O desejo sexual
A presença e a realização do desejo sexual é uma das maiores fontes de prazer que podemos ter na vida. Além disso, o desejo:
(1) é um dos requisitos mais importantes para selecionar um parceiro amoroso. Sem este tipo de desejo, o relacionamento pode ser classificado de diversas formas, como, por exemplo, parental, amistoso ou comercial, mas não como amoroso;
(2) funciona como motivador para procurar, agradar e conquistar o parceiro,
(3) muda temporariamente a percepção sobre as qualidades do parceiro (faz com que o parceiro seja visto como mais atraente e interessante do que quando o desejo é menor);
(4) muda a percepção daquilo que é razoável fazer para conquistar o parceiro.
Devido à sua importância, o desejo é um assunto que desperta muito interesse. Esse interesse é revelado, por exemplo, por meio do tempo que as pessoas passam conversando sobre esse tema, da quantidade de publicações que tratam desse assunto e da quantidade de energia e dinheiro que são investidos pelos pesquisadores para avaliar a frequência, a duração e a qualidade das relações sexuais.
O desejo é a primeira fase de um episódio sexual satisfatório
Um episódio sexual bem-sucedido pode ser dividido em quatro fases: desejo (fantasias acerca da atividade sexual e desejo de ter atividade sexual), excitação (sentimento de prazer e alterações fisiológicas concomitantes. Inclui, por exemplo, a ereção peniana do homem e a lubrificação e a expansão vaginal da mulher), orgasmo (clímax sexual, com liberação da tensão sexual e contração rítmica dos músculos do períneo e órgãos reprodutores) e resolução (sensação de relaxamento muscular e bem-estar geral) (Manual de Diagnóstico Estatístico de Transtornos Sexuais ? 4a. Edição, pp. 467 - 468).
Pouco desejo sexual
A insuficiência de desejo sexual pode ser uma característica crônica do indivíduo ou se manifestar apenas circunstancialmente. Quando ela é crônica − está presente há muito tempo −, acontece com todos os possíveis parceiros, e há poucas fantasias e sonhos eróticos. Quando ela é circunstancial, aparece apenas em certas situações (por exemplo, quando o parceiro agiu de uma forma desrespeitosa) e com certas pessoas. Nesse caso, a falta de desejo é natural e muito útil para selecionar parceiros amorosos ? só devemos iniciar ou manter um relacionamento amoroso com alguém que desperte em nós alguma atração sexual ou que, pelo menos, tenha potencial para isso e que nos trate bem.
A diminuição do desejo pode ocorrer durante um relacionamento amoroso que está em curso. Quando esta diminuição é acentuada e perdura por muito tempo, existe uma grande chance de o relacionamento se deteriorar.
Consequências da falta de desejo para o relacionamento
A falta de desejo por parte dos homens é mais facilmente percebida do que a falta de desejo por parte das mulheres. O maior motivo dessa diferença é simples: a falta do desejo masculino dificulta ou impede a ereção. Essa falta de ereção, além de impedir a penetração, também tem um efeito psicológico negativo poderoso na parceira (por exemplo, a mulher com quem o homem está não se sente desejada e desejável), e no próprio homem (por exemplo, isso representa uma grande ameaça à sua autoestima e à sua identidade). Os efeitos da falta de desejo para as mulheres também são graves: ao perderem boa parte da motivação para o sexo, não lubrificam direito a vagina, não relaxam a musculatura vaginal para permitir a penetração e têm dificuldades para o orgasmo. No entanto, para as mulheres, a falta de desejo pode ser dissimulada e não impossibilita as relações sexuais, embora possa torná-las desagradáveis e até humilhantes.
A síndrome da santa e da prostituta
Em certa época, era esperado que as mulheres não tivessem desejo sexual. Diz a lenda que na época da Rainha Vitória era recomendado que as inglesas pensassem na pátria durante o sexo. Praticar o sexo era um sacrifício a que elas deviam se submeter para gerar cidadãos e guerreiros que o Império Britânico necessitava. Além disso, nessa época era considerado impróprio e vergonhoso que elas manifestassem desejo sexual e deixassem transparecer que estavam sentido prazer durante o sexo. Vida dura, naqueles tempos, não é?
