Na semana passada ao ministro Fernando Haddad, cercado pelo corpo técnico do seu Ministério, foi à Câmara Federal entregar nas mãos do presidente Artur Lira o projeto contendo os detalhamentos da regulamentação da Reforma Tributária. O gesto teve ampla repercussão na mídia, em razão do clima civilizado em que se deu o encontro e na aparente melhoria que poderia estar ocorrendo nas relações entre governantes e parlamentares.
Mas logo o ministro Haddad e seus auxiliares deram as costas, logo começam os mistérios, iniciando-se pela declaração bastante segura de Lira, ao que parece, de que não admitirá apenas um relator para o projeto, como correu em relação à primeira aprovação do texto básico da reforma, cuja relatoria ficou a cargo do deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
Grupos de Trabalho
Por ter realizado um trabalho bastante elogiado, governo e parlamentares favoráveis à reforma tributária esperavam que o próprio deputado paraibano ficasse com essa nova tarefa. Mas não. O Presidente Artur Lira não deseja que essa proposta governamental de regulamentação fique nas mãos de uma só pessoa e anunciou que vai criar “grupos de trabalho” para cada tema indicado no projeto governamental.
Seriam esses grupos comitês de campanha?
Tem gente achando que esses grupos trarão o risco de virarem pequenos “comitês de campanha”, com força para dar ou tirar de acordo com as conveniências, pois Lira não perde a oportunidade de dar sempre um passo adiante na tentativa de fazer seu sucessor na Presidência da Câmara.
Debates específicos
Na prática, o que o presidente Artur Lira quer mesmo, com esses “grupos de trabalho”, ao instituir debate específico para cada tema tratado na proposta, é impor ainda mais complexidade às votações. Ilações à parte, o fato concreto é que os lobbys, que constituem um exercício permanente nas relações dos segmentos econômicos e de entidades representativas junto à Câmara, já botam a cabeça de fora e começam a pressionar os deputados para que não aprovem o projeto de regulamentação na forma como foi enviado pelo Governo.
Duas possibilidades
E aí as movimentações têm duas vias de passagem. A primeira delas diz respeito à imposição de exceções, para incluir o quanto mais possível produtos e serviços com tarifas reduzida ou até mesmo sejam isentas de pagar tributos. E isso tem um efeito grande e danoso, pois quanto maiores forem os setores beneficiados com desconto ou isenção, menos o Governo terá resultados na sua necessidade de elevar receitas, ou ainda, que tarifas sobre outros produtos e segmentos sejam aumentadas para compensar as dispensas que os parlamentares fizerem.
Decisões sob influências
E como estamos num ano eleitoral, em que as bases municipais têm maior influência sobre os congressistas, esse risco cresce bastante. É só ver, por exemplo, que no texto encaminhado pelo Palácio do Planalto, foram listadas 18 categorias de profissões liberais que recolheriam 30% a menos de impostos na nova medida. Agora, inúmeras outras profissões armam barraca a partir desta semana, para pressionar a Câmara e sejam também admitidas no benefício.
"Imposto do pecado"
Outra briga que já está claríssima – e essa praticada de modo pesado, organizado, poderoso-, é a quem vem dos segmentos industriais atingidos pela alíquota do chamado “imposto do pecado”. A proposta governamental lista nesse rol produtos como bebidas alcoólicas e açucaradas, cigarros e algumas categorias de carros, além de barcos e afins. O perigo que esse lobby ostenta é de tal forma, que alguns dos seus porta-vozes começam a ameaçar que essas alíquotas sejam direcionadas à desoneração da cesta básica, um golpe mortal para os mais pobres.
A elevação de tarifas para produtos classificados como “pecado” tem objetivos claros de torná-los mais caros, em defesa da saúde coletiva e da proteção ambiental, garantido mais recursos para tocar projetos governamentais e apresentar um mínimo de redução nas desigualdades e desequilíbrios até hoje existentes. Mais isso parece interessar a poucos. Os próximos dias serão de embates complicados. Acompanhemos.