que faltas ao trabalho são costumeiramente avaliadas quando há listas de dispensas. ?Funcionários que faltam muito correm mais riscos.?
Gehringer indica começar a repensar a carreira e estudar o orçamento para poder fazer cursos de especialização. ?Quem se prepara para ser dispensado raramente é. As demissões costumam atingir aqueles que não esperavam ser demitidos, e, por isso, nunca se prepararam para evitá-las?.
Fábio Saad, consultor da Robert Half, diz que funcionários que não estão nos departamentos que dão mais receita para a empresa têm mais tendência a serem cortados. ?Por exemplo, uma empresa de produtos cosméticos cujo carro-chefe é a maquiagem, e 80% da receita vêm do batom, a empresa pode priorizar o produto que representa a maior parte das vendas e cortar os demais. O funcionário que está na área de esmalte dificilmente será levado para a área de batom. Só se alguém da área de maior receita estiver com mau desempenho?, exemplifica.
Max Gehringer afirma que, com ou sem rumores, o profissional deve ter sempre seu currículo revisado e sua lista de contatos bem atualizada. E precisa ativar os contatos quando os primeiros rumores surgirem.
Shinyashiki afirma que, em vez de se abater antes mesmo de a lista de demissão ser anunciada, esse é momento de ter uma atitude proativa e passar pela turbulência com foco e determinação. O que não deve ser feito é assumir a postura derrotista ao sinal de qualquer boato. ?Não morra antes de a batalha começar, estabeleça metas em vez de ficar choramingando?, aconselha.
?O momento de brilhar não é o próximo da degola, tem pessoas com condições de brilhar antes, os resultados obtidos anteriormente é que se tornam referência para o que vai acontecer hoje. Na lista que o diretor vai fazer ele leva em conta os resultados?, diz Shinyashiki.
Reavaliação e mudança de carreira
?Se o espaço que você ocupa atualmente não é o que você deseja e sonhou, talvez seja um bom momento para fazer reflexões, mudar a direção ou reinventar sua carreira?, diz Eduardo Shinyashiki. O especialista considera que, para muitos profissionais, a demissão pode ser o ponto da mudança. ?Tem pessoas que esperam que o outro termine a relação para não se sentirem culpadas, pois elas não têm coragem de tomar uma atitude. Assim, ficam esperando que a sorte ou o destino mudem por ela, e a empresa faz isso?, diz.
Se dentro do orçamento há uma ?folga? para ser gasta em cursos de especialização, Shinyashiki indica que o profissional passe a se organizar para isso. ?Se a pessoa não investiu em criar o diferencial e se não estiver fazendo isso, provavelmente estará na próxima lista de demissão?.
De acordo com o consultor, o profissional não deve deixar a carreira na mão da empresa para ela tomar conta. ?A probabilidade de o ordinário ser mandado embora é maior que a do extraordinário. Com 10 anos de casa, se o empregado não corresponder, ele é mandado embora. E quanto mais alto for o cargo, maior será a exigência por resultados?, diz Shinyashiki.
Fofocas
Max Gehringer não recomenda que o funcionário participe de conversas no banheiro, que só alimentam os rumores e fazem com que eles assumam proporções maiores do que realmente têm. ?Mas bem pouca gente resiste à tentação de se envolver nessas conversas. A melhor atitude seria então assumir que os rumores são verdadeiros, e pensar: ?se já aconteceu com tantas outras empresas, pode acontecer com a nossa. O que eu posso fazer a respeito??.?
Saad afirma que em momentos de crise o funcionário é muito julgado por aquilo que fala, e as pessoas se enganam quando pensam que o que dizem para alguém não pode ser levado para a chefia. ?Nesses momentos é preciso tomar cuidado com o que fala?.
O especialista diz que a chamada ?rádio-peão? alimenta especulações e tira a pessoa do foco, mas não saber o que está acontecendo é ruim. ?É como estar jogando sem a bola. Se você não está se posicionando e a bola vem, você não está lá para recebê-la, mas a radio-peão é maléfica?, diz.
Fusões
De acordo com Fábio Saad, em casos de fusões ou aquisições, existe muito risco de demissão onde as áreas se sobrepõem entre as duas organizações, e a tendência é que fique a pessoa de confiança da empresa que está comprando. No caso das funções mais operacionais, o que conta nessa hora é a performance e a relação pessoal. ?Quem fica é quem se adapta à cultura da nova empresa, mas quem tem a postura de falar que a empresa antiga funcionava melhor está na zona de tiro. Quem não se enxerga na nova empresa pode mandar currículo. O que a empresa espera é que você olhe para o futuro?, diz.
Segundo ele, se o profissional não se identifica com a nova empresa, em médio prazo ficará frustrado. ?É o momento de estabelecer conexões, é mais fácil se recolocar quando já está colocado, até para negociação salarial.?
Saad afirma que áreas como finanças, tecnologia, jurídico e administrativo, que são de suporte e necessárias em todas as empresas, mas não demandam muita especialização, correm mais risco de sofrerem cortes em fusões. Os departamentos ligados à área de negócios das companhias geralmente são preservados.
Gehringer explica que num primeiro momento a empresa que assume o comando não faz cortes com base em desempenho individual. Para ele, o empregado deve se preocupar somente caso seu salário esteja acima da média do mercado. Ganhar mais em relação aos colegas não deve ser motivo de preocupação. ?Pode ser que os colegas é que estejam abaixo da faixa de mercado. O que será futuramente comparado, função por função, são os salários das duas empresas. Se os da empresa comprada forem maiores que os da empresa que comprou, até mesmo quem acha que ganha pouco poderá entrar numa lista de possíveis substituições.?
?Um ponto importante é que, para alguns funcionários, a chegada de novos donos representa um salto na carreira, que não seria dado naquele momento se a empresas não fosse vendida. Portanto, além do fator "receio do que pode acontecer comigo", há igualmente o fator "essa é a minha chance". Aí depende do pessimismo, otimismo e realismo de cada um?, conclui.