Relatório revela mortos políticos do Piauí durante regime militar

O documento histórico engloba casos de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979

Publicação da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos durante o regime ditatorial no Brasil aponta para dois episódios envolvendo piauienses no período. O documento histórico engloba casos de 2 de setembro de 1961 a 15 de agosto de 1979.

O primeiro abarca Antônio de Pádua Costa, piauiense de Luís Correia, com atividade no PC do B na época do seu desaparecimento entre janeiro e março de 1974. Durante o regime militar, ele estudava Astronomia na Universidade Federal do Rio de Janeiro quando começou a participar ativamente do Movimento Estudantil entre os anos de 1967 e 1970. Fez parte da do Diretório Acadêmico do Instituto de Física e foi membro do Conselho do Dormitório do Alojamento do “Fundão”. Preso durante o 30º Congresso da UNE, em Ibiúna (SP), foi indiciado em inquérito e passou a ser perseguido pelos órgãos de segurança do regime militar. Optou pela militância política clandestina, quando já era militante do PC do B. O Relatório Arroyo registra a ocorrência de um choque armado em 14/01/1974, no qual três guerrilheiros conseguiram fugir, mas não se sabia o que acontecera com outros três: Piauí (Antônio de Pádua Costa), Beto (Lúcio Petit da Silva) e Antônio (Antônio Alfaiate).

No já mencionado relatório dos quatro procuradores do Ministério Público Federal, apresentado em janeiro de 2002, a informação é colidente com a da Marinha: “Piauí: Antônio De Pádua Costa, foi identificado sendo conduzido por soldados fardados na cidade de São Domingos do Araguaia. Depois de preso trabalhou como guia para as Forças Armadas na base da Bacaba, havendo, inclusive, foto sua em uma equipe. Manoel Leal Lima (ex-guia conhecido como Vanu) relatou que ao final da guerrilha Piauí for morto na Bacaba, assim como Duda e Pedro Carretel. Vanu disse ter acompanhado a equipe que os executou”.

Antônio de Pádua foi um dos presos políticos do Piauí durante a ditadura. Na imagem, um postal que ele enviou à família (Foto: Reprodução)

O livro de Elio Gaspari, A Ditadura Escancarada, vai na mesma direção: “Piauí, um dos quadros mais qualificados do PCdoB, andou pelo mato por várias semanas, até que um menino que o acompanhava (cujo pai aderira à guerrilha e fora morto) resolveu levá-lo à casa de um tio. Estava faminto, seminu. Foi entregue à tropa, que o encapuzou, amarrou e levou para a Bacaba. O mateiro Peixinho acompanhou-o em cinco patrulhas na busca por depósitos de armas ou mantimentos. A princípio Piauí ia amarrado. Depois andava com a tropa. Um dia disseram ao mateiro que Piauí não o acompanharia mais”.

O caso foi registrado após a decretação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em 13 de dezembro de 1968, que abriu uma nova fase no cômputo geral das mortes e desaparecimentos de opositores políticos do regime militar.

Caso Sitônio

Outro piauiense que aparece no levantamento da Comissão Especial é Antônio Araújo Veloso, camponês nascido em Bertolínia radicado na região do Araguaia, conhecido como Sitônio, foi preso em abril de 1972, durante a primeira campanha militar de repressão à guerrilha. Por sua convivência e amizade com os guerrilheiros, foi submetido a brutais torturas, que resultaram em seqüelas permanentes, resultando em sua morte em 31/08/1976, aos 41 anos. Seu nome nunca constou do Dossiê dos Mortos e Desaparecidos Políticos.

Sua viúva, Maria Raimunda da Rocha Veloso, conhecida como Maria da Metade, líder da organização das trabalhadoras rurais do Araguaia a partir da redemocratização, tornou-se um símbolo da luta dos familiares de mortos e desaparecidos, em especial pela dedicação no resgate da história dos guerrilheiros e na busca das sepulturas clandestinas.

O primeiro requerimento apresentado à CEMDP foi instruído com declarações de moradores de São Domingos do Araguaia (PA), informando que a morte ocorreu quatro anos após a prisão e decorreu dos maus tratos recebidos. O atestado de óbito indicava “morte natural, sem assistência médica”. Posteriormente, foi anexada ao processo uma declaração de Danilo Carneiro, um dos poucos militantes do PCdoB a ser preso no Araguaia e sobreviver. Em seu depoimento, conta que morava na casa de Antônio Araújo Veloso e que, depois de preso por integrantes do Exército, viu o amigo Sitônio também preso, “barbaramente ferido na cabeça, ouvidos e boca, por onde sangrava abundantemente”, aparentando estar com fraturas no corpo.

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