Ao longo de oito dias, o site da instituição se torna palco de performances, quadros de dança, números circenses, cenas e espetáculos teatrais criados antes e durante o período de quarentena para adultos e crianças. No total, apresenta 26 obras em um primeiro recorte dos contemplados em Arte como respiro: múltiplos editais de emergência. Cada espetáculo permanece no ar por 24h o festival para ceder lugar ao próximo, possibilitando ao público maratonar por ampla diversidade de linguagens e territórios cênicos.
O Festival Arte como Respiro – Edição Cênicas começa no dia 17 de julho (sexta-feira), com 26 obras exibidas no site do Itaú Cultural (www.itaucultural.org.br) durante 24h, cada uma. Trata-se da primeira série de apresentações com os resultados dos chamamentos abertos desde março pela instituição, para apoiar artistas de diferentes áreas impactadas pela suspensão social no contexto da pandemia do covid-19. Este primeiro bloco de espetáculos segue até o dia 19 (domingo) e é retomado de 22 a 26 de julho (quarta-feira a domingo) com diferentes linguagens e para públicos de todas as idades. Ao longo do ano, a instituição subirá no ambiente digital os demais trabalhos contemplados neste edital, assim como nos editais de música, literatura, poesia surda, artes visuais e audiovisual.
Marcando esta estreia, a maratona de apresentações é composta de espetáculos completos, cenas teatrais, performances, quadro de dança e circo, registrados antes ou durante o período da quarentena. As temáticas destas primeiras 26 de 200 obras contempladas no edital de cênicas variam de questões sociais, raciais e de gênero até situações individuais ou coletivas causadas pela suspensão social. Permeada por obras curtas de abertura, já conduzindo o público ao olhar curatorial do Núcleo de Artes Cênicas do Itaú Cultural, a programação está dividida em sessões completas noturnas voltadas ao público adulto, com início sempre às 20h, e aos finais de semana, às 15h, em horário reservado para crianças.
Abertura
O festival abre no dia 17 (sexta-feira), às 20h, com peças criadas no período da pandemia. Começa com Rezos da Xamãe Zanoia, série de cinco vídeos/pílulas de medicina do riso conduzidos pela atriz pernambucana Livia Falcão. Neles, Zanoia, uma índia, cuja missão é rir de si mesma, vive em terras distantes e faz vídeo-chamadas para a Terra para compartilhar saberes sobre este momento. Na sequência, o cartaz principal da noite é O Louco e a Camisa, projeto paulista dirigido por Elias Andreato, no qual uma família, marcada pela convivência hipócrita entre pai, mãe, filhos e genro, busca esconder o filho, tido como louco devido às suas ideias. Enquanto o restante da família tenta parecer o que não é, o louco é quem se mantém fiel aos seus valores.
O circo, a dança e o musical conduzem a programação do sábado, 18. Radicados na Bahia, os argentinos da Cia Circo da Lua entram no ar às 15h, lançando a pauta infantil com MultiplicArte, uma curta apresentação com os palhaços Carrapicho e Andorinha. Cansados de ficarem sozinhos em casa durante a pandemia, eles tentam mudar a sua realidade com arte e magia. As peripécias da dupla abrem caminho para o espetáculo do dia, Shake Shake Show, um musical da Cia. Vagalum tum tum, de São Paulo. Conhecido por montagens de textos de William Shakespeare costurados por canções autorais, o grupo traz humor e poesia nesta nova montagem que reúne quatro versões de tragédias shakespearianas: O Bobo do Rei, a partir de Rei Lear, O Príncipe da Dinamarca, de Hamlet, Bruxas da Escócia, a partir de Macbeth, e Henriques, de Henrique V.
À noite, após o segundo episódio de Rezos da Xamãe Zanoia, desta vez com foco na natureza, entra no ar Tecituras, espetáculo da Quik Cia. de Dança. Conduzida pelos bailarinos Letícia Carneiro e Rodrigo Quik, cuja bagagem inclui vasta experiência no Grupo Corpo, a companhia mineira traz um registro pré-pandemia de processos de improvisação realizados em espaços públicos de cidades por onde passaram, construído relações permeáveis entre corpo, objeto, imagem, sonoridades, voz e arquitetura.
O festival segue no domingo, dia 19, com programações que abordam isolamento, equidades e memória afetiva. A faixa infantil abre as atividades com O Concerto, curto espetáculo criado pelo Circo de Québra. No pequeno espaço de uma lavanderia, a trupe paulista explora o humor por meio de recursos especiais de baixo orçamento, teatro de animação e efeitos cômicos físicos e sonoros propostos pela linguagem clownesca, mantendo um diálogo direto entre palco e plateia – nesse caso, entre lavanderia e internet.
