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Coluna do jornalista José Osmando - Brasil em Pauta

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STF corrige lei subjetiva que só tem servido para punir pretos e pobres

A decisão do STF expõe a desigualdade no tratamento de pessoas de classes desfavorecidas,

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A decisão do Supremo Tribunal Federal, formando maioria de seus ministros para descriminalizar o uso da maconha, expõe ao Brasil uma realidade alarmante no modo com que forças policiais e componentes do próprio poder de justiça tratam as pessoas do andar de baixo. 

Pretos, pardos e pobres. São estas as grandes vítimas de um sistema legal subjetivo, que deixa nas mãos dos próprios policiais o poder de julgar se a pequena quantidade de maconha portada por uma pessoa trata-se de uso ou tráfico.

Se o porte estiver com um branco, bem vestido, será considerado de uso próprio; se quem conduz essa pequena quantidade for preto, pardo e preto, tem-se aí quase 100% de certeza de que isso será considerado tráfico de entorpecente. 

Este é o retrato cruel desse Brasil desigual, que tem imensos contingentes de seu aparelho policial carregando uma formação distorcida, sempre pronta a considerar pessoas não-brancas como contraventoras.

O que estou dizendo aqui não é fruto de fantasia, não se trata de invencionice para suavizar o papel do negro em nossa sociedade. Baseio-me em dados produzidos e revelados por estudos do IPEA(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), no seu Atlas da Violência, e em números publicados pelo Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa). Eles mostram que 42.631 detentos não estariam no sistema prisional brasileiro se até 25 gramas de maconha e 10 gramas de cocaína fossem considerados quantidades adequadas para uso pessoal. Se o volume de maconha subisse para 100 gramas, o número de pessoas que não entraria na prisão por conta desse porte seria de 67.583 pessoas.

E mais. A polícia Militar do Estado de São Paulo levou à condenação e ao sistema prisional,  recentemente, mais de 31 mil pretos, pardos e pobres, por portarem pequenas quantidades de droga, por terem sido em suas avaliações consideradas traficantes. Quantidade maior de pessoas nas mesmas circunstâncias que esses negros, por serem brancas e bem apessoadas, quando flagradas pela polícia, tiveram sua conduta considerada como usuário, portanto livres de prisão.

A Lei das Drogas, aprovada pelo legislativo brasileiro em 2006, foi omissa em relação ao caráter objetivo quanto à quantidade de droga para porte pessoal, e mesmo quanto à diferenciação clara sobre o que é considerado porte para uso ou tráfico. Deixou, assim, na cabeça do policial, a tarefa de decidir. E aí o pobre e preto é quem sempre paga a conta.

Por conta disso, além da privação de liberdade, de tratamento desigual e de clara perseguição a pessoas de baixo poder aquisitivo, os pobres, o sistema prisional brasileiro foi inundado por uma quantidade absurda de presos.

 De menos de 300 mil presos em 2005, ano anterior à implantação da lei, até 2023, conforme aponta o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, já são mais de 832 mil detentos, um aumento de quase 200%. E mais vezes, diariamente, negros e pobres são enquadrados como traficantes, o que só faz aumentar a quantidade de detentos, piorando e degradando as condições ambientais dessas prisões, certamente contribuindo para piorar a situação pessoal de cada um, impedindo qualquer possibilidade de recuperação e reinserção no convívio social. Uma tremenda fábrica de marginais. 

O que se espera agora, após a decisão do STF, é que o sistema legislativo tenha capacidade de modificar a lei em vigor, de modo a adequá-la de maneira civilizada à realidade e às exigências de respeito humano que a todos deve atender. É necessário que, ao contrário do embate embutido nas manifestações do presidente do Senado e do Presidente da Câmara, tenhamos um parlamento capaz de consertar seus erros do passado, quando nos legou uma lei passível de subjetividade prática, sendo agora capaz de adequá-la ao caminho correto que o STF acaba de indicar.



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