A jornalista Miriam Leitão, da Globo News, foi ao Palácio do Planalto, em Brasília, entrevistar o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. Um dos coordenadores da campanha vitoriosa para a reeleição da presidente Dilma Rousseff, Mercadante falou sobre a estratégia do novo governo para enfrentar as dificuldades econômicas e políticas em 2015.
Miriam Leitão – Ministro, a gente está com um crescimento zero e a inflação acima do teto da meta. Isso não é um bom desempenho.
Aloizio Mercadante – Depende do ponto de vista que você olha. Vamos pegar a China, que é o motor da economia mundial. A China está com a pior taxa de crescimento dos últimos 25 anos. 7,3%. Ela crescia 14% antes da crise. A Europa teve uma taxa negativa de crescimento nos últimos dois anos e não conseguiu sustentar uma recuperação e está próximo a uma de- flação. A inflação está 0,4% e caindo. A Alemanha vem com uma taxa de queda da produção, a indústria mais competitiva da Europa e uma das mais competitivas do mundo, vem com uma taxa negativa de juros e não consegue se recuperar e a indústria vem tendo sucessivas quedas. Se você olhar ao nosso entorno aqui a situação não é diferente. Os Estados Unidos tiveram um segundo trimestre melhor, mas é uma única economia. É muito importante, mas não é o cenário internacional. O Brasil no ano passado cresceu 2,5%. Se você pegar nesse período da crise o Brasil teve um dos melhores desempenhos entre as economias do G20. Vamos pegar as contas fiscais, tema que precisamos discutir. Nós fomos o segundo melhor superávit primário do G20 nesse período de crise. Hoje só cinco países do G20 tem superávit primário. O Brasil é um deles. A dívida bruta dos países do G20 cresceu em média 30%. A nossa caiu. Nós desendividamos a sociedade brasileira. É preciso reconhecer o esforço que o estado brasileiro fez de superávit e redução da dívida. Nossa dívida bruta está estável, nossa dívida líquida que era 60% do PIB está em torno de 35%, que é o indicador mais relevante para você avaliar a solvência fiscal de um país. As nossas reservas foram preservadas em R$ 375 bilhões. É um dos países com as melhores reservas fiscais do mundo. Isso tudo foi o que nos permitiu alguma margem de manobra na crise. O comércio internacional que crescia 7,5%, está crescendo 3%. Metade do que era no período pré-crise.
ML – Esta semana o governo mandou ao Congresso uma proposta de aumentar o desconto que deve a ser maior do que o superávit. Levando-se em conta esse desconto você tem um déficit primário. Como convencer as pessoas e o mercado financeiro de que o governo realmente está sólido do ponto de vista fiscal?
AM – Dos 20 países mais importantes da economia mundial só cinco têm superávit. A única economia que teve um viés de alta este ano, que foi a Inglaterra, Reino Unido, está com déficit primário. Os Estados Unidos em 2009 chegaram a ter um déficit primário de 13,5% do PIB. Na hora que a recessão bateu eles saíram fazendo uma política dicíclica, levando o Keynes ao limite para tentar evitar que a recessão, desemprego, a quebradeira financeira econômica. E de lá para cá vem mantendo uma política monetária e fiscal de tentar reativar a economia fortemente. Estou pegando economias que são referência para vermos a opção que fizemos. A primeira opção que fizemos este ano foi continuar desonerando a produção, reduzindo carga tributária para as empresas. Desoneramos 56 setores da folha de pagamento para a indústria. Isso reduz custo. Ajuda a manter emprego porque faz o posto de trabalho ficar mais barato. Mantivemos o reintegra para melhorar as exportações como uma política permanente. Desoneramos a cesta básica. Os impostos federais para reduzir o custo para as famílias. Desoneramos a micro e pequena empresa. 142 setores entraram no supersimples, reduzindo carga tributária e desburocratizando e facilitando a vida das empresas. Desoneramos investimentos importantes. E desoneramos alguns setores que tem grande impacto na cadeia industrial.
ML – E por que que o Brasil não cresceu?
AM - Se nós aumentarmos a carga tributária, fizermos uma medida provisória retirando todas as desonerações da indústria vai melhorar a economia brasileira? Não vai. Agravaria a recessão, o desemprego e a crise. A mesma coisa em relação aos gastos. Qual foi o gasto que cresceu? Não foi folha de pagamento. Não foi o custeio do estado. O que cresceu foi basicamente investimento. 34% de aumento e o PAC cresceu 47%. Porque fizemos um esforço adicional de investimento? Exatamente porque a economia mundial está em uma trajetória de recessão. Nosso setor exportador está sofrendo muito com esse cenário. O minério de ferro caiu 38% de preço. Soja, 28%. Petróleo caiu 26%. Mas a queda das commodities internacionais e uma retração do comércio afeta nossa indústria. Então as desonerações e o esforço de investimento, mais as Parcerias Público Privada para investimento em estrutura. Eu acho que o Congresso vai entender que é necessário isso.
ML – Não era melhor falar assim: não podemos cumprir a meta, a meta vai ser isso...
AM – Nós nunca usamos o desconto que estava na lei. O que é o desconto do superávit? São só dois: PAC onde está crescendo, e desoneração onde cresceu. Nós estamos dizendo com toda transparência que fizemos uma opção de proteger a indústria, o salário, o chão da fábrica, o emprego.
Porque o mundo lá fora não nos permite crescer. O que nós temos é o nosso mercado interno que é o que mantém o nível de atividade da economia. E o estado tem que fazer uma política anticíclica como todas as principais economias estão fazendo e fizeram. O G20 está discutindo um esforço pactuado, concentrado, de fazer um esforço adicional de investimento para que o mundo se recupere.
Porque a primeira coisa que a gente faz quando cai em um buraco é parar de cavar. Se todo mundo aumentar impostos e cortar gastos pode ter certeza que a economia mundial vai muito mais rápido para o buraco do que ela já está. Nós fomos um dos primeiros alunos da sala nessa década em superávit primário. Fomos um dos poucos países que desendividou o estado. Eles aumentaram em 30% a dívida pública. A nossa ficou estável, a nossa dívida líquida caiu. Nós estamos usando essa margem. Agora se você me perguntar se eu queria um superávit primário maior, nós queremos. Vamos fazer o máximo que a gente conseguir. Já em 2014 e 2015.
É um valor importante o superávit primário. É um valor importante a Responsabilidade Fiscal. E nós não estamos abrindo mão desses valores. Sabemos que esse esforço é importante para reduzir juros, atrair investimentos. Nós somos o quinto país com mais investimento externo no mundo. Em meio a essa crise, 66,5 bilhões de dólares nesse ano. Então nós temos consciência disso. Em 2011, nós fizemos 10 bilhões a mais de superávit. Em 2008, criamos um fundo soberano e fizemos uma poupança extraordinária. Mas não é o quadro desse ano. Então é a discussão é transparente e pública.
Se o Congresso não der a autorização do superávit, nós cumpriremos o superávit. É simples. Suspende as desonerações e corta os investimentos, e para as obras, para uma parte da economia, vamos ter mais desemprego, e ficará na responsabilidade de quem tomar essa atitude. Porque não há outra opção. As pessoas começam a fazer política cedo e não vão na aula de matemática. É simples. Superávit significa mais impostos e menos gastos, menos investimentos.
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