Serviço que promete reduzir juros pode ter regra definida até março

O open banking permitirá que as instituições financeiras troquem informações de seus clientes entre si, e um banco do qual você não seja cliente ofereça produtos

Cronograma apertado, incerteza sobre os custos e preocupação com os riscos de vazamento de dados. Segundo as entidades que representam o setor financeiro no país esses são os principais desafios para o open banking, novo conjunto de regras e processos autorizado pelo Banco Central. A consulta pública sobre o tema acabou e agora o BC quer definir as regras até março.

O open banking permitirá que as instituições financeiras troquem informações de seus clientes entre si, e um banco do qual você não seja cliente ofereça produtos. Seria possível, por exemplo, pagar uma fatura de um cartão de crédito do banco A usando uma linha de crédito do banco B, onde você não é cliente. Por causa da concorrência, espera-se que os juros caiam, o que é bom para as pessoas. Mas há também dúvidas sobre a privacidade.

Período de consulta pública acabou

A proposta do Banco Central foi apresentada ao mercado no último 28 de novembro. O texto então ficou em consulta pública por dois meses, período no qual qualquer pessoa, empresa ou entidade de classe pôde enviar sugestões. De maneira unânime, o mercado considera o open banking um aperfeiçoamento porque vai aumentar a oferta de produtos e serviços aos consumidores.

Mas a implementação do projeto tem desafios que precisam ser discutidos para que o sistema seja sustentável no longo prazo e não seja travado por custos muito elevados, dizem profissionais ouvidos.

"Sempre reforçamos nosso engajamento propositivo e ao mesmo tempo cauteloso, com muito cuidado com a segurança e sustentabilidade do sistema para que o negócio possa durar por muitos anos e possa se perpetuar ao longo do tempo", disse o diretor de Política de Negócios e Operações da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Leandro Vilain.

Prazo curto para implantar

O prazo estabelecido pelo Banco Central para a implementação do open banking é um ponto questionado por quase todas as associações - da Febraban à Abranet (Associação Brasileira de Internet).

Pela proposta do BC, na primeira etapa do projeto, que vai até 30 dias pós a publicação das regras, as entidades de mercado deverão criar os órgãos que vão monitorar e resolver conflitos no open banking, os conselhos de governança. São as próprias empresas que vão definir quem vai ter assento, qual o peso de voto de cada um nesses órgãos e quem vai arcar com os custos dessas estruturas.

Depois, em até 150 dias após a publicação da resolução, já haveria a primeira onda de compartilhamento de dados dos clientes, com a troca de informações sobre produtos e serviços contratados por eles ou distribuídos pela instituição doadora das informações, que pode ser, por exemplo, por exemplo, um grande banco ou uma empresa de meios de pagamento.

O plano sugerido pelo BC é que em até 360 dias após a publicação das regras, todos os demais integrantes do sistema financeiro, como as novas fintechs de crédito ou de pagamento, por exemplo, também estejam com acesso a essa plataforma.

Não há data exata

O Banco Central não tem prazo definido para apresentar a versão final das regras do open banking, mas o plano do órgão é definir o texto ainda neste trimestre. E a partir da publicação do texto final o tempo já começa a contar. Um exemplo corriqueiro de como o open banking vai exigir mudanças na rotina das instituições financeiras: quando uma empresa pedir à outra uma informação sobre pagamento de conta de luz, terá que haver uma nomenclatura que seja a mesma para todos, pois hoje cada banco tem um código próprio para cada item.

Custos preocupam instituições

Além disso, dizem profissionais de mercado, o volume de transações dentro do sistema financeiro vai crescer muito com o open banking. O que vai demandar novos processos, treinamento de pessoal e investimento em infraestrutura de tecnologia. Um grande banco, por exemplo, será mais solicitado diversas vezes ao dia por diferentes empresas a enviar informações de seus clientes para outras empresas financeiras que queiram, por exemplo, oferecer determinados produtos às pessoas.

Se na largada do open banking houver 10 milhões de consumidores dentro das empresas financeiras que participam da primeira etapa do projeto, e se para cada um desses CPFs ocorrerem quatro consultas por dia - o que é factível, dizem profissionais do mercado - haverá um incremento de 40 milhões de chamadas por dia, 1,2 bilhão por mês. "Isso me parece uma sobrecarga muito grande para o sistema", disse Vilain, o diretor da Febraban.

Maiores bancos deveriam pagar mais

A proposta do Banco Central é que o mercado defina entre os participantes qual será o custo de cada uma dessas transações. A diretora da ABFintech (Associação Brasileira das Fintechs), Ingrid Barth, entende que haverá um custo maior sobre as maiores empresas financeiras. "Não faz sentido ter um rateio em partes iguais, mas deveriam ser considerados critérios como porte e capilaridade", afirmou a executiva.

Segundo ela, ainda não é possível projetar de quanto será o impacto do open banking na estrutura de custos do mercado financeiro. "Estamos longe de ter estimativa de quanto serão os custos", disse. O presidente da ABCD (Associação Brasileira de Crédito Digital), Rafael Pereira, diz que a proposta do BC para o open banking veio dentro do esperado pelo mercado, mas é natural que surjam divergências e ajustes a serem feitos. "Há interesses divergentes porque temos participantes que são competidores", afirmou.

Cuidados para não vazar dados de clientes

Como o open banking está baseado no maior acesso às informações de consumidores e empresas, uma preocupação que aparece em várias sugestões enviadas pelas entidades ao Banco Central diz respeito aos cuidados necessários nos processos de envio e recebimento dos dados. Quem pedir um determinado dado de uma pessoa terá que informar qual o objetivo que ele tem com essa informação. E não poderá utilizar o que recebeu para um outro fim.

Por exemplo, se uma instituição pedir um dado sobre o histórico de crédito que uma pessoa tem em um banco para oferecer a essa pessoa um serviço de investimento financeiro só o poderá fazê-lo se o cliente der essa autorização e não poderá empregar a informação obtida desse CPF para outra finalidade. Se o fizer, poderá ser punida conforme regras da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPDP), que entrou em vigor em 2019. Como regra geral, o consumidor é o dono dos dados de suas transações e terá que ser sempre consultado para autorizar a circulação dessas informações.

Falta proteção ao consumidor, diz Procon

As dúvidas ficam por conta de como isso vai funcionar no dia a dia. O Procon-SP destacou em sugestões enviadas ao Banco Central que "o consumidor deve receber a informação clara sobre a forma como se dará o uso de seus dados, a responsabilidade objetiva”.

Para o órgão de defesa do consumidor, o cidadão está em desvantagem porque não detém o conhecimento tecnológico das transações abertas pelo open banking. Por isso, é fundamental que a regulação aponte claramente como as instituições financeiras vão informar aos clientes sobre a abertura de dados de cada um.

Para o Procon, a proposta regulatória do BC não dá uma previsão de sanções administrativas na ocorrência do descumprimento de um ou mais de seus dispositivos, como no caso de haver o compartilhamento de dados sem o consentimento do consumidor ou ainda em transações não autorizadas pelos clientes.

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