A periguete foi o assunto da temporada de moda. Ísis Valverde, encarnando o encosto de Suelen (a desinibida do momento e docinho de coco com pimenta da novela "Avenida Brasil"), desfilou no Fashion Rio, pela TNG, com ares de musa.
Na sequência, o estilista Alexandre Herchcovitch levantou a bola de que o Brasil tem expertise em produzir roupas em massa para essas moças, digamos, calorentas. A maioria concordou, outros fizeram ressalvas, e a coisa virou uma discussão das boas.
"Mas, afinal, o que é ser periguete?", perguntou o saboroso Xico Sá, em crônica, deixando antes uma constatação certeira: periguetismo não é privilégio/defeito de classe.
E ser periguete é ruim? Poxa, não necessariamente. Deixemos claro: periguete não é piranha, aquela mulher que sente a primeira gota de sangue quente e aproveita para estraçalhar geral. Grandes piranhas podem se esconder atrás de roupas muito chiques e comportadas. O diabo, sabemos, às vezes veste Prada.
A Suelen de "Avenida Brasil" é bem mais vítima que predadora. Escrava de um sistema onde riqueza é sonho, é uma romântica, quer pegar barriga de jogador de futebol. Isso não é esquema, é projeto de Cinderela.
A periguete peca pela generosidade, chega mostrando tudo. Barriguinha de fora, é uma moça exposta, quase cristã no seu jeito de oferecer as duas faces -a da frente com top-decotão e a de trás num short ou calça bem apertada. E sem essa de pecado fashion. As recalcadas que se vistam como vovós carolas (o fetiche do momento entre as que se acham donas das regras de elegância). Quase sempre, ela oferece mais perigo para si mesma do que para os outros.
As melhores gatas do Brasil já foram humilhadas por uma condenação ao periguetismo submisso e eterno. Carmen Miranda, moça linda, talentosa e batalhadora, queria fazer outros papéis em Hollywood, mas era sempre obrigada a encarnar a bobinha sensual, com ou sem bananas.
Coincidentemente, quem lhe deu uma vingança, mesmo que só na passarela, foi Herchcovitch. Em sua histórica coleção sobre a diva, botou Carmen toda de látex, num vestido preto, com frutas pretas. Era como se ela dissesse: "No tabuleiro da baiana, tem é um soco inglês para quem quer dominar uma pessoa com rótulos de moralismo caquético".
A gata-garota Gabriela, de Jorge Amado, agora na versão Juliana Paes, é periguete? Mais ou menos. É uma moça que gosta das coisas boas, entre elas, romances com homens.
Teoricamente inocente de seu poderio sexy, porque, enfim, foi escrita por um lindo romântico, se me permitem tanta intimidade com um gênio da literatura.
Sobre as roupas, afinal. É tudo muito relativo. Xica da Silva, a ex-escrava que virou senhora e ganhou mitos de rainha, era, segundo consta, gongada por todas as damas porque ousava usar roupas de branca aristocrata. A inveja, o racismo e a luta de classes sempre estão na barra das questões fashion, saibam.
A grife italiana Versace foi "acusada" por editoras inglesas de fazer roupas para as amantes profissionais de Berlusconi, ou seja, com "estilo prostituta". Mas, se Karl Lagerfeld (um gênio, diga-se) faz um desfile botando Maria Antonieta de saiotinho "beira-bunda", aí é chique.
Periguetes do mundo, uni-vos, camaradas. Com ou sem umbigo de fora, com calça da Gang ou microtailleur Chanel, tomem as rédeas da situação. Se você curte exibir a fartura que Deus lhe deu, não se curve. Não se deixe humilhar.
Acrescente a atitude e o sobrenome Perigosa. E fogo na roupa de quem não respeitar. Porque, yes, nós temos Suelen, mas também temos Maria Bonita, tá, meu bem?