— Costumava-se dizer que a feijoada era o prato nacional. No entanto, hoje em dia, é o churrasco que ocupa esse posto, visto que não se encontra gente fazendo feijoada todos os dias em todos os municípios brasileiros. Já o churrasco, é uma tradição constante — afirma István Wessel, especialista em carne.
Qualquer razão é suficiente para reunir familiares ou amigos em torno da churrasqueira. Embora o número de vegetarianos esteja crescendo, a carne ainda é a protagonista nesse tipo de preparo. De acordo com um levantamento conduzido pela plataforma CupomValido.com.br em colaboração com a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil é o terceiro país que mais consome carne no mundo.
Porém, erros na preparação da carne estão entre os principais riscos de intoxicação alimentar durante o churrasco de domingo.
— A carne é um alimento extremamente sensível. Ela é rica em sangue, proteína e água, o que a torna atraente para insetos e propícia para a proliferação de bactérias caso não sejam tomados os devidos cuidados na manipulação e armazenamento — explica a nutricionista Priscilla Primi, colunista do GLOBO e mestre pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP).
Anualmente, cerca de 600 milhões de pessoas sofrem de intoxicação alimentar devido a contaminação por bactérias, vírus, parasitas ou substâncias químicas, e 420 mil delas acabam perdendo a vida. Os sintomas variam, mas frequentemente incluem dor abdominal, diarreia, vômitos ou náuseas, febre, dor de cabeça e perda de apetite. Em casos mais graves, pode ocorrer desidratação, presença de sangue na urina, fraqueza e até óbito.
Apesar de não haver dados específicos sobre essa ocorrência no Brasil, Primi ressalta que o problema é comum.
— Existe muita contaminação em relação aos alimentos. No entanto, os serviços de saúde frequentemente não notificam, já que muitas vezes os sintomas são interpretados como uma simples virose em vez de intoxicação alimentar.
No Reino Unido, por exemplo, dados da Food Standards Agency (FSA) indicam cerca de 2,4 milhões de casos de doenças transmitidas por alimentos a cada ano, com um aumento durante o verão, quando os churrascos são mais frequentes no país.
Uma vez que no Brasil o clima não impede um churrasco em família ou com amigos durante o inverno, que não é sinônimo de temperaturas baixas em um país tropical, o alerta é válido durante todo o ano por aqui.
O erro mais facilmente evitável em termos de segurança alimentar que as pessoas cometem é usar a mesma tábua, recipiente ou utensílio que foi usado para a carne crua para cortar ou manipular a carne já cozida ou para levá-la à mesa.
— Uma das maneiras de reduzir a contaminação, se houver, é por meio do calor. Algumas bactérias são extremamente sensíveis ao calor, e ao cozinhar a carne, a quantidade de bactérias diminui. No entanto, se a carne cozida for colocada no mesmo local onde estava a carne crua, existe o risco de recontaminação caso haja alguma bactéria presente. Isso é conhecido como contaminação cruzada — explica Primi.
Além disso, existem outros sete cuidados essenciais que às vezes são negligenciados quando os anfitriões precisam equilibrar a tarefa de cozinhar e entreter os convidados simultaneamente:
Deixar a carne crua fora da geladeira por muito tempo
Conforme mencionado, a carne é um alimento extremamente perecível. Qualquer erro de manipulação ou armazenamento pode promover o crescimento de bactérias prejudiciais à saúde. Deixar a carne muito tempo fora da geladeira é um deles.
Se as bactérias não resistem a altas temperaturas, a faixa entre 17 e 32 ºC é altamente propicia para o seu desenvolvimento. Portanto, se a carne estiver contaminada com alguma bactéria, deixá-la muito tempo fora da geladeira pode acelerar a multiplicação e deixar o alimento com uma carga bacteriana nociva para a saúde. Alguns micro-organismos que podem ser encontrados na carne crua são as bactérias Escherichia coli, Salmonella e Staphylococcus aureus, que causam diversos problemas de saúde e sintomas como vômitos e diarreia.
Por outro lado, Wessel recomenda tirar a carne da geladeira 1 horas antes do preparo para assá-la com mais uniformidade. Segundo Primi, não há problema em deixar a carne chegar em temperatura ambiente. Mas o ideal é que nesse período ela seja mantida em um em um local fresca e em um recipente coberto com plástico filme ou papel alumínio.
