O Superior Tribunal Militar (STM) confirmou a condenação de quatro civis acusados de tentar fraudar as atividades da Operação Pipa, realizada pelo Exército em parceria com o Governo Federal, para distribuir água potável às vítimas da seca no semiárido. Cada réu foi sentenciado a um ano de reclusão por tentativa de estelionato, conforme previsto no Código Penal Militar.
Segundo a denúncia apresentada pelo Ministério Público Militar (MPM), em 25 de agosto de 2017, dois civis foram presos em flagrante por manusear de forma inadequada três módulos embarcados de monitoramento (MEM), que são dispositivos com GPS utilizados pelo Exército para rastrear os caminhões-pipa durante a distribuição de água nas cidades, povoados e áreas rurais.
Os aparelhos, que deveriam estar instalados nos caminhões, foram encontrados na mochila de um dos réus, que estava pilotando uma motocicleta próximo a um açude, local de captação de água. Os MEMs estavam conectados à bateria da motocicleta.
A fraude foi descoberta após os moradores da comunidade de Jaicós, no Piauí, região nordeste do estado, denunciarem à Polícia Militar a presença de dois indivíduos suspeitos realizando "rondas" nas localidades. Após a abordagem dos suspeitos, os militares encontraram os dispositivos utilizados na fraude.
Durante a prisão em flagrante, um dos acusados afirmou estar trabalhando para o seu empregador, também réu no processo. A Polícia Militar descobriu que os aparelhos apreendidos estavam relacionados à Operação Carro Pipa (OCP) e que havia uma prática recorrente na qual esses equipamentos eram retirados dos caminhões por motoristas contratados para realizar o serviço e eram instalados em veículos menores, a fim de registrar o percurso que deveria ser feito pelos caminhões.
Dessa forma, ao simular a prestação do serviço, os envolvidos obtinham o pagamento previsto no contrato de credenciamento.
A Polícia Militar montou uma barreira na cidade de Padre Marcos, no Piauí, para capturar o empregador do acusado, que, ao ser abordado, se identificou como um dos proprietários dos caminhões-pipa aos quais pertenciam um dos dispositivos apreendidos.
Durante investigações posteriores, constatou-se que os aparelhos GPS apreendidos estavam cadastrados em três diferentes caminhões-pipa, com motoristas diferentes. Dois dos acusados confessaram em depoimento que possuíam contrato de credenciamento com uma organização militar do Exército para a prestação de serviços e admitiram a prática criminosa.
A investigação também revelou que havia rotas programadas para os três caminhões nos dias 23 a 25 de agosto daquele ano, relacionadas aos GPS apreendidos, e que ocorreu a entrega de algumas cargas de água, porém, o pagamento não foi efetuado pelo Exército, resultando em prejuízo aos cofres públicos.
Com base nas provas apresentadas, a promotoria solicitou ao Tribunal Militar da União (JMU) a condenação de todos os acusados pelo crime de estelionato tentado. Em primeira instância, o juiz federal da Justiça Militar Rodolfo Rosa Telles, titular da Auditoria Militar de Fortaleza, considerou os réus culpados e os condenou a um ano de reclusão.
O juiz concedeu também a suspensão condicional da execução da pena pelo prazo de dois anos, fixou o regime prisional inicial como aberto e permitiu que os réus apelassem em liberdade.
Em sua fundamentação, o magistrado destacou que os MEMs apreendidos foram desconectados de forma inadequada dos caminhões-pipa, que tinham previsão de entregar água em 25 de agosto, e foram irregularmente conectados à bateria da motocicleta dirigida por um dos réus.
Ele afirmou que ficou comprovado que os dispositivos estavam funcionando corretamente em um local completamente inadequado, ou seja, conectados à bateria de uma motocicleta, com o objetivo de enganar o Exército e simular o cumprimento dos percursos dos caminhões cadastrados na OCP.
"Não é possível argumentar erro de fato, uma vez que os acusados tinham conhecimento da proibição de remover os MEMs dos caminhões, uma vez que essa restrição consta expressamente nos contratos de credenciamento assinados por eles. Da mesma forma, a alegação de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos não prospera, pois, no âmbito do Direito Penal Militar, o artigo 44 do Código Penal não se aplica, devido à falta de previsão legal em seu texto. Deve-se levar em conta a especificidade da legislação militar", declarou o juiz.
Apelação ao STM
A defesa dos quatro réus, realizada pela Defensoria Pública da União, recorreu da sentença ao Superior Tribunal Militar, em Brasília. Eles argumentaram que não tinham a intenção de obter vantagem ilícita ou fraudar a administração militar, afirmando que ao removerem o MEM, pretendiam apenas testar os dispositivos que apresentavam problemas de funcionamento. Também alegaram que não havia dolo específico nas condutas, o que tornaria o fato atípico, de acordo com o princípio do in dubio pro reo.
Ao analisar o caso, o ministro do STM Cláudio Portugal de Viveiros rejeitou o recurso e manteve integralmente a sentença condenatória dos civis. Por unanimidade, os demais ministros da Corte seguiram o voto do relator.