Mesmo hoje, alguns homens diferenciam as mulheres pelas quais sentem atração romântica daquelas pelas quais sentem atração sexual. Esses homens consideram aquelas mulheres pelas quais sentem amor romântico uma espécie de ?santa? e aquelas por quem têm atração sexual como uma espécie de ?prostituta? e as classificam como ?mulheres para casar? e ?mulheres para transar?. Uma comédia sobre a máfia mostra um diálogo entre um gangster e o seu psicólogo, o que ilustra bem essa síndrome. O mafioso, ao ser questionado sobre a sua necessidade de se relacionar com amantes, relata que o seu desejo sexual só podia ser plenamente satisfeito com estas, porque ?respeitava? muito a sua esposa, a mãe dos seus filhos. Indignado, ele dá um exemplo para reforçar os seus argumentos: ?Como posso fazer isso, receber sexo oral da mãe dos meus filhos, daquela boca que beija aqueles anjinhos??.
O desejo sexual
Stephen B. Levine, professor da Case Western Reserve University School of Medicine, apresentou uma teoria que considero muito útil para entender o desejo sexual. Segundo esse autor, o desejo tem três componentes: o impulso, a motivação e o querer. Vamos apresentar aqui um resumo dessa teoria.
O impulso sexual
O impulso é o componente biológico do desejo. A sua intensidade aumenta à medida que vai passando o tempo desde o último orgasmo. Funciona de forma semelhante à fome: no momento em que há ingestão suficiente de comida, ela é saciada. Com o passar do tempo, desde a última refeição, ela vai aumentando novamente. Outros fatores também afetam a fome: a energia gasta (por exemplo, atividades físicas e tensões psicológicas queimam mais energia e aumentam a fome), a velocidade do metabolismo e o tipo de alimento ingerido na última refeição. Algo semelhante ocorre com o impulso sexual: quando acontece uma boa relação sexual ele fica temporariamente saciado. À medida que vai passando o tempo após essa relação, sua intensidade vai aumentando novamente.
A intensidade do impulso sexual também está relacionada com a quantidade de hormônios sexuais que é produzida pelo organismo. A produção de hormônios sexuais é mínima na infância, atinge o ápice na adolescência e então começa a diminuir e volta ao nível infantil na terceira idade. Devido à saturação desses hormônios, os adolescentes, principalmente os homens, são tomados por uma espécie de furor sexual: eles pensam muito em sexo, masturbam-se frequentemente, interessam-se por pornografia, querem transar com quase tudo que lembre os objetos sexuais de seus interesses. A partir dessa idade, a quantidade de hormônios sexuais começa a diminuir. No entanto, felizmente, o desempenho sexual não pode ser predito apenas a partir da idade ou do nível hormonal, devido às contribuições independentes dos outros dois componentes do desejo ? a motivação e o querer.
O desejo sexual não está o tempo todo acionado na consciência, mesmo quando há privação sexual. Muitas vezes, quando ele ainda não é muito intenso, a pessoa pode esquecê-lo por um tempo e se concentrar em outras coisas. No entanto, quando é muito intenso, ele pode ?tomar? a pessoa: ela fica o tempo todo pensando em sexo, pode intensificar seus esforços para seduzir aqueles por quem sente atração, pode provocar ?sonhos molhados? e ficar mais interessada em conversas eróticas e em pornografia.
A motivação
A motivação pode ser comparada ao apetite pela comida. Quando a comida é boa, atraente e gostosa, aumenta a nossa vontade de comer e tendemos a comer mais do que comeríamos caso a comida fosse menos atraente. No caso do apetite sexual, contribui muito para o desejo o fato de o parceiro ser alguém que amamos, ser bonito e se comportar de uma forma sensual. Diversos outros fatores também ajudam a aumentar o desejo. Por exemplo, estar livre de preocupações e se encontrar com o parceiro em um ambiente apropriado e seguro pode contribuir para que o desejo se manifeste mais livre e intensamente. Uma das coisas que mais provoca o desejo é a manifestação de desejo por parte do parceiro: isso aumenta o desejo dele, auxilia no seu orgasmo e contribui enormemente para a sua satisfação e autoestima.