Na sequência, a paulista Ávila Produções traz o delicado A Menina Kung Fu, espetáculo com acessibilidade em Libras no qual uma garota de nove anos com deficiência visual é apaixonada pela arte do kung fu. Ao mudar de bairro com os pais, ela tem que frequentar uma nova academia de artes marciais, frequentada apenas por meninos. A convivência obrigada todos a discutir, na prática, questões como inclusão, discriminação, empoderamento feminino e bullying, buscando direitos iguais.
A primeira semana do festival fecha com a sessão das 20h, aberta pela terceira chamada de Rezos da Xamãe Zanoia, de Livia Falcão, na qual a índia Zanoia fala com o planeta Terra sobre a figura da mãe. Quem fecha a série de espetáculos é Histórias de Pescadores, sensível peça do cearense Coletivo Zanzulim, que conta de forma memorial, poética e afetiva a história da praia do Mucuripe, na cidade de Fortaleza. Em foco estão as transformações ocorridas na região e mudanças nas relações da comunidade, dos seus primeiros habitantes, indígenas, até hoje.
Mais diversidade
O Itaú Cultural retoma o Festival Arte como Respiro – Edição Cênicas na quarta-feira, dia 22, às 20h, dando início a uma sequência de três dias da programação inteiramente dedicada ao público adulto com temáticas densas, antes de novas apresentações no final de semana. Diferentes olhares sobre a mulher e o feminino conduzem as apresentações do primeiro dia, a partir das 20h.
A abertura traz as atrizes baianas Ella Nascimento, Naira da Hora e Shirlei Silva em Cá Entre Nós, abordagem artística com a ótica de três mulheres pretas sobre o aumento dos casos de violência doméstica durante o isolamento social em função da pandemia de covid-19. É também da Bahia a vídeo-performance Quiero ser Libre, de Maria Tuti Luisão. Trata-se de um manifesto pela liberdade e resistência criativa do corpo, no qual a artista desloca suas ficções pessoais sobre ser mulher e cria novas realidades possíveis.
O espetáculo do dia é Mil e Uma Noites Século Trans21, produção de teatro audiovisual paulista nascida na quarenta e inteiramente composta por artistas transvestigêneres: a ativista trans Aretha Sadick, o homem trans ator Leo Moreira Sá, a atriz, compositora e cantora Verónica Valenttino e a atriz e dramaturga Ave Terrena, que também assina a direção. Nesta apropriação moderna do clássico Mil e Uma Noites, em que um rei se casa com uma mulher diferente a cada noite, matando-a na manhã seguinte, as atrizes narradoras encarnam a única personagem que consegue permanecer viva, ao narrar histórias durante mil e uma noites para o rei. Nesta versão, no entanto, o enredo vai sendo costurado com outras histórias.
A quinta-feira, 23, traz um recorte com espetáculos conduzidos por inquietudes e questionamentos provocados pelo isolamento, rigidez de pensamentos e intolerância. Pedaços – Poesia Performática, da pernambucana Hermínia Mendes, abre a noite com reflexões sobre um corpo inquieto pelo estado pandêmico e sobre os sintomas de uma população que já está doente há muito tempo. Na sequência, entra no ar a performance De Carne, 2020 e Breathes on Solitude, 2020, de Barbara Paz. Sozinha em seu apartamento, a atriz constrói um diário sensorial por meio de sons e imagens captadas por um telefone, criando memórias visuais de um mundo em suspensão e de limitações físicas e mentais do ser humano em isolamento.
O dia fecha com o espetáculo Dois Amores e um Bicho, no qual a Notória Companhia, do Rio de Janeiro, aborda preconceito e intolerância. Quando um casal de meia-idade vai visitar o zoológico onde sua filha trabalha, o pai acaba revelando que há 15 anos matou a pontapés o próprio cão ao surpreendê-lo em uma relação sexual com outro cachorro, acreditando que ele fosse gay. A partir da confissão, desmorona o ideal do pai-herói, criado pela filha, e a esposa repensa seu lugar de submissão.
Na sexta-feira, 24, a reflexão sobre o não-contato exigido no momento atual é o ponto central de Touch, que abre a noite, às 20h. A cena, dos cariocas Joseane Martins Costa e Tomek Kapuscinski, discute sobre a necessidade do não-toque na atualidade, que, apesar de criar um vazio no coração, é a esperança para salvar outras vidas. A videodança Estilhaço ou Carcomer Silenciosamente, da também carioca Anna Behatriz, traz vozes que invadem o íntimo de um corpo, tido como espaço, procurando e apontando o perigo de sua existência.
