José Osmando

Coluna do jornalista José Osmando - Brasil em Pauta

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A suécia constata que livros digitais formariam analfabetos funcionais

Suécia constata resultados desastrosos e abandona livros digitais nas escolas; enquanto isso, São Paulo adota medida radical

Dois episódios chamaram bastante minha atenção no decorrer desta semana. Um, de caráter notavelmente positivo, revestido de bom senso e gerador de esperança, diz respeito à decisão do governo da Suécia, de recuar na adoção do uso de livros digitalizados nas escolas dessa grande nação, após concluir por resultados desastrosos, que estavam levando ao risco de transformar a próxima geração de estudantes suecos em analfabetos funcionais. 

A Suécia, uma nação plenamente desenvolvida, possui um dos sistemas educacionais mais antigos e mais edificantes da Europa, um dos mais progressistas e eficientes do mundo. Ao lado da Finlândia, é colocado no PISA como um dos mais  vitoriosos do planeta. Na Suécia, todas as crianças, independentemente da capacidade financeira da família, devem adquirir conhecimentos aprofundados. E esse compromisso na preparação dos jovens, diz igualmente do cuidado que têm com a educação dos cidadãos adultos e dos imigrantes e seus filhos. Estamos tratando, neste assunto, de um país que tem legítima autoridade para decidir.

SÃO PAULO 

O outro, que vai exatamente na contramão dessa acertada decisão dos dirigentes suecos, foi a posição assumida pelo governo do Estado de São Paulo, de se recusar, por meio da Secretaria Estadual de Educação, a aderir ao programa de material didático e pedagógico do Programa Nacional de Livros Didáticos (PNLD), do MEC, uma política pedagógica tradicional, histórica, que coloca, gratuitamente para as famílias, o livro físico nas mãos dos estudantes, facilitando sua vida escolar e reforçando seu universo de conhecimento. 

E anunciou, contrariamente ao que faz a Suécia, que no lugar dos livros físicos, que o estudante pega, sublinha, marca, maneja suas páginas, a Secretaria de Educação vai utilizar, agora, material próprio e digital. Sim. Os estudantes do Estado de São Paulo estão dando adeus ao livro físico para ficar com acesso apenas aos livros digitalizados. 

No programa do Ministério da Educação, as redes municipais e estaduais têm a liberdade de escolher os livros que desejam utilizar do catálogo e, em seguida, recebem os materiais gratuitamente do governo federal. Os livros são produzidos historicamente por comissões formadas por professores/escritores especializados e trazem assuntos relevantes à vida dos estudantes e à compreensão do mundo. Conforme a decisão do governo paulista, todo o ensino compreendendo o 6º ao 9º ano do ensino fundamental, e para o ensino médio, todo o material será 100% digital.

DECISÃO RADICAL

O presidente da Associação Brasileira de Livros e Conteúdos Educacionais, Ângelo Xavier, destaca que a mudança para usar material próprio foi uma decisão radical e sem consulta aos dirigentes. Ele ressalta que o material do programa do MEC é completo, com livro impresso e livro interativo digital, enquanto a decisão do estado trará a ausência de recursos didáticos impressos. Cerca de 1,4 milhão de alunos deixarão de receber livros físicos a partir do próximo ano. 

Assombra o que vem acontecendo no Brasil de uns tempos para cá. O anúncio de que os livros físicos sumirão das mãos dos estudantes paulistas, que terão como opção apenas os livros digitais, veio acompanhado também da notícia de que o governo do Estado fez significativos cortes nas verbas de educação para este ano, assim também prevendo o orçamento de 2024. Tudo leva ao caminho do negacionismo, como se estivesse em curso um processo vigoroso de desacreditar a instituição escola. O saber, o conhecimento, sendo postos de lado, para a prevalência de outras ordens de poder. 

PAPEL DO LIVRO 

Isso entristece, sobretudo, quando sabemos o papel que o livro físico desempenha na vida, na cabeça, na formação, na socialização, no aprendizado, na sensibilidade, de pessoas livres, especialmente de crianças e jovens,  num mundo que se deseja humanizado. 

Li recentemente o livro “O Clube do Livro do Fim da Vida”, escrito por Will Schwalbe, uma obra baseada em história real, em que esse editor de livros americano fala das suas relações de leitura com a mãe, fortalecidas e ampliadas quando ela contraiu um câncer que a levaria à morte.

Ao falar sobre o livro, ele diz que uma das muitas coisas que adora nos livros “é sua mera natureza física. Os livros eletrônicos vivem fora dos olhos e da mente. Mas os livros impressos têm corpo, presença. Eu frequentemente também procuro livros eletrônicos, mas eles nunca vêm atrás de mim. Eles me fazem sentir, mas eu não posso senti-los. São apenas alma sem carne, sem textura e sem peso. Podem entrar na sua cabeça, mas não podem dar uma cacetada nela.”

É isso aí. Não imagino ficar sem os livros físicos. Que me perdoem os sabidinhos apressados e insensíveis.

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