Muitas pessoas também aprendem a ?pegar carona? em excitações produzidas por outros acontecimentos que, em si, nada têm de sexual ou erótico. Várias das alterações fisiológicas que são produzidas por esses fenômenos são do mesmo tipo produzido pela excitação sexual e, por isso, podem ser capitalizados para aumentar essa excitação. Por exemplo, transar em locais onde haja o risco de ser flagrado por outras pessoas (elevadores, vestiários de lojas, praia) pode aumentar o ritmo cardíaco e a adrenalina no sangue, reações estas que também são produzidas pela atividade sexual. Como não dá para distinguir as origens dessas alterações, fica mais fácil atribuir tudo à excitação sexual. Por esse motivo, algumas pessoas procuram fazer ou dizer coisas ?proibidas? ou arriscadas para aumentar seus desejos e excitações.
O querer
O querer são as outras razões para transar que não a vontade provocada pelo impulso e pela motivação sexual. Em outras palavras, são os outros motivos para praticar o sexo além do desejo sexual. A analogia com a ingestão de alimentos continua útil aqui: podemos comer algo porque sabemos que faz bem, mesmo quando não estamos com fome e não gostemos daquele alimento. No caso do sexo, podemos transar porque queremos contentar o parceiro ou a parceira, porque achamos que é nosso dever conjugal, para que ele ou ela ?não procure em outro lugar o que está faltando em casa?.
?Pegar no tranco?
Muitas vezes o sexo é iniciado sem desejo ou com pouco desejo, mas o desejo surge durante as práticas sexuais. Esse desejo surge ou é aumentado tanto pela estimulação das zonas erógenas como pelas propriedades excitatórias das práticas sexuais (por exemplo, ver os sinais de excitação do parceiro e provocá-lo podem ser práticas excitantes para certas pessoas). Um conhecido meu classificou o nascimento do desejo durante o ato sexual como ?pegar no tranco?. Essa expressão é mais comumente usada quando o carro não pega pelo acionamento da partida, mas só quando é empurrado. Nesse caso, o condutor engata uma primeira, o carro é empurrado e quando ganha alguma velocidade, ele tira abruptamente o pé da embreagem. Nessa hora o carro dá um tranco e pode pegar. No caso de desejo sexual, essa via para o nascimento do desejo pode ser utilizada de vez em quando, como, por exemplo, quando um dos parceiros está dormindo e o outro começa a estimulá-lo sexualmente. No entanto, nunca sentir desejo pelo parceiro sem esse tipo de provocação sensorial é um sinal de que ele não é um bom objeto de desejo.
A inibição Sexual
O sexo é carregado de significados em quase todas as sociedades. A sua prática é regulada por normas determinadas principalmente pela religião e pela moral. Existe um conjunto de normas sobre as práticas sexuais que é regulado pela legislação. Por exemplo, existem leis que determinam quais são as práticas ou tipos de parceiros que são ?legais? ou ?ilegais? (por exemplo, traição, sedução de menores, assédio etc.) e passíveis de sanções penais. As pessoas também são educadas a sentir culpa e medo quando o sexo não é praticado segundo as normas aceitáveis pela sociedade.
Poucas pessoas podem afirmar que não têm nenhuma inibição para falar de sexo e para expressar o que sentem, desejam ou não desejam durante a prática sexual. Essas normas punitivas também são uma das razões pelas quais muita gente só fica à vontade para praticar sexo no escuro.
O sexo é uma das coisas que provocam as sensações mais intensas e maravilhosas na nossa vida. Além disso, ele está ao alcance de todos os casais. Ele não precisa ser comprado e nem é necessário pagar royalties para nenhuma multinacional para praticá-lo com tudo o que se tem direito. No entanto, poucas pessoas tiram todo o proveito que poderiam nessa área. Pratique e aproveite!