A noite reserva, ainda, #QUEERANTENA – Puro Teatro, cena teatral que o grupo pernambucano Teatro de Fronteira apresenta no festival. Usando a poética e a linguagem do teatro documentário trabalhado pela companhia, o espetáculo narra a trajetória de vida de um menino, que descobre, ao mesmo tempo, a potência do palco como espaço para dar vazão às suas fantasias de gênero e os chamados da norma masculina para que saia de cena.
Fim de semana
No fim de semana, as apresentações do festival voltam a ampliar o palco e a plateia virtuais para as crianças, além das sessões para os adultos. No sábado, 25, a faixa voltada para os pequenos abre com a paulista Caravana Tapioca em Batata Quente, versão adaptada para o vídeo de uma cena da peça Chá Comigo. Nela, a personagem Nina ensina de maneira muito engraçada como cozinhar batatas para fazer uma receita deliciosa, recheada de humor. A criançada também pode conferir neste dia Guia Improvável para Corpos Mutantes, espetáculo de dança do gaúcho Airton Tomazzoni, no qual um grupo de bailarinos busca redescobrir as possibilidades do corpo para se modificar por si só. Eles criam um universo imaginário e lúdico para o corpo que dança, abordando temas como o incentivo à criatividade, o respeito às diferenças, a afirmação da diversidade e os sabores e desafios da tecnologia na atualidade.
A sessão da noite tem início com o Coletivo Ará Ijó, de São Paulo, em (DIZ)carrego, cena em que quatro intérpretes diferentes, moradores de quatro periferias distantes, conversam sobre corpos pretos como alvos. O autocuidado é o remédio para a sua cura. O dia fecha com o espetáculo Terror e Miséria no Terceiro Milênio – Improvisando Utopias, do também paulista Núcleo Bartolomeu de Depoimentos. Confinados em um teatro, atores e DJs esperam para entrar em cena e acabam dando início a um jogo no qual atores e personagens confrontam diferentes visões de mundo a cada cena, deixando evidente o que os une e o que os separa.
Encerrando o primeiro bloco do Festival Arte como Respiro, no domingo, 26, às 15h a Cia. Pavio de Abajour reflete, de forma lúdica e poética, sobre o vazio que nasce quando a esperança morre, em Transmutação do Vazio. Tendo como ponto de partida a mutação da lagarta em borboleta, a personagem central busca ver o confinamento no casulo não como renúncia à liberdade, mas como oportunidade de se conectar e de dar ouvidos ao vazio de cada um.
Em seguida, em O Mistério do Sapato Desaparecido, a companhia Teatro Por Um Triz desenvolve a linguagem do teatro de objetos. Nele, um sapato-detetive sai à procura do sapato da Cinderela, que sumiu, e acaba chegando em uma sapataria que reúne famosos calçados das histórias infantis, como a Bota Sete Léguas, do Pequeno Polegar, de Charles Perrault, e os Sapatinhos Vermelhos, de Hans Christian Andersen. Para interagir com a plateia, mesmo virtualmente, o grupo exibe na sequência o vídeo O Sapato, no qual propõe para as crianças uma brincadeira com os que elas têm em casa.
A sessão das 20h, por sua vez, abre com Ritual de proteção em Quarentena, vídeo criado pelo grupo carioca Dembaia no período de isolamento social, a partir da provocação de como fazer arte nesse momento inédito. Eles usam a videoconferência para estabelecer novas pontes com o sagrado, a poesia, a dramaturgia, o corpo, a dança e a música.
A Cia. Dançurbana encerra a programação com Poracê – O Outro de Nós. A apresentação parte do significado da palavra poracê, originária da língua indígena Nheengatu, que significa dança de celebração, baile ou arrasta-pé. No espetáculo, coreógrafos e intérpretes-criadores com experiências e trajetórias distintas investigam suas identidades, nomes, origens e relações o estado do Mato Grosso do Sul, de onde vem, refletindo sobre diversidade, perecimento ao lugar, encontro de fronteiras, pluralidade de culturas e as linguagens que os atravessam.
SERVIÇO:
Festival Arte como Respiro – Edição Cênicas
17 a 19 de julho (sexta-feira a domingo) e 22 a 26 de julho (quarta-feira a domingo)
No site do Itaú Cultural: www.itaucultural.org.br