Deixar a carne e os acompanhamentos descobertos
Inclusive, deixar a carne e outros acompanhamentos do churrasco, como farofa e maionese, descobertos, é outro erro que contribui para o aumento do risco de intoxicação alimentar.
— Alimentos descobertos são atrativo para insetos como moscas e formigas, que carregam bactérias — alerta Primi.
Esse ponto é polêmico, mas o fato é que, do ponto de vista da segurança alimentar, quanto mais crua estiver a carne, maior o risco de contaminação. Comer carne crua ou malpassada aumenta o risco de salmonela e infecção por outras bactérias e vírus.
— O ideal, do ponto de vista de segurança alimentar, é comer carne bem passada porque precisa chegar a uma temperatura alta no centro da carne, cerca de 100º C, para poder eliminar a maioria das bactérias nocivas. Mas sabemos que isso impacta negativamente no sabor — diz Primi.
Algumas formas de manter a suculência e o sabor, mas reduzir o risco de intoxicação são: tostar bem a carne por fora e dar preferência a carnes lacradas e com selo SIF, que garantem a procedência da carne.
Não higienizar corretamente a grelha e os utensílios utilizados no churrasco
Deixar a grelha suja após o churrasco pode ser um chamariz para bactérias e bichos. Além disso, há oxidação da gordura, o que deixa aquele sabor rançoso. O melhor momento para limpar a grelha é logo após o churrasco, pois o aquecimento facilita a remoção da gordura e fazer isso garante que o próximo churrasco não estará contaminado devido a resquícios anteriores. Primi recomenda utilizar uma escova ou instrumento próprio para grelha, que não solte fiapos, e detergente.
Tábuas e outros utensílios que foram utilizados para armazenar ou manipular carne crua devem ser lavados com água, bucha e detergente. Em seguida, é recomendado jogar água fervente e arrematar com álcool 70 borrifado, para fazer uma espécie de esterilização. Depois, basta deixar secar naturalmente.
Não higienizar bem as mãos
As mãos são uma das mais importantes vias de contaminação, por isso, é fundamental lavá-las bem antes e durante o churrasco.
— O ideal é lavar a mão com água e sabão cada vez que muda o tipo de alimento. Por exemplo, lavar a mão após fatiar a carne e antes de começar a fazer a maionese — orienta a nutricionista.
Também é recomendado ter um pano de prato para enxugar a mão e outro para a louça, se for o caso.
Pano de prato pendurado no ombro
Aliás, o famoso pano de prato no ombro, marca registrada de muitos churrasqueiros no Brasil, é outra fonte de contaminação. Primi explica que as bactérias se desenvolverm onde tem água, comida e luz. O pano de prato acaba sendo uma colônia para a proliferação de bactérias.
— Se a pessoa lavar a mão com água e sabão e usar o pano de prato só para secar a mão, por exemplo, não teria problema nenhum. Mas sabemos que aquele pano que fica pendurado no ombro é usado para várias coisas, desde enxugar a mão após tocar um alimento úmido, até secar o suor da testa ou limpar o suco da carne que pingou na borda do prato — diz Primi.
Provavelmente você já ouviu falar que tábuas de plástico ou madeira não são recomendadas para churrasco. Isso não é mito e o problema não é o preparo em sim, mas o corte. A faca usada para cortar a carne faz ranhuras nesse tipo de tábua e isso dificulta a higienização.
— O ideal é a tábua de polietlineo, aquele material branco rígido, ou de vidro porque são mais difíceis de fazer ranhuras e como são mais claras, facilita a limpeza.
Dicas para assar a carne perfeita
Depois de saber quais erros não cometer para evitar o risco de intoxicação alimentar, confira dicas do especialista em carnes Istvan Wessel para o churrasco perfeito.
— Quando a faca não esta bem afiada, você está preparando uma carne que vai ficar mal cortada e feia.
— Eu também gosto de colocar pimenta do reino para servir, porque combina muito com a carne grelhada — diz o especialista.
— É igual suflê, tem que comer quando ficar pronto — afirma
— O calor precisa estar bem intenso para colocar a carne. A grelha deve estar entre 220 e 240ºC.
— Se apertou e estiver muito elástico, ainda está crua. À medida que carne vai passando, ou seja, vai desidratando, vai perdendo essa elasticidade e ficando mais firme ao aperto.