Centenas de corpos apodrecem sob o sol no Hospital Central de Porto Príncipe diante do olhar impotente dos haitianos e no jardim do centro médico, que foi quase totalmente destruído pelo terremoto. Feridos imploram por um médico e rezam para que não acabem no "pátio dos mortos".
Sem luvas e com algodões empapados em álcool para se protegerem do odor da putrefação, as pessoas procuram parentes em meio a uma montanha de corpos, mutilados, seminus, cobertos de poeira e infestados de moscas, com a esperança de dar a eles um enterro digno.
Ao apontar para um corpo coberto com um lençol branco, o haitiano Jean-Lionel Valentin afirmou:
- Finalmente encontrei minha prima. Mas agora ninguém quer me ajudar a levá-la. Os taxistas cobram uma fortuna e vou ter que deixá-la aqui de novo.
O terremoto ocorrido na última terça-feira (12) no Haiti, de 7 graus na escala Richter, devastou Porto Príncipe e deixou dezenas de milhares de mortos.
Enquanto suportava as náuseas e procurava sua irmã entre os mortos, a haitiana Florentine disse:
- Deus deve estar com raiva de nós porque nos atingiu com força.
Famílias inteiras surpreendidas pela morte jazem nesse necrotério superlotado. A cada meia hora, um caminhão da polícia local vem e despeja mais corpos neste pátio. Sem luvas nem máscaras e com suas próprias mãos, dezenas de voluntários ajudam na tarefa.
O engenheiro elétrico, Alius Luc, acompanhou um amigo ao necrotério, e declarou:
- Não perdi ninguém da minha família, mas choro por essas pessoas e por meu país. Como sairemos disso?
Observando a área desolada, uma enfermeira disse:
- É preciso enterrar os mortos para evitar que a cidade se transforme em um grande foco de infecção.
O Hospital Central de Porto Príncipe foi tão danificado pelo terremoto que nenhuma de suas instalações pode ser utilizada.
Dois médicos haitianos tentam atender, exaustos, as dezenas de feridos que invadiram o centro médico e esperam ajuda, deitados no chão ou em colchões encontrados no hospital.
Roupas ensopadas de sangue e restos de comida cercam as vítimas. "Doutor, doutor", soluçam ao mesmo tempo quando veem um médico.
O médico Givenson Foite lamentou:
- Damos calmantes a eles e os hidratamos com soro. Suturamos alguns ferimentos, mas, por enquanto, não temos nada mais a fazer com os mais graves.
Vários feridos gritam incansavelmente de dor e injetam em si mesmos os calmantes que encontraram na farmácia do hospital.
Alguns deles morrem devido à hemorragia, diante dos olhares perplexos de seus familiares.
Um médico, que não quis se identificar, afirmou:
- Não vi nenhum outro médico nem mesmo estrangeiros. Dizem que os aviões de ajuda humanitária chegaram. Está claro que não chegaram aqui. Não temos como operar, nada funciona. Será preciso amputar várias pessoas se quisermos salvar suas vidas.
Foite explica:
- Houve médicos mortos e a escola de enfermeiras desabou. Sabemos que muitos profissionais morreram. Outros estão atendendo suas famílias ou seus vizinhos.
Ao seu lado, uma mulher geme de dor e mostra sua mão, ligada ao resto do braço apenas por alguns tendões.
"Peçam ajuda, para que alguém de algum lugar do mundo venha nos socorrer", suplicam os familiares a qualquer estrangeiro.